DESMONTE DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA CIDADE: GOVERNO FEDERAL E O DESMONTE DO CONSELHO DAS CIDADES

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

Título do Trabalho
DESMONTE DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA CIDADE: GOVERNO FEDERAL E O DESMONTE DO CONSELHO DAS CIDADES
Autores
  • Eduardo Garcia Ribeiro Lopes Domingues
  • MAYRA PACHECO DA ROCHA
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 09 – Função social da propriedade, desmonte da ordem jurídico-urbanística e efetividade dos instrumentos de política urbana
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/482461-desmonte-da-gestao-democratica-da-cidade--governo-federal-e-o-desmonte-do-conselho-das-cidades
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
Política Urbana, Democracia Participativa, Estatuto da Cidade, Ministério das Cidades
Resumo
1 INTRODUÇÃO A participação popular na gestão pública é conquista histórica proveniente da década de 80, e fruto processo de redemocratização, razão pela qual está cristalizado na Constituição Federal em seu artigo 1º, parágrafo único, que “todo poder emana do povo, o qual o exercerá por meio de seus representantes ou diretamente”, sendo este último o escopo autorizativo da participação popular na administração pública. Assim, a importância da participação popular na gestão pública, como será visto, é inquestionável, principalmente, no cenário brasileiro em que ainda há um forte distanciamento entre o Estado e a sociedade civil, bem como em razão do histórico de submissão do poder político ao poder econômico, sendo, portanto, a gestão democrática importante instrumento de direcionamento da atenção pública para demandas sociais e para o controle social das decisões políticas. Contudo, o sistema de participação social vinculado à política urbana sofreu alterações nos últimos anos que, em um primeiro plano, podem representar retrocessos para gestão da própria política urbana, a qual orienta-se pelo princípio da gestão democrática. Como marcos dessa leitura temos o cancelamento da 6º Conferência Nacional das Cidades em 2017, e a extinção do Ministério das Cidades pelo atual Governo Federal deslocando-o, juntamente com o Conselho Nacional das Cidades, ao Ministério do Desenvolvimento Regional – MDR, ao qual se encontram presentemente subordinados. Diante disso, o presente trabalho analisa o desmonte do sistema de participação social vinculado à Política Urbana Nacional, a partir de uma investigação sobre as mudanças ocorridas no âmbito do Conselho Nacional das Cidades. Para tanto, será brevemente apresentada a correlação entre participação social e política urbana, bem como estudado o histórico normativo do Conselho Nacional das Cidades, para, enfim, verificar se o Conselho foi de fato extinto ou substituído pelo Conselho Nacional do Desenvolvimento Urbano. O procedimento técnico adotado foi a pesquisa bibliográfica e documental, e o método científico utilizado o hipotético-dedutivo, tendo em vista que, a partir do reconhecimento da importância da gestão democrática para política urbana, foi lançada a hipótese de que as alterações promovidas no âmbito do Conselho Nacional das Cidades tiveram o potencial de enfraquecer a gestão democrática da política urbana. 2 DESENVOLVIMENTO Na política urbana, em razão do histórico de desigualdade que permeia a formação das cidades brasileira, tonar-se indispensável a participação social a fim de, como mencionado, compensar a influência do poder econômico sobre o político. As cidades brasileiras são, tradicionalmente, formadas por espaços visivelmente desproporcionais, existindo uma parte da cidade com acesso aos serviços públicos, à infraestrutura urbana e ao mercado formal de terras, e uma outra parte sem esses acessos. Tendo por base essa realidade do espaço urbano, o debate democrático irá auxiliar na inclusão daqueles que estiveram historicamente alijados das discussões sobre o rumo do país, além de dar aos conflitos um tratamento democrático . Os órgãos colegiados relacionados à gestão da política urbana foram previstos no art. 43 do Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257/01 – diploma normativo editado para regulamentar a política urbana constitucional. O Conselho Nacional das Cidades foi criado com base na referida previsão do Estatuto da Cidade de órgãos colegiados de política urbana. Nesse ponto, há que se destacar a importância da existência de um Conselho das Cidades em âmbito nacional, tendo