PLANEJAMENTO URBANO E PARTICIPAÇÃO POPULAR: METODOLOGIAS PARTICIPATIVAS NA FORMULAÇÃO DE INSTRUMENTOS URBANÍSTICOS

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

Título do Trabalho
PLANEJAMENTO URBANO E PARTICIPAÇÃO POPULAR: METODOLOGIAS PARTICIPATIVAS NA FORMULAÇÃO DE INSTRUMENTOS URBANÍSTICOS
Autores
  • Ana Maria Pacetti
  • Márcio José Catelan
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 09 – Função social da propriedade, desmonte da ordem jurídico-urbanística e efetividade dos instrumentos de política urbana
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/485851-planejamento-urbano-e-participacao-popular--metodologias-participativas-na-formulacao-de-instrumentos-urbanistico
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
planejamento urbano; participação popular; instrumentos urbanísticos; Presidente Prudente
Resumo
1 INTRODUÇÃO No contexto sociopolítico atual, em que há a tendência de retração do Estado devido às políticas neoliberais nas duas últimas décadas e protagonismo da iniciativa privada frente às instituições públicas, já enfraquecidas, vemos o aumento dos problemas urbanos, com urgência da governança como prática à administração pública, cada vez mais emergente e necessária no âmbito local. No caso brasileiro, assistimos o afastamento e retração de manifestação de ativismos em diferentes escalas, seja a do bairro, das microterritorialidades, ou mesmo na escala nacional na agenda da política urbana, ainda que tenhamos conquistado dispositivos legais como o Estatuto da Cidade. Na administração pública, muitos municípios ainda não incorporam os instrumentos do Estatuto da Cidade a práticas do planejamento urbano, assim como muito menos reforçam a relevância da participação popular. Ainda que municípios adotem práticas participativas na gestão pública, o que se observa é a dificuldade em manter a mobilização popular a longo prazo ou mesmo em se lidar com questões burocráticas e financeiras próprias da administração pública. Isso indica a necessidade de repensar metodologias por meio das quais buscamos pôr a participação popular como prática central na elaboração da política urbana e das práticas urbanísticas nas escalas espaciais que vão da nacional à local. Os ativismos de bairro tornam-se fundamentais nesse contexto, considerando que na dimensão do bairro ganham relevância questões específicas referentes à organização social dos moradores e às suas necessidades e reivindicações. Sabendo que muitas vezes, nos espaços de discussão dentro do planejamento urbano – como audiências públicas e fóruns – prevalecem pessoas com maior grau de instrução ou grupos que já estão no poder. Trabalhar a participação popular em um bairro, diretamente com os moradores, pode ser um caminho para que uma cultura participativa se estabeleça de forma mais efetiva, oferecendo práticas político-pedagógicas que as ações participativas possuem enquanto forma de alcançar uma sociedade mais autônoma, assim como colocado por Souza. Neste sentido, o objetivo deste trabalho é demonstrar como a metodologia dos grupos focais realizada em um bairro da cidade de Presidente Prudente/SP pode ser utilizada para garantir a participação daqueles que geralmente não são ouvidos nas discussões sobre a cidade e no planejamento urbano, refletindo na análise e revisão dos instrumentos da política urbana para torná-los mais efetivos, além de contribuir para a formação política-pedagógica através do compartilhamento de informações técnicas com os moradores a fim de oferecer-lhes condições mínimas para opinarem a respeito do que tem sido feito e do que poderia ser mudado. 2 APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS O grupo focal é um procedimento metodológico qualitativo que consiste na coleta de dados através da discussão de um determinado tópico por meio de interações entre um grupo de pessoas. As análises do grupo se concentram em identificar “o sentido oculto, as representações ideológicas, os valores e os afetos vinculados ao tema investigado”, já que se tem o pressuposto de que o discurso ideológico das relações sociais é reproduzido por grupos menores em discussões. Este procedimento foi adotado neste trabalho como base para a construção de um plano de diretrizes a serem consideradas no planejamento urbano da cidade de Presidente Prudente/São Paulo, considerando as demandas dos bairros Vila Nova Prudente, Vila Maria e Vila Mariana (popularmente chamados de apenas Vila Nova Prudente) que estão localizados na região sudeste de Presidente Prudente. Os bairros são considerados de média exclusão social, conforme análise de indicadores sociais baseados na renda e que permitem espacializar níveis de exclusão social e possui cerca de 828 moradores e 288 domicílios de acordo com o último censo do IBGE. Os bairros pouco foram expandidos e não adquiriram centralidade no que diz respeito à consolidação de comércios, equipamentos e serviços públicos. Em muito se deve à sua localização na