A ATUAÇÃO DO ESTADO NAS REMOÇÕES DOS ATINGIDOS PELA MINERAÇÃO DA BRASKEM EM MACEIÓ-AL

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

Título do Trabalho
A ATUAÇÃO DO ESTADO NAS REMOÇÕES DOS ATINGIDOS PELA MINERAÇÃO DA BRASKEM EM MACEIÓ-AL
Autores
  • Gustavo Figueiredo Lima
  • Mirella Murta Gomes Rizzo
  • Júlia Amorim Bulhões
  • Caroline Gonçalves dos Santos
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 04 – Despejos, remoções e conflitos fundiários
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/485358-a-atuacao-do-estado-nas-remocoes-dos-atingidos-pela-mineracao-da-braskem-em-maceio-al
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
Remoções, Estado, Subsidência do solo, Sal-gema, Braskem
Resumo
1 INTRODUÇÃO Maceió, capital do estado de Alagoas, passa atualmente por um processo de migração intraurbana que afeta diretamente cerca de 57 mil pessoas em pelo menos 4 bairros da cidade: Bebedouro, Bom Parto, Mutange e Pinheiro, além dos limites do bairro Farol. Tal fato ocorre após o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) identificar, em maio de 2019, um processo de subsidência do solo na área, decorrente da atividade de mineração de sal-gema em 35 poços operados pela empresa Braskem (BRASIL, 2019). Os estudos que levaram a essa conclusão foram solicitados após o agravamento de fissuras, trincas e rachaduras em ruas e imóveis no bairro Pinheiro, decorrentes de fortes chuvas em fevereiro de 2018 e de um tremor de terra que atingiu 2,5 pontos na escala Richter em março daquele mesmo ano (segundo LabSis/UFRN). A supracitada matéria prima é explorada desde a década de 1970 em solo alagoano. A extração foi iniciada pela empresa Salgema que, com aval do Estado, instalou sua fábrica de cloro-soda em uma região ambientalmente frágil no bairro Pontal da Barra, já que se trata de uma ponta de restinga. Na época, o biólogo e ambientalista Geraldo Marques, que estava à frente da Secretaria Executiva de Controle e Poluição – atual instituto de meio ambiente de Alagoas –, relembrou, em entrevista de 2019 à TV Assembleia, que sua equipe teve acesso a documentos e estudos que alertavam sobre o risco de subsidências do solo na cidade, além de possíveis explosões e contaminações no entorno da planta industrial em uma área residencial já consolidada. No entanto, em um contexto nacional de governo centralizador e ditatorial, suas recomendações foram ignoradas. Em 1996, após mudança de administração, a empresa passou a se chamar Trikem, e posteriormente, em 2002, fundiu-se com outras companhias do mesmo setor e originou a Braskem, que incorporou as operações de extração existentes (BRASKEM, 2022). No presente, as consequências sociais, urbanas e ambientais agravadas pela subsidência do solo nas regiões de extração da empresa do grupo Odebrecht incluem a remoção de moradores dos bairros atingidos; a perda de equipamentos de saúde e educação; a redução da mobilidade urbana pela interdição de importantes eixos viários e VLT; o aumento no preço dos imóveis em Maceió e sua na região metropolitana decorrente do crescimento da procura; além de efeitos negativos na preservação do patrimônio histórico e cultural da área. Nessa conjuntura, entende-se que o Estado deve atuar de forma coerente a seus princípios, visando salvaguardar o bem-estar social e permitir a regulação de disputas existentes no meio urbano. Contudo, Mendes (2016) aponta que situações extremas de catástrofe, como é considerado aqui o caso analisado, revelam a verdadeira natureza do capitalismo – o uso do desastre como uma oportunidade de negócio dentro da lógica neoliberal. Dessa forma, este resumo expandido objetiva refletir sobre a atuação do Estado enquanto mediador de conflitos urbanos, em particular sobre o caso de subsidência do solo nos bairros Bebedouro, Bom Parto, Mutange, Pinheiro e Farol, analisando a atribuição de responsabilidade à empresa Braskem e suas implicações no exercício de funções estatais, como a condução das realocações (ou melhor, remoções) dos atingidos. Para tal, utiliza-se como procedimentos metodológicos: revisão bibliográfica e consulta a notícias, relatórios técnicos e documentos oficiais, com vista a corroborar essas percepções. 