O APORTE DO MARKETING URBANO AO DESMONTE DA ORDEM JURÍDICO-URBANÍSTICA: O CASO EUROGARDEN, MARINGÁ (PR)

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

Título do Trabalho
O APORTE DO MARKETING URBANO AO DESMONTE DA ORDEM JURÍDICO-URBANÍSTICA: O CASO EUROGARDEN, MARINGÁ (PR)
Autores
  • Maysa Pinhata Battistam
  • Victória Maria Dantas Rodrigues
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 09 – Função social da propriedade, desmonte da ordem jurídico-urbanística e efetividade dos instrumentos de política urbana
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/476953-o-aporte-do-marketing-urbano-ao-desmonte-da-ordem-juridico-urbanistica--o-caso-eurogarden-maringa-(pr)
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
Marketing urbano, Legislação urbana, Maringá.
Resumo
GT 09 – Função social da propriedade, desmonte da ordem jurídico-urbanística e efetividade dos instrumentos de política urbana O APORTE DO MARKETING URBANO PARA O DESMONTE DA ORDEM JURÍDICO-URBANÍSTICA: O CASO EUROGARDEN, MARINGÁ (PR). Maysa Pinhata Battistam Victória Maria Dantas Rodrigues 1. INTRODUÇÃO A partir de um novo modelo de gestão pública, denominado empreendedorismo urbano, adotaram-se novas táticas urbanísticas para a (re)produção do espaço urbano e respectiva acumulação do capital . O marketing urbano é uma dessas táticas e possui uma função estrutural dentro da lógica empreendedora, dado que é utilizado para estabelecer consensos de massa por meio da divulgação de narrativas ilustradas de projetos urbanos, usufruindo da arquitetura espetacular como artifício . Nesse sentido, o marketing é empregado de modo a estabelecer um imaginário de bem-estar urbano desejável, mesmo vendendo a cidade-mercadoria por meio dos projetos que não serão de livre acesso para a sociedade em geral. Para compreender melhor a relação entre o marketing urbano e o processo de implementação de projetos urbanos pela perspectiva jurídico-urbanística, foi adotada a estratégia de estudo de caso para uma análise qualitativa do processo estabelecido entre a divulgação na mídia e os trâmites jurídicos para que determinado projeto fosse executado. Por isso, a coleta de dados foi assegurada, dentro do recorte temporal de 2010 - 2018, em duas fontes: (i) fontes documentais (jornais, revistas e sites); (ii) registro em arquivos (leis urbanas, processos e contratos). 2. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS O projeto Eurogarden - objeto analisado nas pesquisas que subsidiaram o presente texto - é um empreendimento imobiliário proposto no ano de 2011, implantado em lote privado e lote público adjacente ao primeiro, onde antes operava o Aeroporto Gastão Vidigal, desativado no ano de 2001, e localizado no Município de Maringá, cidade de médio porte do noroeste paranaense. O desenho é de autoria do escritório internacional Archi5, possuindo uma linguagem contemporânea e high-tech, comumente explorada pelos atuais projetos nacionais e internacionais intrínsecos à lógica do empreendedorismo urbano, que buscam a criação de sentimento de “exclusividade” . Vale citar que, a desativação do Aeroporto Gastão Vidigal estava calcada, principalmente, em argumentação a favor do desenvolvimento municipal: o dimensionamento do aeroporto já não estava de acordo com o porte e as futuras pretensões da cidade , culminando na construção de um aeroporto regional. Já a criação de um novo Centro Cívico surge, per se, sobre pretensões de “desafogar o centro da cidade” onde, ainda hoje, encontram-se alguns órgãos políticos/administrativos do município. Apesar de, por vezes, serem narrados como projetos independentes, o Centro Cívico e o Eurogarden fazem parte conceitualmente de um único complexo. Analisando as matérias sobre a possibilidade de implantação de um outro Centro Cívico, percebeu-se que a ideia de novidade e atualidade estava presente no teor da narrativa com a criação da expressão “Novo Centro Cívico”, contrapondo a expressão do “antigo” aeroporto explorada nas