“PRA QUE AMANHÃ NÃO SEJA SÓ UM ONTEM COM UM NOVO NOME” - UM OLHAR PERFORMATIVO PARA A PRODUÇÃO ARTÍSTICA DO RAPPER EMICIDA

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
“PRA QUE AMANHÃ NÃO SEJA SÓ UM ONTEM COM UM NOVO NOME” - UM OLHAR PERFORMATIVO PARA A PRODUÇÃO ARTÍSTICA DO RAPPER EMICIDA
Autores
  • Joyce Barreto de Sá Abbade
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 08 - Memória, Narrativas e Discursos
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/437872-pra-que-amanha-nao-seja-so-um-ontem-com-um-novo-nome----um-olhar-performativo-para-a-producao-artistica-do-rapp
ISSN
Palavras-Chave
Memória, Emicida, AmarElo, Documentário
Resumo
“PRA QUE AMANHÃ NÃO SEJA SÓ UM ONTEM COM UM NOVO NOME” UM OLHAR PERFORMATIVO PARA A PRODUÇÃO ARTÍSTICA DO RAPPER EMICIDA Joyce Barreto de Sá Abbade Mestranda no Programa de Pós-graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO joyce.abbade@eco.ufrj.br Introdução Neste trabalho pretende-se abordar o tema da memória, privilegiando sua relação com o Pensamento Social Brasileiro, as Relações Étnico Raciais e os estudos sobre Linguagem. Propõe-se, assim, uma breve crítica à narrativa hegemônica que produziu interpretações sociológicas fundantes sobre o Brasil, interpretações essas pautadas numa tradição epistêmica que apresenta “o racismo como um elemento marginal ou subordinado na constituição das estruturas sociais brasileiras” (MOURA, [1988] 2019, p.11), fortalecendo, assim, a reprodução de construções discursivas baseada numa compreensão subalternizada e inferiorizada dos negros, suas práticas e valores. Uma vez que os processos de construção de memória são também afetados por essas interpretações e práticas hegemônicas, produzindo, assim, apagamento histórico e marginalização do povo negro, o objetivo principal desta pesquisa é, a partir do documentário “AmarElo – É tudo pra ontem”, produzido pelo rapper Emicida, refletir que memórias emergem desta produção audiovisual e como essas memórias se relacionam com as narrativas sobre os negros no Brasil. Ao pensarmos a memória para além da reconstrução racional do passado, mas como processo, foco de resistência e instrumento de luta para a transformação social (GONDAR,2016) propomos, ao problematizá-la, um deslocamento de olhar sobre os negros no Brasil e consequentemente sobre suas memórias. 1. Fundamentação teórica A metodologia utilizada será a qualitativa interpretativista (MOITA LOPES,1994) que busca interpretar os diversos significados e sentidos que constituem um fato. De acordo com Moita Lopes (1994) “o que é específico, no mundo social, é o fato de os significados que o caracterizam serem construídos pelo homem, que interpreta e re-interpreta o mundo a sua volta” (1994, p.331) produzindo assim diferentes possíveis realidades. Ao afirmar que a “linguagem possibilita construção do mundo social e é condição para que ele exista” (1994, p.331), podemos entender que o mundo social é construído pela e na linguagem no sentido de que ela aponta caminhos para sua construção e também para sua compreensão. Nos estudos da Memória Social enfatizamos a dimensão política da memória ao utilizarmos a perspectiva apresentada por Jô Gondar (2005;2016), que pensa a memória como construção social e movimento, sempre em fluxo e relacional e a crítica apresentada por Andreas Huyssen (2000) e Michael Pollack (1989), à concepção clássica da memória, pautada no ideal platônico conservador que reforça a ideia de binarismos. Trabalhamos com o conceito de letramento de reexistência de Ana Lúcia Silva Souza (2011) para pensar o rap como agente de transformação. No campo do Pensamento Social Brasileiro, trazemos Abdias Nascimento (1978), Clóvis