2 APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS Mendes (2016) afirma que o Estado é quem garante a reconstituição de laços sociais e comunidades em situações de conflitos, mas salienta que, ao mesmo tempo, o Estado esteve ao longo dos anos amplamente ligado às bases de capitalismo dependente, resultando em lógicas de atuação heterogêneas e fragmentadas. No caso exposto, o Estado respondeu inicialmente solicitando os estudos supracitados e decretando estado de calamidade pública (município), executando obras de reparo e monitoramento local (município), suspendendo as licenças ambientais da Braskem (estado) e repassando R$ 14 milhões para a defesa civil e auxílio emergencial de moradia (governo federal). Porém, desde que se iniciou o processo de remoção das pessoas da área de risco, o Estado tem permanecido em silêncio, abrindo espaço para que a Braskem seja protagonista dessas ações. Ainda que as Defesas Civis Nacional e Municipal participem da elaboração do “Mapa de Setorização de Danos”, fica evidente o conflito de interesses nas decisões que determinam os limites da área de risco e as áreas alvo da desocupação. Um exemplo disso é quando, em maio de 2021, o Gabinete de Gestão Integrada da Prefeitura de Maceió – GGI – elaborou, junto à Defesa Civil, o “Mapa de ilhamento socioeconômico”, recomendando a remoção de moradores das localidades conhecidas como Flexal de Cima e Flexal de Baixo, bem como parte da Rua Marquês de Abrantes, todas no bairro de Bebedouro, devido ao isolamento decorrente da saída de equipamentos públicos e de boa parte do comércio do entorno. Apesar disso, a empresa não acatou a recomendação e, desde então, espera-se um posicionamento e soluções para essa região. Os desdobramentos da remoção dos atingidos são marcados pela unilateralidade dos acordos assinados entre diferentes órgãos públicos (Defensorias Públicas do Estado, da União e Ministérios Públicos Federal e de Alagoas) e Braskem, que evidenciam um afastamento do Estado, principalmente na esfera municipal, do processo de remoção dos atingidos transferindo uma série de responsabilidades para a causadora do problema. Entre os acordos assinados, pode-se destacar o primeiro e o último, respectivamente assinados em dezembro de 2019 e em dezembro de 2020. O primeiro institui a criação do Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação – PCF – pela Braskem. Assim, a empresa conduz o programa prevendo um auxílio de R$ 5 mil para a auxiliar a mudança, R$ 1 mil de auxílio-aluguel, com destaque para a falta de justa e prévia indenização pelo imóvel. Já o último, denominado de “Acordo Socioambiental”, além de extinguir uma ação pública que almejava medidas punitivas, atribui à Braskem uma série de obrigações, que colocam várias decisões e implicações futuras do caso nas mãos de uma empresa privada. Em suma, o papel do Estado nesse acordo se resume a auxiliar a Braskem, muitas vezes somente quando é solicitado, em estudos ambientais e sociourbanísticos, além dos estudos necessários para o fechamento dos poços de sal-gema. Outro ponto que chama a atenção no Acordo Socioambiental é que os órgãos públicos dão abertura para a possibilidade de novas construções na região desocupada, se houver estabilização do solo e se o Plano Diretor de Maceió vier a permitir. Além disso, o acordo determina que a empresa Braskem não deve