SOLUÇÃO DOS EXCLUÍDOS: FAVELA E TERMO TERRITORIAL COLETIVO

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

Título do Trabalho
SOLUÇÃO DOS EXCLUÍDOS: FAVELA E TERMO TERRITORIAL COLETIVO
Autores
  • Rebeca Landeiro dos Santos
  • Paula Menezes Salles de Miranda
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 03 - Direito à moradia, política habitacional, regularização fundiária e direitos dos povos e comunidades tradicionais
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/486013-solucao-dos-excluidos--favela-e-termo-territorial-coletivo
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
Favela, Termo Territorial Coletivo, Gentrificação, Direito à Moradia
Resumo
INTRODUÇÃO No ambiente urbano, muitos são os agentes e razões envolvidos no processo de construção do espaço. De maneira geral, existem os que procuram a apropriação de renda, que são os proprietários de terras, empresas imobiliárias, intermediários financeiros e investidores; os que buscam os juros e lucros, representando os interesses da construção civil; os que visam a produção e acumulação de capital de forma geral; e, por fim, a força de trabalho que usa do ambiente construído como meio de consumo e de sobrevivência. Assim, tem-se dois grupos, aqueles que da cidade, aqui entendida como esse grande mercado oferecido ao capital em geral, lhes interessa o valor de troca urbano, ou seja, a produção de lucros, juros e rendas. E a classe operária, que usa a cidade a partir do seu valor de uso, ou seja, moradia, serviços e infraestrutura pública. Para a maioria dos trabalhadores não é possibilitada as condições salariais para arcar com os elevados custos de aquisição de um imóvel ou de seu aluguel, e os programas habitacionais não conseguem suprir essa demanda. Desse modo, a ocupação de terrenos e edifícios vazios surge como importante alternativa de moradia. Em uma análise da reprodução ampliada da força de trabalho, percebe-se que ela não está vinculada somente ao salário. Ela também é dependente de políticas públicas que funcionam como uma espécie de “salário indireto”. No contexto da urbanização, essas políticas envolvem transporte público, infraestrutura e equipamentos urbanos e sociais. Dentre todos os agentes, o Estado é o que possui poder legal de intervir nas disputas sobre o espaço urbano. Entretanto suas intervenções são, correntemente, pautadas nos interesses da classe dominante, do recorte de espaço e tempo em vigor. Assim, as práticas de investimentos estatais são orientadas por três interesses principais: (i) os interesses do mercado imobiliário; (ii) os do marketing urbano, cujo motor é a visibilidade; e (iii) os interesses eleitorais, com a relação clientelista2. Para as classes sociais excluídas, que usufruem do valor de uso da cidade, depender desta relação clientelista com o Estado não traz nenhuma segurança ou garantia. Por isso, há séculos a população vem criando maneiras de suprir suas próprias demandas. Diante disso, o presente trabalho busca fazer uma reflexão sobre o surgimento das favelas no Rio de Janeiro e do Termo Territorial Coletivo (TTC) nos EUA, ambos modelos advindos de populações vulnerabilizadas buscando garantir sua segurança de posse. Para esse fim, foi feita uma análise sobre (i) o surgimento das favelas cariocas, (ii) a criação do TTC e (iii) a possibilidade de sua implantação em áreas informais brasileiras, com o intuito de se aproximar da garantia do direito à moradia para as populações mais vulneráveis. SURGIMENTO DAS FAVELAS Em 1888 é declarada a abolição da escravidão no Brasil, entretanto o Estado não investe em nenhum tipo de auxilio empregatício ou de posse de terras para a população recém liberta. Em 1889 ocorre a Proclamação da República, passando-se a investir fortemente em infraestrutura e melhorias urbanas. Centros de grandes cidades passaram a ser foco dessas ações, que tinham como objetivo “embelezar” e sanear áreas degradadas e insalubres. Com essa justificativa muitas desapropriações aconteceram e a população de baixa