cidade, em que barreiras físicas como a rodovia Raposo Tavares, a Área de Preservação Permanente - APP, o Recinto de Exposições e a presença de indústrias ao seu redor, impediram a construção de novos loteamentos. Além disso, a própria dinâmica de expansão da cidade, no sentido oposto ao do bairro, contribuíram com a condição socioespacial de separação da dinâmica destes bairros em relação à cidade. Essa configuração gera demanda por mais serviços, sobretudo de comércio e lazer conforme relatos dos próprios moradores, como também torna necessário um olhar para a forma como a política urbana municipal, através de seus instrumentos, influencia na configuração do bairro e seus arredores. Com isso, após realização de trabalhos de campo e aplicação de questionários com a população local, realizamos dois grupos focais com alguns moradores em que foram debatidos temas referentes à sua relação com o bairro e com o poder público, à organização comunitária dali e a fundamentos básicos sobre o planejamento urbano. Os encontros aconteceram na casa do representante de bairro e, além dos autores, participaram sete moradoras(es). A única participante não residente foi a diretora da creche local, que apesar de não viver ali exerce importante papel político e intermediou nosso primeiro contato com as pessoas do bairro, indicando os diversos perfis que poderiam compor a dinâmica. O primeiro grupo focal foi conduzido com questões sobre a relação dos moradores com o bairro, sobre as formas com que as demandas dali eram resolvidas e como exerciam participação a nível das instituições públicas. Este momento foi muito importante para ouvir mais sobre a história dos bairros e de sua formação, uma vez que durante a pesquisa para o trabalho praticamente não foram encontrados estudos a respeito dos bairros, sendo os relatos de moradores mais antigos fundamentais.Foi falado também da organização política nessa época e de como isso foi importante para pleitear alguns direitos básicos, como o asfaltamento das ruas, instalação de sistema de esgoto e energia elétrica, fundamentais para consolidação dos loteamentos. Percebemos que após esse período houve um momento de maior vitalidade nos bairros e envolvimento comunitário através de festas realizadas pela igreja católica local e pela escola estadual Dr. João Ceribelli Pacca - uma das maiores queixas, inclusive, foi o fechamento da escola sem consulta prévia à população. Nos questionários aplicados, 84% das pessoas que responderam apontam a falta de escola como um dos problemas característicos lo local. De acordo com os moradores, a escola é um espaço importante, não só em relação à educação, mas principalmente para o envolvimento da população com as questões locais - a exemplo de festas em datas comemorativas, projetos sociais com mães e pais de estudantes, campanhas contra a dengue junto da comunidade, entre outros. Foi consenso na discussão o fato de que a saída de muitos moradores em direção a outros loteamentos e o fechamento da escola contribuíram significativamente para a perda de vitalidade, o insucesso de comércios que ali tentaram se fixar e o menor engajamento das pessoas nas demandas do bairro. Esta questão também aparece nas respostas dos questionários, em que apenas 6% das pessoas abordadas afirmam participar efetivamente de reuniões para tratar de assuntos locais. Somado a insatisfação e às demandas, os moradores relataram a pouca representatividade em instâncias públicas e a dificuldade de diálogo com o poder público, indicando ações pontuais e de forma individual em que isso ocorreu (como por exemplo uma diretora pedir para realizar a poda de terreno vazio adjacente à creche ou então o representante de bairro encaminhando alguma demanda específica). Durante a dinâmica também percebemos o desconhecimento dos moradores a respeito dos instrumentos da política urbana e de outras formas de participação, como as audiências públicas de revisão do plano diretor municipal, que aconteceram no mesmo ano de realização deste trabalho. Para a realização do segundo grupo focal trabalhamos com formação para os moradores e discussão das análises realizadas na área do bairro e dos desejos para o local em que viviam e seu entorno. Passamos a uma breve explicação sobre fundamentos do planejamento urbano, através de um folheto que foi distribuído aos presentes, intitulado “Introdução ao Planejamento Urbano”. Através disso, houve uma melhor compreensão sobre os instrumentos do Estatuto da Cidade que normalmente conduzem a política urbana - além dos princípios do Estatuto, tratamos sobre o plano diretor, a lei de zoneamento urbano, o parcelamento do solo, as sanções sucessivas e o sistema viário. Conforme o debate avançava, aplicávamos exemplos destes instrumentos nas questões referentes ao bairro. Além disso, com o auxílio de um mapa, apresentamos a área do bairro e seu entorno aos moradores. Este momento foi muito importante, uma vez que o grupo manifestou aquilo que desejava para