Moura (1959;1988) e Guerreiro Ramos (1957;1958) como pensadores que propõe uma matriz epistêmica crítica, ao produzirem interpretações sociológicas sobre o Brasil evidenciando o racismo como elemento central para pensar as estruturas sociais brasileiras, pautando assim suas ações na direção da luta pela libertação do povo negro e a favor da igualdade racial. Trazemos bell hooks (2009) para uma reflexão sobre deslocamento e descolonização do olhar e a autora Grada Kilomba (2019) para refletir sobre memórias coloniais. É através da palavra, do discurso e da imagem, que existimos no mundo e produzimos memória. Partimos da perspectiva dos atos de fala performativos propostos por Austin (1962;1990), priorizando, assim, o caráter social da linguagem. Butler, ao revisitar Austin, afirma que nós “produzimos efeitos com a linguagem e fazemos coisas à linguagem, mas a linguagem também é aquilo que fazemos”, indicando que a linguagem “é um nome para o que fazemos”, é “ato”, mas também “suas consequências” ([1997],2021, p. 22), é ação e efeito. Como constructo analítico utilizaremos o conceito de indexicalidade (BLOMMAERT, 2010) para mobilizar sentidos, discursos, valores e ideologias. 2. Resultados alcançados O rap, manifestação urbana que tematiza aspectos sociais, políticos e econômicos do cotidiano da sociedade é compreendido nessa pesquisa como letramento de reexistência, conceito de Ana Lúcia Silva Souza (2011) que aponta o rap como elemento de construção de sentido social. A partir dessa concepção de reexistência atravessada pelos conceitos de indexicalidade (BLOMMAERT, 2010). Esta pesquisa está em andamento, portanto os nossos resultados apresentados aqui são parciais e iniciais. Embasada na perspectiva austiniana de atos de fala performativos podemos pensar que os estereótipos sobre o negro são construções históricas discursivas, repetidas que apontam sentidos de inferioridade e reforçam a naturalização da ideia do negro como inferior. No documentário vemos uma quebra dessa repetição, uma ruptura capaz de propor outros olhares e sentidos. Inicialmente fizemos análise de um trecho do documentário que o rapper, antes de tocar a música Pantera Negra, convida os membros fundadores do MNU a se colocarem em pé fazendo referência a importância da ancestralidade e das memórias negras para nossa existência e sobrevivência. Fala do Emicida (no documentário): “Pra que hoje a gente esteja nesse lugar, que foi negado aos nossos ancestrais, muitas pessoas suaram e sangraram no caminho. Algumas pessoas no auge da ditadura militar tiveram a coragem de se levantar contra o Estado brasileiro e seu racismo assassino e dizer que aquele país precisava reconhecer o protagonismo das pessoas de pele escura na sociedade brasileira. Hoje a gente tem algumas pessoas aqui, que estavam na escadaria do Municipal em 1978 lutando contra o racismo. Pra mim é mágico tá aqui, porque vocês tão aqui, porque é realmente uma conquista histórica a gente ocupar esse lugar, e eu gostaria de pedir pra que eles se levantassem nesse momento: nossos irmãos e irmãs do MNU”. Neste trecho acima selecionado podemos perceber alguns índices que nos apontam para sentidos de força como as palavras: suaram, coragem e levantar. E esses sentidos nos indicam discursos e narrativas de luta que apontam para os negros como pessoas que não estiveram no lugar passivo, mas foram em frente, dedicaram-se a mudar o quadro. Outro índice é a palavra sangraram, que nos indica sentidos de dor e violência que pode ser associado a dor física ou simbólica vivida pelos negros desde o período da escravidão até os dias atuais. A palavra ditadura nos remete a sentidos de clausura, que nos permite