AS CASAS FICAM, A LINHA DE TREM SAI: REMOÇÃO FORÇADA DE POPULAÇÃO RESIDENTE EM FAIXAS DOMÍNIO DE FERROVIAS, O CASO FREXEIRAS/PE

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

Título do Trabalho
AS CASAS FICAM, A LINHA DE TREM SAI: REMOÇÃO FORÇADA DE POPULAÇÃO RESIDENTE EM FAIXAS DOMÍNIO DE FERROVIAS, O CASO FREXEIRAS/PE
Autores
  • Natália Farias Menelau de Almeida
  • Kaemely Rafany Gomes De Lima
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 04 – Despejos, remoções e conflitos fundiários
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/485971-as-casas-ficam-a-linha-de-trem-sai--remocao-forcada-de--populacao-residente-em-faixas-dominio-de-ferrovias-o-ca
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
remoções forçadas; linhas férreas; conflitos fundiários; direito à moradia
Resumo
Cerca de 4.500 famílias, divididas entre oito municípios da Mata Sul de Pernambuco (Escada, Ribeirão, Gameleira, Joaquim Nabuco, Palmares, Catende, Jaqueira e Maraial) estão ameaçadas de despejo judicial iminente por ações propostas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes Terrestres (DNIT) e pela Empresa Ferrovia Transnordestina Logística Ltda. (FTL); o motivo é a ocupação da faixa de domínio que representa a extensão de terras com 15m paralelos para cada lado da linha, como previsto no Art. 4º, inciso III-A, da Lei Federal de Uso e Ocupação do Solo. A FTL, sem possuir um projeto objetivo para a área e sem sequer ter monitorado o terreno durante mais de 40 anos, ingressou com um ações de reintegração de posse. Os processos tramitam desde 2011 e encontram-se em estágios diferentes. Em fevereiro de 2020, em plena pandemia da COVID-19, chegou ao pequeno distrito de Frexeiras do Município de Escada, a notícia de execução da sentença do processo judicial nº 0007494-80.2011.4.05.8300 que tramita na Justiça Federal contra 150 famílias. A sentença, que não precisava o alcance da decisão, indicava a reintegração da posse da área esbulhada e autorizava a demolição das construções no local, sem apresentar nenhuma solução habitacional compensatória. O distrito de Frexeiras fica a 6,5 km de distância do município ao qual pertence, Escada. Está situado na microrregião da Mata Sul do estado de Pernambuco, distante aproximadamente 60 km da capital pernambucana, Recife. Os moradores e moradoras de Frexeiras vivem de maneira muito precária, já que metade da população trabalha no corte de cana de açúcar, seja recebendo menos de um salário mínimo por mês, seja fazendo “bicos” incertos e muito mal remunerados para os usineiros da Mata Sul, que às vezes pagam com um prato de comida inadequada para o trabalho, como cuscuz com salsicha. Além disso, estima-se que mais de 30% (trinta por cento) da população de Frexeiras seja analfabeta. Um dado chocante que pode ser citado também é que no distrito inteiro não há disponibilidade de redes de banda larga móvel (3G, 4G). Pouquíssimas famílias têm rede local de acesso sem fio (Wi-Fi) em casa, o que os deixa ainda mais isolados e vulneráveis. Em razão da iminência de despejo, da maior vulnerabilidade de Frexeiras em relação às demais localidades atingidas e do descaso da prefeitura, escolhemos detalhar esse caso. O objetivo deste trabalho é discutir a luta dos moradores e moradoras de Frexeiras para ser assentados, que enfrentam diversas problemáticas existentes na legislação sobre faixas de domínio de linhas férreas. 2 CONFLITO FUNDIÁRIO EM LINHA FÉRREAS: CASO FREXEIRAS O conflito urbano fundiário instalado na comunidade da Frexeiras tem raízes em decisões políticas baseadas numa perspectiva rodoviarista para a circulação de pessoas e bens - em detrimento do investimento na rede ferroviária. O processo de industrialização no governo do presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961), a implantação da indústria automobilística e a pressão da indústria multinacional do petróleo demandaram uma maior integração nacional. Para dar conta desta necessidade, a opção do Estado brasileiro foi o investimento na construção de estradas. Com a instalação da ditadura civil/militar (1964-1985) o programa de integração por meio da interiorização se intensificou, e mais uma vez o orçamento para transportes terrestres priorizou a construção de rodovias. Com isso as ferrovias seguiram no processo de desmonte e sucateamento. Abandonadas ou subutilizadas, as áreas remanescentes das ferrovias passam a ser uma opção de moradia para as populações historicamente excluídas do mercado imobiliário formal; num período de grande crescimento demográfico nas cidades brasileiras, essas populações passam a ocupar as faixas de domínio. Esse histórico nos mostra que não se trata de um fenômeno pontual do distrito de Frexeiras. Pelo contrário, acontece em todo o território nacional, e também no estado de Pernambuco se pode identificar a interface entre territórios populares e a rede ferroviária em todo Brasil. A linha que corta o distrito de Frexeiras é a chamada Linha Sul, ou Recife-Maceió. Ela é uma junção de três ferrovias: i) a Estrada de Ferro (E.F.) Recife ao São Francisco, aberta entre 1858 e 1862 (foi a segunda ferrovia a ser aberta no Brasil); ii) a E. F. Sul de Pernambuco, aberta entre 1882 e 1894 e iii) a E. F. Central de Alagoas, aberta em trechos