DEFICIÊNCIA, TRABALHO, EXCEÇÃO PANDÊMICA E POLÍTICA: BRASILEIROS ESQUECIDOS

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
DEFICIÊNCIA, TRABALHO, EXCEÇÃO PANDÊMICA E POLÍTICA: BRASILEIROS ESQUECIDOS
Autores
  • RICARDO MASSAO NAKAMURA NASSER
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 24 - "Eu só vou [trabalhar] se o salário aumentar": mas cadê o emprego? Perspectivas e desafios do trabalho no Brasil contemporâneo
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/437808-deficiencia-trabalho-excecao-pandemica-e-politica--brasileiros-esquecidos
ISSN
Palavras-Chave
Deficiência, trabalho, acessibilidade, políticas afirmativas, neoliberalismo, necropolítica
Resumo
Deficiência, trabalho, exceção pandêmica e política: Brasileiros esquecidos Ricardo Massao Nakamura Nasser Advogado e Assessor Jurídico em Direitos Humanos (OAB/RJ nº 235.313). Mestrando em Políticas e Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ). Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ). E-mail: ricardonasser@adv.oabrj.org.br; ricardonasser@ufrj.br Introdução Os elementos “pandemia de COVID-19”, “gestão Jair Bolsonaro” e “avanço da economia de plataformização e da informalidade” introduzem novos desafios à compreensão da estranhada relação entre trabalho e deficiência, estabelecida no seio da sociedade contemporânea, “recém divorciada” dos modelos médicos e reabilitadores que estabeleceram uma persistente compreensão coletiva da diversidade de corpos, mentes e existências baseada nas ideias de capacitismo, dependência, assistencialismo e inabilidade. A inserção da pessoa com deficiência no contexto do trabalho, sob um duplo viés, – necessidade e direito – inaugura uma nova esteira de pensamentos sobre inclusão, acessibilidade, adequação de meios e políticas públicas de facilitação e mediação entre mercado e indivíduo, sendo necessária a adoção, pelo Estado, dos preceitos de universalização e equidade de oportunidades, apresentados pelos modelos sociais de deficiência, que embasam a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015). Por sua vez a conjuntura de excepcionalidade pandêmica, hipervulnerabilização da população PCD, ausência de políticas públicas direcionadas a esse segmento populacional, as omissões do executivo federal no enfrentamento do Novo Coronavírus e a aposta em políticas negacionistas, descoladas dos referenciais científicos e que se desdobram em fatos como recorde dos níveis de desemprego, recessão econômica, explosão da insegurança alimentar (fome e subnutrição), fragmentação e polarização social, morte e sofrimento, apontam que o olhar para os segmentos historicamente subalternizados necessita ser reavivado, como aqui se pretende. 1. Fundamentação Teórica Tendo em vista a transformação nas compreensões sociais sobre a diversidade corporal, cognitiva e existencial, que reformularam o marco epistemológico da compreensão hegemônica sobre deficiências e que resultaram na elaboração, através dos tempos, leia-se, da conjugação e embate entre diversos atores como academia, movimentos sociais organizados, sociedade civil e Estado, dos modelos sociais (BARBOSA-FOHRMANN, 2016) que inspiram o conteúdo da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), importantes ferramentas jurídicas na luta anticapacitista e pela inclusão social desse grupo social, se faz necessário enunciar as reflexões entre a busca pela emancipação, autonomia e independência dessas pessoas (PALACIOS, 2008) e sua posição no engenho capitalista, consubstanciada na forma específica de sua exploração como força de trabalho. Ao passo das transformações do capital, do surgimento de uma economia fortemente estabelecida por meio das Tecnologias da Informação e Comunicação - TIC’s (HARVEY, 2018), baseadas em dados e algorítmos que revelam a criação de uma “mais-valia comportamental”, como nova lógica de acumulação a partir do compartilhamento digital de informações, perfilamentos e classificações (ZUBOFF, 2021), cujos principais reflexos visíveis na atualidade são os processos de plataformização, digitalização e virtualização do trabalho (EGLER, 2013), que aprofundam e atualizam o status de um labor informal, desregulamentado e dessindicalizado – e por isso temerário em termos de proteção dos direitos trabalhistas, do futuro previdenciário e da própria organização socioeconômica, é preciso compreender as afetações específicas à pessoa com deficiência, nessa conjuntura. Nesse sentido, a Lei nº 8.213/1991, única norma brasileira que determina quotas nas vagas de trabalho de preenchimento obrigatório por pessoas com deficiência completa 20 anos num cenário em que pouco pode se comemorar: A referida lei não engloba as micro, pequenas e médias empresas (que se tornaram cada vez mais importantes num cenário de desindustrialização periférica), muito menos o trabalho informal, e o trabalho plataformizado, dirigindo-se apenas à grandes corporações, que a partir de 99 empregados passam a ser alcançadas pela norma. A insuficiência da política trabalhista afirmativa no sentido da pessoa com deficiência e a desoneração legal de grande parte da cadeia econômica na obrigatoriedade de contratação de PCD’s, aliado a um cenário onde a explosão do desemprego e da informalidade detona uma realidade de expansão da pobreza, da mendicância e da fome. 2. Resultados alcançados A constatação da ausência de qualquer política pública em âmbito federal direcionada a essa parcela da população – que segundo o IBGE é estimada entre 11 e 24% dos cidadãos brasileiro – além da inatividade, há quase um