IMPACTOS DA ADPF 828 NAS OCUPAÇÕES DURANTE A PANDEMIA NA CIDADE DE RECIFE

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

Título do Trabalho
IMPACTOS DA ADPF 828 NAS OCUPAÇÕES DURANTE A PANDEMIA NA CIDADE DE RECIFE
Autores
  • Clara Vitória da Cruz albuquerque
  • Jéssica Tamires da Silva
  • Julia Clariane Neves Samir Cruz
  • Lorena Azevedo dos Santos
  • Milena Kelly Xavier da Silva
  • Paula Gabriela de Albuquerque Soares
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 04 – Despejos, remoções e conflitos fundiários
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/485903-impactos-da-adpf-828-nas-ocupacoes-durante-a-pandemia-na-cidade-de-recife
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
ADPF 828, Pandemia, Despejos, Moradia, Recife
Resumo
1 INTRODUÇÃO O presente resumo tem como escopo promover o estudo dos impactos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 828 nas ocupações da cidade do Recife durante a crise sanitária do COVID-19. A partir do deferimento de liminar na ADPF nº 828, em junho de 2021, pelo Ministro Luís Roberto Barroso, foi determinada a suspensão de todos os processos, procedimentos, medidas administrativas ou judiciais que resultem em despejos, desocupações, remoções forçadas ou reintegrações de posse durante o período pandêmico, garantindo a segurança e o direito à moradia de milhares de famílias. Segundo os dados atualizados até fevereiro de 2022, disponibilizados no site da Campanha Despejo Zero, o Estado de Pernambuco é um dos três Estados com maior número de famílias ameaçadas de despejo. Nessa esteira, a cidade do Recife foi uma das mais atingidas pelas remoções durante a pandemia. Com valores de aluguéis cada vez mais altos e sem reajuste real no salário mínimo, não resta alternativa à população da capital pernambucana se não a ocupação de terrenos que não atendam à função social da propriedade. Em que pese ser o direito social à moradia assegurado pela Constituição, a realidade das ocupações da cidade do Recife demonstra que a resposta do Poder Público à população se dá pela via das intimidações e da ameaça . O propósito deste texto é demonstrar que, ainda que as ocupações da cidade do Recife tenham sido afetadas pelo poder público durante a pandemia do COVID-19, a liminar concedida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 828 é essencial para a garantia do direito à moradia das famílias vulneráveis, especialmente em tempos de crise sanitária. 2 DESENVOLVIMENTO É cediço que, na história do Brasil, desde o período colonial, a partir da divisão da terra em capitanias hereditárias, até os dias atuais, com as expressas desigualdades sociais e o domínio do grande capital, as cidades são marcadas pela disputa de territórios. Isso porque existe uma má distribuição de espaços, ensejando uma grande concentração de terras nas mãos da elite. Tal fato acarreta a falta de oportunidade de moradia para pessoas mais vulneráveis e que não têm condições de comprar ou financiar casa pelas grandes construtoras do país. A pandemia de Covid-19, declarada em 11 de março de 2021, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), agravou problemas históricos do país causados por esse contexto de disputas territoriais: o aumento massivo do desemprego, bem como o aumento do valor dos aluguéis e o crescente déficit habitacional. Na cidade do Recife o cenário não foi diferente. No que tange à questão do desemprego, o Estado de Pernambuco, que já era o 3º do país em número de pessoas desempregadas no segundo trimestre de 2019 - com a taxa de desemprego de 15,8%, experimentou agravamento da situação, uma vez que, no 4º trimestre do ano de 2021, era o Estado com a maior quantidade de desempregados no país, atingindo a taxa de desemprego de 19,9% . A informalidade também teve uma alta expressiva nesse período, passando de 48% em 2020, para 51,1% no ano de 2021 . Já com relação ao valor dos aluguéis, a capital pernambucana destaca-se no país pelos preços e aumentos excessivos. De acordo com levantamento realizado pelo FipeZap trazido pelo Jornal do Commercio , Recife é a capital com maior alta no preço de aluguel residencial do Brasil, com aumento acumulado do ano, até setembro de 2021, de 8,31%, enquanto a média nacional foi de 1,80%/ano. Com dificuldades de renda, é quase impraticável que famílias em situação de extrema vulnerabilidade consigam arcar com valores de aluguel exorbitantes. Somado a isso, o déficit habitacional na cidade do Recife, que já era uma grande problemática antes da pandemia, aumentou