o lugar em que vivia e o que poderia atender suas necessidades enquanto moradores. Os pontos sugeridos por eles foram sendo desenhados no mapa, sendo que as principais questões referem-se à urbanização do vazio urbano adjacente aos bairros visando cumprir a função social da propriedade e a atração de mais pessoas para a região, à melhoria do acesso por pedestres para além da passarela existente (a qual não apresenta conforto para pedestres e foi apontada pela maioria como perigosa), às questões ambientais relativas à APP nos limites do bairro, e finalmente à mudança de zoneamento do entorno. Em relação a essa última, consideramos o que eles apontaram que mais gostariam que existisse na área em frente ao bairro, atravessando a rodovia: mais comércios e área de lazer. Toda a discussão e sugestões propostas nos grupos focais foram consideradas no desenvolvimento da conclusão do trabalho. Partimos disso, do olhar local, para pensar em propostas e possíveis soluções, contrapondo um olhar “tecnicista” que desconsidera a dimensão social na construção das leis que regem as políticas municipais, ou seja, não avalia qual a população, quais atividades e quais formas de expressão espaciais se dão nas partes da cidade para assim determinar, coletivamente, como elas serão direcionadas no futuro. Com base no levantamento realizado, entendemos que muitos dos problemas dos três bairros, sobretudo por sua condição de quase isolamento na cidade, foram influenciados pela política urbana municipal. Por esse motivo, fizemos uma revisão da área dos bairros a partir das leis do perímetro urbano (Lei Complementar Municipal 193/2013) e do zoneamento (Lei Complementar Municipal 153/2008), relacionando-as com questões ambientais (Lei Federal 12.651/12 - que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa) e com o sistema viário (Plano municipal de mobilidade urbana de 2014). O novo perímetro urbano aprovado pela lei 193/2013 foi estendido no sentido sul e sudeste da cidade, incluindo novas áreas onde o bairro está localizado, sendo um ponto favorável à implantação de novos empreendimentos nesta porção da cidade. Já em relação ao zoneamento, percebe-se que apesar destes bairros estarem em uma zona residencial, as áreas de seus entornos prevêem uso industrial, de exposição para eventos ou de proteção permanente, não favorecendo a expansão do bairro ou a atração de empreendimentos de comércio e serviços - maior desejo dos moradores. Manter zonas residencial e industrial próximas contraria o que está disposto no artigo 2º do Estatuto da Cidade, o qual propõe o ordenamento e controle do uso do solo de modo a evitar a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes. Esse problema ganha um agravante quando sobreposto com a questão ambiental, uma vez que vemos a demarcação de zona industrial muito próxima a vegetação e a importantes nascentes e cursos d'água existentes ali na região. Uma dessas zonas, ademais, é onde localiza-se um aterro sanitário com uso já consolidado. Por isso, propusemos modificações na lei de zoneamento. Pelo mapa de hierarquia de vias da área, nota-se que o sistema viário imediato ao bairro é composto por vias com larguras consideráveis, tráfego intenso e alta velocidade. Todas estas vias são muito hostis ao pedestre e sua travessia se dá por meio de uma passarela, a qual não possui um desenho que seja confortável para quem caminha por ali. Apesar disso, tais vias, por terem essas características, facilitam o acesso a qualquer um dos pontos por automóveis, e por isso favorecem a instalação de comércios e serviços. O que precisa ser feito são as adaptações necessárias para que a transposição da barreira imposta pela rodovia Raposo Tavares ocorra de forma segura e mais confortável para pedestres e ciclistas. 3. CONCLUSÃO Vimos que as metodologias qualitativas são, portanto, um instrumento a ser incorporado no processo de construção do planejamento urbano, considerando o potencial de elaboração participativa, o que contribuiria com as decisões, diretrizes e articulações feitas com os instrumentos jurídicos urbanísticos. A participação das e dos participantes no grupo dos bairros nos quais o realizamos deixou muito claro que basta um ambiente que estimule e dê possibilidade das muitas vozes que vivem e produzem a cidades a falar. Falar das ausências de políticas, de algumas ações efetivas que, se apoiadas nos instrumentos jurídico-urbanísticos, poderiam chegar a uma construção mais equitativa do direito à cidade e da participação popular.
Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

PACETTI, Ana Maria; CATELAN, Márcio José. PLANEJAMENTO URBANO E PARTICIPAÇÃO POPULAR: METODOLOGIAS PARTICIPATIVAS NA FORMULAÇÃO DE INSTRUMENTOS URBANÍSTICOS.. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/485851-PLANEJAMENTO-URBANO-E-PARTICIPACAO-POPULAR--METODOLOGIAS-PARTICIPATIVAS-NA-FORMULACAO-DE-INSTRUMENTOS-URBANISTICO. Acesso em: 04/07/2025

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