em vista que, em razão da complexidade dos problemas públicos urbanos, os quais são, geralmente, interrelacionados, as políticas públicas na seara urbana demandam uma construção integrada entre os entes federados. Assim, o Conselho em âmbito nacional tem o potencial de promover essa integração interfederativa, a partir da construção de políticas nacionais. Em relação ao Conselho Nacional da Cidades, CONCIDADES, ele foi criado, em conjunto com o Ministério das Cidades, durante o Governo Lula, através da Lei nº 10.683 , que transformou o Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano em Conselho das Cidades, que foi regulamentado através dos decretos 5.031/2004 e 5.790/2006, dando-lhe efetivo caráter participativo. O Conselho possuía natureza deliberativa e consultiva, sendo sua finalidade estudar e propor as diretrizes para a formulação da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, bem como acompanhar e avaliar a execução da política urbana. A criação do Ministério das Cidades representou o preenchimento de um vazio institucional fruto da ausência de uma política nacional de desenvolvimento urbano, representando sua constituição o reconhecimento no âmbito do governo federal de que os problemas urbanos eram questões nacionais, a quais demandavam o enfretamento através de políticas públicas de abrangência nacional . Durante o seu período de funcionamento, o CONCIDADES promoveu 5 conferências nacionais da cidade, mobilizando as esferas estaduais e municipais, tendo em vista que elas eram precedidas da realização de encontros nos estados e municípios, visando a eleição dos representantes para etapa nacional. Em termos de contribuições do CONCIDADES na formulação de políticas públicas urbanas a presente pesquisa identificou substantivos momentos de contribuição do Conselho, como, por exemplo, a campanha de implementação de Planos Diretores Participativos, a qual o Conselho, seguindo a proposta do Ministério das Cidades, definiu estratégias para apoiar a organização de núcleos de capacitação em cada estado do país, articulando, assim, uma rede de parceiros em todo território nacional . Além disso, um exemplo atual da importância dos debates que eram realizados no CONCIDADES, através de suas conferências nacionais, é que a atual Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU), que está em fase de formulação pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, utiliza como referência e contribuição os debates realizados nas referidas conferências, tendo em vista que desde a 2º Conferência Nacional das Cidades já se deliberava sobre a PNDU, o que demonstra a relevância dos debates que eram promovidos pelo Conselho. Assim, o Conselho Nacional das Cidades representou, de fato, uma ampliação dos canais de participação para o debate das políticas públicas urbanas, inovando no cenário político. Ocorre que, apesar da ampla aderência dos poderes públicos e da sociedade civil às Conferências Nacionais organizadas pelo CONCIDADES, no ano de 2017, após o controvertido processo de Impeachment da Presidente Dilma Rousseff, a 6ª Conferência Nacional das Cidades foi cancelada, através do Decreto nº 9.076/2017, editado pelo Presidente Michel Temer . Esse movimento representou o enfraquecimento do CONCIDADES, tendo em vista que a conferência era instrumento fundamental na condução de suas atividades. O cenário de enfraquecimento do Conselho, entretanto, se agrava em 2019 com a eleição de Jair Messias Bolsonaro à Presidência da República, o qual, ainda no primeiro semestre de seu mandato, edita o Decreto nº 9.759/2019 extinguindo todos os órgãos colegiados instituídos por decreto, sob a justificativa de que a medida visava a redução dos custos relacionados à burocracia administrativa. Em diversos textos o Decreto nº 9.759/2019 é apontado como diploma normativo responsável pela extinção do Conselho das Cidades, entretanto, tendo em vista a hierarquia normativa, e tendo por base a própria redação do decreto, ele não teria poderes para extinguir o conselho, tendo em vista que foi instituído por lei, qual seja a Lei nº 10.683/03 . Confirmando essa intepretação, veja-se que o Governo Bolsonaro edita, posteriormente, a Lei nº 13.844/2019, dispondo sobre a organização da Presidência da República, estabelecendo que: 1- o Ministério da Integração Nacional e o Ministério das Cidades seriam transformados no Ministério do Desenvolvimento Regional e 2- o Conselho das Cidades seria transformado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, desfazendo