consideravelmente durante o período de calamidade pública. De acordo com estudo da Fundação João Pinheiro , no ano de 2019, o déficit habitacional na Região Metropolitana recifense já era de 113.275 unidades habitacionais. Estudos recentes da Ecconit , solicitados pela Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias, indicam que, até o ano de 2030, a demanda de Recife será de 233.162 unidades habitacionais. A convergência de todos esses fatores desencadeou o agravamento da situação do déficit habitacional, fazendo com que muitas famílias, em situação de vulnerabilidade e desamparadas pelo Estado, buscassem nas ocupações uma forma de garantir minimamente o seu direito à moradia. Em face de tal quadro, que se reproduz, em maior ou menor medida, nas demais unidades da federação, que o Partido Socialismo e Liberdade apresentou Arguição de Descumprimento de Preceito Federal perante o Supremo Tribunal Federal. Em síntese, a ADPF busca suspender atos do Poder Público relativos a despejos, desocupações e reintegrações de posse, respeitando, assim, o direito social à saúde, bem como os direitos fundamentais à vida e à moradia, posto que alijar inúmeras famílias de suas residências durante o período pandêmico agravaria ainda mais a situação de crise sanitária. Na decisão proferida em 3 de junho de 2021, o Ministro Luís Roberto Barroso deferiu parcialmente a liminar pleiteada, distinguindo três diferentes situações: i) ocupações antigas, anteriores à pandemia, hipótese na qual as decisões deveriam ser suspensas pelo prazo de 6 meses; (ii) ocupações recentes, posteriores à pandemia, situações em que as decisões deveriam ser suspensas até a apresentação de alternativa habitacional pelo Poder Público; e (iii) despejo liminar de famílias vulneráveis, hipótese em que a decisão deveria ser suspensa por 6 meses. Em nível estadual, em março de 2020, como medida emergencial, foi protocolado na Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco o Projeto de Lei 1.010, visando a mitigar as remoções forçadas durante a pandemia. Depois de quase um ano de discussões, o PL 1.010/2020 foi aprovado, tornando-se a Lei Estadual nº 17.400/2021 . Conhecida como Lei Despejo Zero, tal norma proíbe ações de despejo e reintegração de posse no Estado enquanto perdurar a emergência em saúde pública. Para além do âmbito legislativo, o Tribunal de Justiça de Pernambuco, em julho de 2020, pela Corregedoria Geral de Justiça, publicou Instruções Normativas prevendo a adoção de medidas preventivas para a redução dos riscos de contaminação pelo novo coronavírus referentes à atuação dos oficiais de justiça no cumprimento de mandados judiciais, incluindo o cumprimento de ordens de reintegração de posse. Nesse quesito, vale destacar que o Poder Judiciário estadual estava em harmonia com a Recomendação nº 90, aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça, em 02 de março de 2021, a qual prescreve aos órgãos do Poder Judiciário que evitem despejos e remoções coletivas durante a pandemia. A ADPF 828 teve um significativo impacto no Grande Recife, diante de toda a problemática imobiliária em que a cidade se encontra, permitindo a garantia de moradia para milhares de famílias de diversas comunidades ocupadas antes e durante o período pandêmico. A exemplo disso, o Movimento Unido dos Sem Teto (MUST), em meio à crise sanitária de Covid-19, deu início à Ocupação Chico Lessa, às margens da BR-101, na Zona Oeste do Recife, abrigando mais de 500 famílias . Nesse caso, houve decisão favorável às famílias em sede de agravo de instrumento, permitindo a permanência delas no local nos termos da liminar. Outra referência é dada pelos integrantes do Movimento de Resistência e Luta pelo Teto (MRLT) que, em 17 de maio de 2021, ocuparam o edifício Segadas Vianna, pertencente ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e localizado no bairro Santo Antônio, na Zona Central do Recife. A Ocupação Leonardo Cisneiros, abrigando cerca de 350 famílias, resiste, buscando efetivar o princípio da função social da propriedade, já que há anos o prédio encontrava-se fechado, acumulando dívidas de IPTU junto ao Município. Para que fosse assegurada a solução de moradia para estas famílias, seja através de moradia popular, abrigos ou auxílio-aluguel, a Defensoria Pública da União no Recife manifestou-se em juízo com base na ADPF 828 e na Recomendação n° 90/2021, do CNJ. Por fim, outro exemplo emblemático do impacto da ADPF 828 na cidade do Recife é a Ocupação 8 de Março, localizada em terreno que estava abandonado há cerca de 