matérias. Nesse sentido, nota-se que a criação da narrativa do marketing se constrói não somente a partir da ideia de novidade e inovação, mas também por meio da desqualificação e ideário de arcaico, necessitando de uma solução, neste caso, uma renovação urbana que permite a acumulação do capital . A adoção dessa prática não é inédita em Maringá; um processo similar se deu na região central que antes abrigava a estação e a linha ferroviária da cidade, que, considerada entrave para o desenvolvimento, foi palco de intensa publicidade, assim como o objeto de análise . Essa prática é muito comum em cidades pautadas na lógica empreendedora, onde um grande projeto é “assinado” por nomes conhecidos de alto valor especulativo no mercado, na busca da criação dos consensos a favor das mudanças sociais, econômicas, jurídicas e políticas decorrentes de tais projetos . A análise qualitativa demonstra que a narrativa de marketing nesse período inicial - 2010 - não revela a mudança legislativa que ocorreu no mesmo ano. Houve uma alteração na Lei de Uso e Ocupação do Solo transformando a área privada adjacente ao extinto Aeroporto Gastão Vidigal em Zona Especial 16 (ZE16), sem especificar o tipo de uso e os parâmetros de ocupação para a zona. A partir da divulgação de um Novo Centro Cívico como solução para um espaço “ultrapassado” na cidade e da aprovação da alteração na referida LC 797/2010, a mídia e o mercado imobiliário reafirmaram a região do aeroporto desativado como um eixo de valorização do solo reiterando a especulação imobiliária na gleba pública e na gleba privada. A narrativa do marketing urbano é elaborada por expressões textuais e por imagens que acompanhavam algumas das matérias divulgadas nos jornais e sites, como também utilizadas em recursos audiovisuais. Dado isto, verifica-se que concomitantemente ao uso das imagens da arquitetura espetacular buscaram contribuir uma visão distorcida do papel da legislação urbanística para a cidade. Em algumas reportagens sobre o projeto urbano, a lei e a atuação da Prefeitura Municipal de Maringá são descritos como “obstáculos do projeto ” para a aprovação do mesmo, sugerindo que o Estado poderia “dificultar” a renovação urbana (Figura 1). Compreende-se que essa dificuldade na realidade seria a aplicação de legislação vigente e até mesmo a não alteração da mesma em função do interesse privado. Figura 1 – Matéria jornalística sobre o projeto Eurogarden e uma das alterações jurídicas. Fonte: RAVAGNANI, 2011 Além disso, denomina-se o que deveria ser participação popular como assegurado pelo Estatuto da Cidade (EC) como “aceitação do projeto pela comunidade ”, caracterizando a população não como agentes fiscalizadores e atuantes na construção do espaço urbano, mas colocando-a em um local de passividade. Invariavelmente, a mídia local teve um papel de influência na distorção do princípio de participação democrática e na ampla divulgação do projeto para a sociedade maringaense, reproduzindo, tanto na mídia física como na digital, as imagens de divulgação do empreendimento acompanhadas de textos parciais. Em uma reportagem datada de 2011, por exemplo, o slogan do projeto Eurogarden foi lançado: “O lugar que você gostaria de morar, só não sabia onde ficava” e é a mesma que descreve superficialmente as modificações nas Diretrizes Viárias que foram aprovadas. Não mencionam que o processo de alteração das diretrizes ocorreu para acatar o plano viário estabelecido pela iniciativa privada, não somente na gleba privada, mas que parcela a área pública. Ao aferir cronologicamente as datas de divulgação da matéria jornalística referida e a aprovação da legislação, observou-se que mesmo o texto descrevendo uma necessidade de aprovação da Prefeitura Municipal de Maringá, a mudança jurídica já havia sido aprovada. Além disso, em edição do dia de 13 de maio de 2012, o jornal local O Diário veiculou uma seção especial, dedicada aos 65 anos da cidade de Maringá, e apresentou diversas reportagens sobre o desenvolvimento