semestre, do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência – CONADE, esvaziado pelo Decreto nº 10.177/2019 que altera sua composição, possibilidade de participação da sociedade civil e poderes, traz a tona a hipervulnerabilização da pessoa com deficiência no contexto socioeconômico e democrático. A operacionalização do único programa social de transferência de renda nacional, o Auxílio Emergencial, também pode ser analisada com base em dois aspectos: A negligência e a displicência em relação à população com deficiência, dado que por meio da Caixa Econômica Federal, centralizou-se o processo de inscrição e obtenção do auxílio por meio de um único aplicativo, sem qualquer preocupação com a acessibilidade técnica, instrumental e comunicacional, dimensões de acessibilidade que se referem à adaptação de meios e técnicas para permitir a interação da pessoa com deficiência à determinada tecnologia ou instrumento (SASSAKI, 2006). Além da questão da acessibilidade, fora desconsiderada a exclusão digital e instrumental, agravadas com a recessão econômica pandêmica. Dessa forma, o retrato da desumanização da pessoa com deficiência provocado pela atual gestão federal foi amplamente divulgado pelas mídias sociais. Intermináveis filas e impensáveis aglomerações de desalentados, nas portas de agências da Caixa Econômica Federal, em todo o território nacional, no auge da pandemia, enquanto o país registrava médias diárias de mortes por COVID-19 superiores a 1.000 pessoas... E nessa massa de desesperados, na tentativa de algum atendimento presencial para consecução do benefício, devido a impossibilidade técnica de utilização do aplicativo, de possuir um smartphone ou até mesmo a ausência de conexão com a internet, a situação de milhares de pessoas com deficiência foi escancarada: Ao sol e chuva, pessoas com severas deficiências físicas, intelectuais, múltiplas, cadeirantes, usuários de próteses, pessoas com síndromes genéticas e transtornos de vários espectros submetidas ao abandono, ao desalento, em busca de alguma resposta do Estado e de sua sobrevivência. 3. Conclusões Ao conjunto de omissões e comissões que rebaixaram a população com deficiência em situação de vulnerabilidade socioeconômica à posição de “pedintes”, durante a vigência do período pandêmico devemos atribuir os seguintes sentidos, que serão devidamente desenvolvidos no artigo final: Política de destruição (LESSA, 2020) e Necropolítica (MBEMBE, 2016), Biopoder (FOUCAULT, 1978) e Biopolítica (FOUCAULT, 1979). No que se concerne ao aspecto legislativo da ação afirmativa no âmbito trabalhista para pessoas com deficiência, podemos concluir pela necessária revisão da Lei nº 8.213/1991, de modo a incluir, em seu âmbito de aplicabilidade, maior expressividade percentual do número de empregados com deficiência a serem contratados (hoje, o percentual máximo exigido pela lei é de 5% para empresas com mais de 1.001 empregados). A transformação da referida lei em política nacional também é um caminho adequado, pois permite enfrentar questões como a incidência da ação afirmativa em contratos de trabalho temporários, contratos na administração pública, contratos sem vínculo empregatício, mas com efeito de exploração da força de trabalho e outras situações derivadas da plataformização econômica. A urgente retomada das atividades do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência – CONADE, esvaziado pelo Decreto nº 10.177/2019, também se faz extremamente necessária, afinal, num contexto recessivo, de desagregação socioeconômica, as ações governamentais voltadas à consecução de políticas de emprego e renda para a população PCD deve preceder debate institucional, cooperação entre agentes do mercado e da sociedade civil, com intuito de preservar a legitimidade das decisões e a representatividade do grupo social imbricado. Referências Bibliográficas BARBOSA-FOHRMANN, Ana Paula. Os modelos médico e social da deficiência a partir dos significados de inclusão e exclusão nos discursos de Michel Foucault e Martha Nussbaum. Revista de Estudos Institucionais, v. 2, n. 2. Rio de Janeiro: UFRJ, 2016. EGLER, Tamara. Digitalização do Território (org). Rio de Janeiro: Letra Capital, 2013. FOUCAULT, Michel. Segurança, território, população: Curso dado no Collège de France (1977-1978). São Paulo: Martins Fontes, 2008. FOUCAULT, Michel. Nascimento da biopolítica: Curso dado no Collège de France (1978-1979). São Paulo: Martins Fontes, 2008. HARVEY, David. A Loucura da Razão Econômica. São Paulo: Boitempo, 2018. LESSA, Renato. Homo Bolsonarus. Disponível em http//www.revistaserrote.com.br. Acesso em 10 de outubro de 2021. MBEMBE, Achille. Necropolítica: biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte. São Paulo: n-1 edições, 2018. PALACIOS, Agustina. El modelo social de discapacidad: orígenes, caracterización y plasmación en la Convención Internacional sobre los Derechos de las Personas con Discapacidad. Madrid: Cinca, 2008. SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 7 ed. Rio de Janeiro: WVA, 2006. ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância: a luta por um futuro humano na nova fronteira do poder. São Paulo, Intrínseca, 2021.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

NASSER, RICARDO MASSAO NAKAMURA. DEFICIÊNCIA, TRABALHO, EXCEÇÃO PANDÊMICA E POLÍTICA: BRASILEIROS ESQUECIDOS.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/437808-DEFICIENCIA-TRABALHO-EXCECAO-PANDEMICA-E-POLITICA--BRASILEIROS-ESQUECIDOS. Acesso em: 12/07/2025

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