entre 1871 e 1884, arrendada em 1880 à The Alagoas Railway Co.. A primeira ligou Recife a Una (hoje Palmares), a segunda, Una a Imperatriz (hoje União dos Palmares) e a terceira, Imperatriz a Maceió. Esta linha foi inabilitada no final da década de 1970 e alguns ex-funcionários ganharam casas construídas na área de domínio pertencentes ao patrimônio da Ferrovia, pelos bons serviços prestados às companhias de trens. Por se tratar de área pública, a população mais vulnerável conseguiu com o pouco que ganhava erguer casas na beira dos trilhos, que por estarem abandonados não apresentavam riscos de acidentes. Mal sabiam eles, no entanto, que as faixas de domínio possuem uma área non aedificandi (não edificante), além de uma legislação bastante antiga e confusa que deixa até os magistrados inseguros na hora de aplicá-las. Segundo o Glossário de Transportes Terrestres da Agência Nacional de Transportes Terrestres, faixa de domínio é a “[...] área de terreno destinada pelo Poder Público para a implantação e a proteção das vias e seus acessórios”. O inciso III-A do art. 4º, da Lei Federal nº. 6.766/79 estabelece reserva obrigatória de uma faixa não edificável de, no mínimo, 15 metros de cada lado da linha férrea: “Art.4º[...] III-A. – ao longo das águas correntes e dormentes e da faixa de domínio das ferrovias, será obrigatória a reserva de uma faixa não edificável de, no mínimo, 15 (quinze) metros de cada lado" . Trata-se, portanto, de uma limitação administrativa sobre o direito de propriedade, tendo em vista que os terrenos não são necessariamente de propriedade da União, mas podem ser considerados bens públicos em virtude da destinação. Quando a faixa de domínio encontra-se dentro de propriedade particular ela se caracteriza como o que também conhecemos por área non aedificandi (não edificante). Em resumo, de acordo com estudo jurisprudencial realizado por Rodrigues: Os Tribunais interpretam o Decreto 2.089/63, que trata sobre a faixa de segurança de 6 metros, para livre circulação dos Trens como um bem público e no tocante a faixa de domínio prevista na Lei 6.766/79 de 15 metros sendo mera limitação administrativa na modalidade de não fazer, ou seja, não edificar. De acordo com a Medida Provisória 2220/2001, em se tratando de ocupação em área pública, os poderes públicos Federal, Estadual ou Municipal não poderiam se eximir da responsabilidade de garantir uma opção de moradia às famílias da Comunidade da Frexeiras. A MP prevê, em seu art. 4º, que no caso de ocupações localizadas em áreas que acarretem risco à vida ou a saúde dos ocupantes, e que, portanto, não seja passível de regularização (como é o caso das casas que se encontram dentro da faixa de segurança dos trilhos), o Poder Público deverá garantir ao possuidor o exercício do direito à moradia em outro local. Da mesma forma o §2º do art. 39 da Lei 13.465/2017 que dispõe sobre a regularização fundiária urbana e rural prevê que envolva áreas de riscos que não comportem eliminação, correção ou administração, os municípios deverão proceder à realocação dos ocupantes do núcleo urbano informal a ser regularizado”. 3 AS CASAS FICAM, A LINHA DE TREM SAI É Importante mencionar que não se está discutindo discutindo a importância ou não da reativação da ferrovia. Apesar de não haver nenhum projeto feito e nem previsão de quando ela poderia vir a ser reativada, este parecer ser um empreendimento de importância para o desenvolvimento do Nordeste. O que pretendemos trazer aqui é a reivindicação e a garantia do direito à moradia das populações afetadas, e que o transporte ferroviário não se torne privilégio de algumas poucas empresas, mas que seja para o benefício de todas e todas. Que seu uso seja feito dentro de uma perspectiva de cidade como produção coletiva, fruto de vários atores, e não apenas de um Estado cuja legislação fria e anacrônica não contempla a realidade informal que atravessa todo o processo de formação das cidades latino-americanas. Em Frexeiras não existem, hoje, 150 (cento e cinquenta) moradias para alugar e assegurar o direito de moradia digna para as famílias despejadas, o que torna todo processo de remoção forçada muito mais desgastante para moradores e moradoras. Várias alternativas foram apresentadas: a desapropriação de áreas vazias pertencentes a usineiros para reassentamento; o uso de uma área próxima ao cemitério de Frexeiras, abandonada pelo poder público há anos, ou ainda o desvio da linha férrea, já os trilhos foram arrancados e o que sobrou está completamente inutilizável por conta do acúmulo de lixo e do avanço da vegetação. Os juízes e o poder público, no entanto, não estão preocupados em fazer prevalecer o direito à moradia que é um direito humano garantido pelo art. 6º da Constituição Federal de 1988
Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

ALMEIDA, Natália Farias Menelau de; LIMA, Kaemely Rafany Gomes De. AS CASAS FICAM, A LINHA DE TREM SAI: REMOÇÃO FORÇADA DE POPULAÇÃO RESIDENTE EM FAIXAS DOMÍNIO DE FERROVIAS, O CASO FREXEIRAS/PE.. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/485971-AS-CASAS-FICAM-A-LINHA-DE-TREM-SAI--REMOCAO-FORCADA-DE--POPULACAO-RESIDENTE-EM-FAIXAS-DOMINIO-DE-FERROVIAS-O-CA. Acesso em: 04/06/2025

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