fazer um paralelo entre os regimes ditatoriais e escravocratas no sentido da privação da liberdade. Até aqui podemos apontar memórias coloniais de dor, violência e clausura que definem as memórias coloniais. Mas também memórias de luta, bravura e resistência que se deslocam da construção discursiva da submissão e subalternidade, e mobilizam construções discursivas em que negros sejam vistos com um papel ativo, como povo de luta, sujeitos de sua própria história. Conclusões Disputar narrativas é disputar memórias. Narrar possibilidades que nos ofereça vida e não abismo e morte é produzir memórias afirmativas sobre a nossa existência e resistência, é lutar pela desconstrução de mitos que reforcem práticas racistas, buscando, assim, compreender o negro como sujeito de sua própria história. Afirmando a memória como instrumento ativo para questionar o lugar simbólico político da branquitude, problematizar a ordem colonial patriarcal persistente, e perturbar a memória colonial vinculada à uma supremacia branca, propondo que outros rastros de memória ganhem visibilidade. Conforme nos aponta Foucault, o poder não é dado, o poder acontece a partir da disposição de forças. Se você altera essas relações de força é possível alterar as relações de poder. Emicida, com o documentário AmarElo, caminha para possibilitar a produção de memórias descoladas da ideia de colonialidade, ideia que insiste em reproduzir discursos que despotencializam os negros, acreditando que o documentário é uma forma de proporcionar sentidos positivos a imagem dos negros, garantindo assim uma existência humana, digna e potente. Referências bibliográficas AUSTIN, J. L. (1962). Quando dizer é fazer: palavras e ação. Tradução e apresentação de Danilo Marcondes de Souza Filho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. BLOMMAERT, J. The sociolinguistics of Globalization. Cambridge: Cambridge University Press, 2010. GONDAR, J. Cinco proposições sobre memória social. In: DODEBEI, V.; FARIAS, F.R.; GONDAR, J.; (Org.). Por que memória social? Rio de Janeiro: Híbrida/ Programa de Pós-Graduação em Memória Social da UNIRIO, 2016, p. 19-40. hooks, Bell. Olhares negros: raça e representação. São Paulo: Elefante, 2009. HUYSSEN, Andréas. Passados presentes: mídia, política, amnésia HUYSSEN, Andréas. Seduzidos pela memória. RJ: Aeroplano, Universidade Cândido Mendes, Museu de Arte Moderna do Rio, 2000. KILOMBA, Grada. Memórias da Plantação – Episódios de racismo cotidiano – 1ª ed. –Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. MOITA LOPES, L. P. Pesquisa interpretativa em linguística aplicada: a linguagem como condição e solução. Delta, São Paulo, v. 10, n. 2, p. 329-338, 1994. MOURA, Clóvis. Sociologia do negro brasileiro. 2ª edição – São Paulo: Perspectiva, 2019 [1988]. NASCIMENTO, Abdias. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. São Paulo: Perspectivas, 2016. 3ª ed. POLLAK, Michael. Memória, Esquecimento, Silêncio. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 2, n. 3, 1989, p. 3-15. RAMOS, Alberto Guerreiro. A Redução Sociológica. Rio de Janeiro: UFRJ, 1995 [1958]. SOUZA, Ana Lúcia Silva. Letramentos de reexistência: poesia, grafite, música, dança: HIP-HOP - São Paulo: Parábola Editorial, 2011.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

ABBADE, Joyce Barreto de Sá. “PRA QUE AMANHÃ NÃO SEJA SÓ UM ONTEM COM UM NOVO NOME” - UM OLHAR PERFORMATIVO PARA A PRODUÇÃO ARTÍSTICA DO RAPPER EMICIDA.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/437872-PRA-QUE-AMANHA-NAO-SEJA-SO-UM-ONTEM-COM-UM-NOVO-NOME----UM-OLHAR-PERFORMATIVO-PARA-A-PRODUCAO-ARTISTICA-DO-RAPP. Acesso em: 07/06/2025

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