as transformações trazidas pelo Governo Lula. Veja-se que a Lei nº 13.844/2019 utiliza o termo transformação, razão pela qual, ao menos tecnicamente, não é correto afirmar que o Conselho Nacional das Cidades foi extinto, mas sim transformado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano (CNDU). Ocorre que o CNDU não está em funcionamento, apesar de existirem dispositivos normativos que o autorizam . A pesquisa formulou consulta ao MDR acerca do funcionamento do CNDU por meio da plataforma integrada de ouvidoria e acesso à informação do governo federal chamada “FALA BR.”, e obteve como resposta que estaria em fase final a “elaboração da minuta de Decreto para recriação do colegiado”, ou seja, confirmaram que o CNDU não estava em funcionamento. O levantamento desta informação permite concluir, então, que há ausência de interesse político no desenvolvimento do CNDU, e, portanto, a ausência de interesse político na própria gestão democrática da política urbana em âmbito federal. 3. CONCLUSÃO O Conselho Nacional das Cidades foi fundamental para o desenvolvimento de diversas políticas públicas de abrangência nacional, sendo exemplo de sua importância o fato de que, ainda hoje, parte dos debates que orientam o desenvolvimento da atual PNDU são lastreados nas informações provenientes das discussões realizadas nas conferências organizadas pelo CONCIDADES. Diante dessa importância, é notório que a paralisação das atividades do conselho urbano em âmbito federal tem o potencial de repercutir nacionalmente na gestão democrática da política urbana, sendo comprovação disso, conforme levantamento feito ainda em fase de publicação, o fato de que apenas cinco conselhos estaduais das cidades estão, atualmente, em funcionamento. Entretanto, apesar das fissuras, é necessário que se perceba que o sistema de participação ainda existe, afinal, essa ideia nasceu formalmente com a Constituição Federal de 1988, foi angariada pelo Estatuto da Cidade, razão pela qual, por mais que existam pressões políticas para enfraquecê-lo, ele possui meio legais para subsistir. REFERÊNCIAS AVELINO, Daniel Pitangueira de. Cidade e cidadania: considerações sobre a gestão democrática na política urbana brasileira. In: COSTA, Marco Aurélio (org.). O Estatuto da Cidade e a Habitat III: um balanço de quinze anos da política urbana no Brasil e a Nova Agenda Urbana. Brasília: IPEA, 2016. p. 131-157. MARICATO, Ermínia. Metrópole, legislação e desigualdade. Estud. av. [online]. 2003, vol.17, n.48, pp.151-166. MARICATO, Ermínia; JUNIOR, Orlando Alves dos Santos. Construindo a política urbana: participação democrática e o direito à cidade. In: As metrópoles e a questão social brasileira / organizadores, Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro, Orlando Alves dos Santos Junior. Rio de Janeiro: Revan, Fase, 2007. p. 165-195. JUNIOR, Orlando Alves dos Santos; DINIZ, Tânia Maria Ramos de Godoi; JUNIOR, Nelson Saule. A inflexão conservadora e seu impacto na gestão democrática das cidades. In: Dossiê do Desmonte da Política Urbana Federal nos Governos Temer e Bolsonaro e seus Impactos Sobre as Cidades: Violações de Direitos Humanos e os Riscos de Construção de Cidades Intolerantes, Excludentes, Injustas e Antidemocráticas. Rio de Janeiro, 2020, IPPUR/UFRJ. p. 36-41. ROLNIK, Raquel. Democracia no fio da navalha: limites e obstáculos para a implementação de uma reforma urbana no Brasil. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais (ANPUR), v. 11, 2010. pp. 31-50. SANTOS, Mauro. Participação e conselhos de políticas públicas. Reflexões para a retomada do projeto de democracia participativa. In: Caderno de Formação: o Direito à Cidade, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e as Políticas Públicas. Orlando dos Santos; Valéria Pinheiro, Patrícia Ramos Novaes (organizadores). Rio de Janeiro: Fórum Nacional de Reforma Urbana – FNRU; Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico – IBDU; Observatório das Metrópoles, 2021. p. 120-132
Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

DOMINGUES, Eduardo Garcia Ribeiro Lopes; ROCHA, MAYRA PACHECO DA. DESMONTE DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA CIDADE: GOVERNO FEDERAL E O DESMONTE DO CONSELHO DAS CIDADES.. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/482461-DESMONTE-DA-GESTAO-DEMOCRATICA-DA-CIDADE--GOVERNO-FEDERAL-E-O-DESMONTE-DO-CONSELHO-DAS-CIDADES. Acesso em: 08/06/2025

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