começar novas atividades de exploração de sal-gema na capital, Barra de Santo Antônio e Paripueira, municípios do litoral norte de Alagoas, até que seja estabelecido um Plano de Melhorias de Compliance Socioambiental. Porém, há uma certa insegurança em futuras explorações feitas pela empresa, visto que esta e o Estado não cumpriram com suas responsabilidades à época de instalação da indústria para evitar que o problema em Maceió atingisse a escala que tem hoje. As remoções em curso de uma área com cerca de 274 hectares resultam em uma série de implicações para a cidade. O problema não se restringe aos mais de 14 mil imóveis desocupados, dos quais pouco mais de 10 mil já receberam indenização, pois há também a desativação de grandes equipamentos urbanos, sendo 24 ligados à saúde, 24 à educação e 17 de uso institucional, além de 13 templos religiosos e o próprio Instituto do Meio Ambiente de Alagoas – IMA, responsável pelo licenciamento ambiental. Soma-se a isso a demanda por esses equipamentos no restante da cidade e a dispersão populacional por Maceió e sua zona metropolitana, atrofiando o senso de comunidade e dificultando a organização de manifestações públicas. É imprescindível que haja articulações político-administrativas para um planejamento metropolitano que responda de maneira responsável às implicações que urgem a partir desse caso. Enquanto isso, percebe-se que o mercado imobiliário responde a esse êxodo intraurbano na capital com aumento do preço dos aluguéis, elevação de ofertas e acréscimo no preço do metro quadrado, ainda mais quando encontra uma cidade sem qualquer regulação do mercado. Além disso, o Plano Diretor de Maceió, que poderia ser um instrumento de regulação da terra urbana eficaz, não consegue corresponder à realidade atual, visto que deveria ter sido revisado até 2015, após 10 anos de vigência. É nessa ausência do Estado que se observa uma cidade fragmentada e na qual é cada vez mais difícil de se adquirir um imóvel. Assim, em fevereiro de 2022 a variação acumulada em 12 meses do preço do m² na capital é de +17,93%, segundo os anúncios de imóveis da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FipeZap). Esse aumento tem destaque em bairros da planície marítima central, litoral norte e bairros da região de platô próximos a área atingida. Ao mesmo tempo em que o Estado não consegue regular essa cidade produzida pelo mercado, ele também não consegue quebrar o ciclo de exclusão e periferização da população com menor poder aquisitivo. Primeiramente, o Estado participou diretamente desse processo quando, em dezembro de 2019, o Município de Maceió, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Caixa Econômica Federal e Braskem assinaram acordo para realocar famílias que moravam no entorno dos poços de sal, majoritariamente provenientes do bairro Mutange. Tratava-se de cerca de 740 famílias que moravam em uma área de risco em encosta e, portanto, pessoas historicamente invisibilizadas pelo poder público e sociedade e que acabam mantendo essa condição ao serem afastadas das centralidades sem um plano estruturado de remoção. Às famílias, foram oferecidas duas opções: um imóvel do programa “Minha Casa, Minha Vida” no bairro do Rio novo – que, mesmo próximo à lagoa, é distante do Centro, sobretudo após a interrupção de trecho do VLT também por conta da subsidência – ou um valor de R$ 84 mil para procurarem imóveis por conta própria, o que as obrigaria a recorrer a locais periféricos. Posteriormente, o Secretário Adjunto de Planejamento Urbano de Maceió, em entrevista concedida aos autores por e-mail em agosto de 2021, afirmou que observa um “inchaço imobiliário” em assentamentos precários no bairro Chã da Jaqueira, devido ao fato de que parte da população que vivia em área de risco na encosta do bairro Mutange mudou-se para lá. Porém, não se há conhecimento de políticas públicas voltadas a esse caso, ou qualquer outro na cidade. 