20 anos, no bairro de Boa Viagem, a qual abriga mais de 350 famílias ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Em virtude da iminência de despejo diante de decisão liminar deferida em primeiro grau, o MTST tomou as ruas da cidade do Recife protestando contra o despejo dessas centenas de famílias e, juntamente com a Defensoria Pública do Estado de Pernambuco, levou a questão ao Supremo Tribunal Federal, por meio de Reclamação Constitucional. O Ministro Edson Fachin determinou a suspensão da liminar de reintegração de posse, tomando por base o previsto na ADPF. De acordo com levantamento da Campanha Despejo Zero, entre março de 2020 e maio de 2021, 9.399 famílias estavam ameaçadas de despejo em Pernambuco e 725 famílias foram despejadas no estado. Para além desse quantitativo de famílias que lutam pelo direito fundamental à moradia digna, observar quais espaços estão sendo ocupados pelos movimentos sociais também é importante. Devido ao fomento da especulação imobiliária, os centros históricos passaram a ser revitalizados e convertidos em alojamentos turísticos, expressando um processo de gentrificação e aprofundando a desertificação residencial . Nesse contexto, a aplicação da ADPF 828 se faz essencial para seguir garantindo, ainda que minimamente, o direito à moradia dentro e fora da capital pernambucana. 3. CONCLUSÃO Desta forma, como mencionado, a ADPF 828 visou ao melhor controle de saúde pública, enquanto perdurar a pandemia, uma vez que proibiu ações de despejos e remoções e de ocupações no período a fim de promover um isolamento social mais seguro, assegurando assim preceitos fundamentais de moradia e saúde. Como demonstrado, a medida teve impactos positivos nas ocupações da cidade da Região Metropolitana do Recife, na medida em que garantiu a permanência das famílias nas moradias num cenário de aumento massivo do desemprego, do valor dos aluguéis e do déficit habitacional. Em março de 2022, após diversos atos nacionais reivindicando a prorrogação da medida, o Ministro Luís Roberto Barroso decidiu estender o veto de despejos e desocupações até junho deste mesmo ano. Apesar da vitória popular, a decisão destaca que, salvo se a pandemia recrudescer, esta deve ser a última prorrogação do prazo, tendo em vista que, com o fim da crise sanitária, o déficit habitacional não estaria mais ligado à saúde, mas à falta de políticas públicas. Diante do exposto, conclui-se que a pandemia do COVID-19 teve um reflexo direto no avanço da vulnerabilidade social, sendo a ADPF 828 uma medida fundamental para garantia do direito à moradia na cidade do Recife e Região Metropolitana. Superada a pandemia do COVID-19, o cenário de instabilidade habitacional voltará ao cotidiano de diversas famílias pernambucanas, devendo ser analisado o impacto do fim das suspensões de despejos, desocupações e reintegrações de posse, sem a adoção de uma política habitacional eficaz. REFERÊNCIAS BALANÇO dos dados até fevereiro de 2022. Campanha Despejo Zero, 2022. Disponível em: https://www.campanhadespejozero.org/. Acesso em: 30 mar. 2022. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF n. 828 MC/DF. Relator: Ministro Luís Roberto Barroso, DJe n 107, 07/06/2021. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15346615468&ext=.pdf. Acesso em: 30 mar. 2022 PATRÍCIA da Silva, Georgia; Figueiredo Feretti, Sergio; Sette, Edileuza. Gentrificação e políticas de revitalização nos centros históricos no brasil: processos que levam ao déficit habitacional. Revista de Políticas Públicas, vol. 12, núm. 2, jul. - dez., 2008, pp. 83-91. Universidade Federal do Maranhão São Luís, Maranhão, Brasil. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=321127274009. Acesso em: 31 mar. 2022. SANTOS, Paulo Junior Trindade dos; MARCO, Cristhian Magnus de; Möller, Gabriela Samrsla. Impactos da pandemia no direito à moradia e propostas para a proteção desse direito em tempos de crise: da urgência de se repensar a moradia para além de um objeto de consumo. UERJ, Revista de Direito da Cidade. vol. 13, n. 2, p. 787, 2021. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/rdc/article/view/52800/37533. Acesso em: 30 mar. 2022.
Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

ALBUQUERQUE, Clara Vitória da Cruz et al.. IMPACTOS DA ADPF 828 NAS OCUPAÇÕES DURANTE A PANDEMIA NA CIDADE DE RECIFE.. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/485903-IMPACTOS-DA-ADPF-828-NAS-OCUPACOES-DURANTE-A-PANDEMIA-NA-CIDADE-DE-RECIFE. Acesso em: 23/05/2025

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