da cidade, sendo uma delas sobre o objeto de estudo, sob o título “Projeções apontam cidade futurista e ultra moderna", estampada com uma das imagens do empreendimento, e qualificando o projeto Eurogarden como “o novo oásis de investimentos” . No decorrer da análise, se torna evidente que as alterações legislativas descritas nas reportagens acompanhadas com a propaganda do empreendimento não publicaram a perspectiva dos possíveis impactos que estas trariam para o espaço urbano como um todo. Dessa forma, é notório um desmonte da ordem jurídica-urbanística, tanto perante a construção de uma visão distorcida para os cidadãos, quanto para as modificações da legislação em função do interesse privado, visando a lucratividade do empreendimento por meio da renovação urbana. Em 2013, houveram alterações e criação de leis que foram estruturantes na implementação do projeto Eurogarden. Primeiro ocorreu a modificação na Lei da Outorga Onerosa do Direito de Construir permitindo que a contrapartida para obter maior coeficiente de aproveitamento poderia ser, não somente monetária, como por meio da execução de infraestrutura urbana. No caso analisado, foi realizada a infraestrutura da área pública do aeroporto desativado para aumentar o potencial construtivo da área privada adjacente, valorizando o próprio empreendimento, não resultando assim em uma redistribuição da mais-valia da terra na cidade. Posteriormente, ainda em 2013, foi criada a Operação Urbana Consorciada Novo Centro Cívico-Eurogarden (OUCNCCE), uma parceria público-privada para a execução do projeto em ambas as glebas pública e privada. A legislação proposta pelo Poder Executivo e aprovada pelo Legislativo não passou pelo Conselho Municipal de Gestão Territorial, negligenciado o papel democrático do órgão assegurado pelo EC . No mesmo ano, a OUCNCCE foi denunciada ao Ministério Público por diversas incongruências, dentre elas violar o EC e o Plano Diretor do município. Apesar da inflexão jurídica apresentada, em 2014 o loteamento do Eurogarden é aprovado na Prefeitura Municipal de Maringá, conforme é descrito no Decreto 1629 de 2014. O início das obras do sistema viário se deu em 2017, entretanto, no ano seguinte a OUCNCCE foi revogada pela Lei Complementar 1.115/2018, a pedido da própria empresa responsável pelo empreendimento, com o argumento fundamentado na denúncia realizada ao Ministério Público, devido ao modo paradoxal com o qual os instrumentos urbanísticos do EC foram aplicados. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Portanto, assimila-se que o marketing urbano atua de modo a camuflar as distorções na utilização dos instrumentos urbanísticos e das legislações urbanas, posto que estas foram elaboradas para assegurar a redistribuição de mais-valia da terra, a construção de uma cidade democrática e menos desigual. REFERÊNCIAS ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura na era digital-financeira: desenho, canteiro e renda da forma. 2010. 308 f. Tese (Doutorado em Tecnologia da Arquitetura) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. BATTISTAM, Maysa. Ação virtual na cidade real: o marketing urbano e seu impacto na (re)produção do espaço urbano - o caso Eurogarden. 2020. 229f. Dissertação (Mestrado) - Centro de Tecnologia, Programa Associado de Pós-Graduação UEM/UEL em Arquitetura e Urbanismo, Maringá, 2020. COMPANS, Rose. Empreendedorismo urbano: entre o discurso e a prática. 1ª Ed. São Paulo: Editora Unesp, 2005. HARVEY, David. 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Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

BATTISTAM, Maysa Pinhata; RODRIGUES, Victória Maria Dantas. O APORTE DO MARKETING URBANO AO DESMONTE DA ORDEM JURÍDICO-URBANÍSTICA: O CASO EUROGARDEN, MARINGÁ (PR).. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/476953-O-APORTE-DO-MARKETING-URBANO-AO-DESMONTE-DA-ORDEM-JURIDICO-URBANISTICA--O-CASO-EUROGARDEN-MARINGA-(PR). Acesso em: 25/05/2025

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