renda que morava nas áreas centrais passaram a representar uma ameaça à nova cidade em construção. Dessa forma, ainda no século XIX, no Rio de Janeiro, os cortiços começam a ser ameaçados de extinção. Esse tipo de habitação consistia, em sua maioria, em casarões subdivididos em vários cômodos que abrigavam, por meio do aluguel, inúmeras famílias. A superlotação, juntamente com a baixa infraestrutura e consequentemente, higiene, auxiliava na proliferação de epidemias como a da cólera, varíola e febre amarela, recorrentes na cidade. As legislações, então, começaram a proibir a construção de novos cortiços e a restringir a utilização dos existentes. Com a remoção dos cortiços, surge uma gama de terrenos com potenciais construtivos que não mais atendiam aos antigos moradores. Essa população começou a buscar alternativas de moradia, alguns se mudaram para os subúrbios, distantes do centro urbano, e outros deram origem ao que conhecemos hoje como favela, por meio da ocupação e autoconstrução em morros próximos à centralidade. Outros fatores também contribuíram para a formação das favelas no Rio de Janeiro, como o alojamento de soldados após a Revolta da Armada (1893-1894), que por permissão do governo se estabeleceram no morro de Santo Antônio e o retorno das tropas da Guerra de Canudos (1896-1897), que ocuparam o morro próximo ao quartel general do Exército. O sistema desigual das relações do Estado com os outros agentes da construção urbana justifica porque as tentativas de soluções das demandas fundiárias constantemente advenham dos próprios grupos sociais excluídos. Colocar a população a cargo de resolver os conflitos criados pela mercantilização da terra é atribuir a ela uma responsabilidade árdua que não lhe cabe. Entretanto, tendo em vista o cenário das disputas fundiárias atuais, essa pode ser a solução mais viável. As favelas brasileiras e o Termo Territorial Coletivo são exemplos promissores de práticas advindas desses grupos. TERMO TERRITORIAL COLETIVO O Termo Territorial Coletivo é uma forma de gestão comunitária da terra em que os moradores, em conjunto, são donos do terreno e cada morador é proprietário de sua própria construção. O TTC surgiu, e é utilizado até hoje, com a intenção de garantir habitações e a permanência delas ao longo do tempo para comunidades que, pelo sistema tradicional, dificilmente conseguiriam acesso ao mercado formal de moradias,. O TTC é um modelo flexível e se adapta às demandas de cada local, permitindo que cada comunidade o elabore de forma particular e respeitando as respectivas legislações vigentes. Isso possibilita uma abundância de modelos ao redor do mundo, já que os fatores e agentes que influenciam no direito à moradia da população de baixa renda dependem do país e da região onde estão inseridos. Esse modelo de gestão da propriedade tem bases filosóficas que datam do século XIX, com John Stuart Mill, em 1848, e Henry George, na década de 1870, que acreditavam que a diminuição da pobreza poderia ser alcançada através de impostos governamentais aplicados sobre o lucro de grandes proprietários de terras. Ainda no século XIX, em 1898, Ebenezer Howard desenvolveu um modelo visando os mesmos objetivos, mas através da gestão territorial de posse mista da propriedade, no qual a terra seria de posse coletiva e as construções de posses individuais. Suas ideias foram escritas em seu livro “Cidades-Jardim de Amanhã”, em 1902, e aplicadas em seu protótipo de Cidade Jardim em Letchworth na Inglaterra, em 1903,. O modelo de Howard influenciou as Cidades Jardins dos Estados Unidos e Inglaterra, no começo do século XX. Entretanto, seus princípios foram aplicados sem o uso da propriedade coletiva da terra. Nessa época, apenas as comunidades de Arthur Morgan e Ralph Borsodi realmente seguiram completamente os ideais de Howard. Esse tipo de gestão da propriedade foi usado em muitos países e serviu de inspiração para a construção do primeiro Termo Territorial Coletivo nos EUA. A estruturação do TTC em questão também se inspirou nas