3. CONCLUSÃO OU CONSIDERAÇÕES FINAIS O Estado deveria exercer seu papel de mediador no direcionamento das atribuições dos responsáveis, de forma a controlar e administrar os problemas causados pela mineração. Entretanto, os desdobramentos supracitados demonstram que as autoridades estão transferindo para a empresa muitas das decisões que envolvem o caso. Se o Estado age como uma empresa quando gere a sociedade, será que ele espera que a atuação de uma empresa consiga de fato atuar como Estado? Para além disso, o Estado não está cumprindo com seu dever de reparar e reconstituir os laços sociais, as identidades e memórias da comunidade atingida. Está, pelo contrário, inviabilizando-a e silenciando-a nos processos de decisões a respeito de seus próprios futuros e de seus territórios. Situações de tragédias como a que Maceió vive hoje, resultantes da exploração extrativista, vão continuar a acontecer se não houver um fortalecimento de políticas nacionais de mineração, alinhadas com políticas ambientais, de forma a garantir que as exigências para essas atividades sejam cada vez mais rígidas e assegurem assim a preservação socioambiental. Além disso, é preciso fiscalizar a condução do caso em questão pela empresa causadora do ponto de vista ambiental, bem como rever a continuidade das operações industriais desta em território urbano e suas pretensões futuras. O Estado também deve vislumbrar junto a outros órgãos competentes medidas de responsabilização e estabelecer diretrizes que garantam condições para uma absorção da cidade tecnicamente bem fundamentada diante das inúmeras perdas socio urbanísticas e do adensamento de regiões metropolitanas da cidade, sobretudo envolvendo a política habitacional diante da perda de 4 bairros e do êxodo de mais de 57 mil pessoas. Para suprir boa parte dessas necessidades, é necessário trazer celeridade para a revisão do Plano Diretor Municipal, em vigor desde 2005. REFERÊNCIAS BRASIL. Serviço Geológico do Brasil (CPRM). Estudos sobre a instabilidade do terreno nos bairros Pinheiro, Mutange e Bebedouro, Maceió (AL): Relatório síntese dos resultados no 1. Brasília, DF: Ministério de Minas e Energia, 2019. Disponível em: http://rigeo.cprm.gov.br/jspui/bitstream/doc/21133/1/relatoriosintese.pdf. Acesso em: 04 mar 2022. BRASKEM. Sítio da Braskem. 2022. Disponível em: https://www.braskem.com/alagoas Acesso em 11 mar. 2002 DE OLIVEIRA, Tácio Rodrigues Batista. Entrevista concedida à Gustavo Figueiredo Lima. Maceió, 30 ago. 2021. DOS SANTOS, C. et al. O Estado ante a subsidência do solo em bairros de Maceió-AL: responsabilidades no passado, presente e futuro. NÓS CIEP: I Congresso Internacional Estudos da Paisagem, [s. l.], p. 1-10, 2021. FIPEZAP. Índice Fipezap de Locação Residencial. 2022. G1 AL. O que se sabe sobre as rachaduras no Pinheiro. 17 jan. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2019/01/17/o-que-se-sabe-sobre-as-rachaduras-no-bairro-do-pinheiro-em-maceio.ghtml. Acesso em 20 nov. 2020. MENDES, J. A dignidade das pertenças e os limites do neoliberalismo: catástrofes, capitalismo, Estado e vítimas. In: Sociologias, Porto Alegre, v. 18, n. 43, dez. 2016. p. 58-86. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517 45222016000300058&lng=en&nrm=iso . Acesso em: 04 mar. 2022.
Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

LIMA, Gustavo Figueiredo et al.. A ATUAÇÃO DO ESTADO NAS REMOÇÕES DOS ATINGIDOS PELA MINERAÇÃO DA BRASKEM EM MACEIÓ-AL.. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/485358-A-ATUACAO-DO-ESTADO-NAS-REMOCOES-DOS-ATINGIDOS-PELA-MINERACAO-DA-BRASKEM-EM-MACEIO-AL. Acesso em: 22/05/2025

Trabalho

Even3 Publicacoes