aldeias Gramdan, da Índia, nas propriedades rurais de uso coletivo do México, nos assentamentos agrícolas cooperativos de Israel e nas tradições dos nativos norte-americanos, que entendiam a terra como um elemento e não como propriedade. Em decorrência deste processo, surge, na década de 60, o que se desenharia como o Termo Territorial Coletivo que existe hoje. Através dos Movimentos dos Direitos Civis nos Estados Unidos, ativistas pelos direitos dos negros nas áreas rurais do sul do país, como John Lewis, Slater King (prima de Martin Luther King Jr), Charles Sherrod e Shirley Sherrod, acreditavam que a segurança política e a independência econômica para a comunidade negra estava vinculada à obtenção da propriedade privada da terra. Uma vez que essa propriedade não poderia ser adquirida pela maior parte dos negros, ou então seria facilmente retirada deles, a posse coletiva da terra foi a solução mais viável. Na década de 1970, a comunidade negra conseguiu um terreno rural de quase 6.000 acres perto de Albany, Geórgia. Essa tinha sido a maior porção de terras sobre o domínio de negros até então e foi alvo, durante anos, de violência e recusa por parte de agências governamentais em fornecer subsídios e empréstimos. Essa e outras experiências com o Termo Territorial Coletivo serviram de análises e estudos que deram origem, em 1972, ao livro “The Community Land Trust: A Guide to a New Model for Land Tenure in America”. As ideias desse guia serviram de inspiração para a criação de outros TTCs em áreas rurais e, pela primeira vez, em área urbana, como foi o caso do Termo Territorial Coletivo fundado em Cincinnati, em 1981, por lideranças comunitárias e por colaboradores da comunidade religiosa como pastores, padres e freiras. Assim, em 1982, as proposições do guia de 1972 foram atualizadas, gerando o livro intitulado “The Community Land Trust Handbook”, que estabeleceu os preceitos do TTC usados até os dias de hoje e, a partir dele, o uso do TTC se difundiu nos EUA. Em 1995 existia uma centena de Termos Territoriais Coletivos nos Estados Unidos, em 2005, mais de 200, com uma estimativa de 12 novos sendo constituídos a cada ano. Em 2010, ele estava presente em 45 dos 50 estados, mais o Distrito de Columbia. Em 2020, eram 280 TTCs sendo utilizados em todo os Estados Unidos. Atualmente o modelo pode ser encontrado em diversos países como Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Austrália, Quênia, Bélgica, Porto Rico, Bolívia, França, Bangladesh e Alemanha, sendo usado tanto para construção habitacional popular quanto para manutenção de comunidades já consolidadas. Desde 2018, no Rio de Janeiro, existem várias comunidades que, através da Organização Comunidades Catalisadoras (ComCat), tiveram acesso a oficinas com informações sobre o Termo Territorial Coletivo. Atualmente a favela de Trapicheiros, o Conjunto Esperança e a Vila Autódromo são projetos pilotos para implementação do modelo no Brasil. CONCLUSÃO O processo de formação e consolidação das cidades é gerado pela disputa dos agentes de sua própria construção. Os agentes das classes mais altas, principalmente o agente imobiliário, buscam sempre o maior lucro nas negociações sobre a mercadoria do solo, o que para a favela configura em remoções. Nesse cenário, aos grupos sociais excluídos incide a responsabilidade de resolver os problemas criados pela mercantilização da cidade. Seja com as favelas ou com o Termo Territorial Coletivo, os resultados são contribuições significativas para a criação de moradias dignas. A possibilidade de unir essas ações já consolidadas traça um futuro animador para a luta pelo direito à moradia no Brasil.
Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

SANTOS, Rebeca Landeiro dos; MIRANDA, Paula Menezes Salles de. SOLUÇÃO DOS EXCLUÍDOS: FAVELA E TERMO TERRITORIAL COLETIVO.. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/486013-SOLUCAO-DOS-EXCLUIDOS--FAVELA-E-TERMO-TERRITORIAL-COLETIVO. Acesso em: 05/06/2025

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