SISTEMAS DE RECOMENDAÇÃO DA NETFLIX: POR DENTRO DA MÁQUINA

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
SISTEMAS DE RECOMENDAÇÃO DA NETFLIX: POR DENTRO DA MÁQUINA
Autores
  • Marcos José Vieira Curvello
  • Analice de Oliveira Martins
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 32 - Estudos interdisciplinares de televisão
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/437650-sistemas-de-recomendacao-da-netflix--por-dentro-da-maquina
ISSN
Palavras-Chave
Netflix, Video On Demand, Streaming
Resumo
Introdução Serviços de Video on Demand (VoD, na sigla em inglês) começaram a ser testados no início da década de 1990 e colocaram em xeque a lógica programática da TV linear, com suas grades fixas de atrações, ao permitirem ao espectador escolher a que e quando assistir. A oferta de conteúdo por meio de download ou transmissão via streaming (fluxo contínuo de dados gerados e exibidos em tempo real), possibilitou a superação de uma série de restrições características da televisão não só como tecnologia, mas também como meio de comunicação de massa. E, à proporção em que os aparelhos televisores passaram a dividir funções com computadores e dispositivos móveis e a interatividade se impôs como norte das relações mediadas, uma nova forma de consumir vídeo emergiu. Impulsionados pela domesticação do entretenimento audiovisual durante o isolamento social imposto pela pandemia do novo coronavírus, serviços como a Netflix aceleram a troca da relação de compromisso que caracterizou a era da difusão eletromagnética por outra, pautada na conveniência do usuário. No coração de sua operação está um conjunto de algoritmos cujo funcionamento é o segredo industrial que tornou a empresa de mídia a mais valiosa do ramo no mundo. Ao mesmo tempo em que determinam quais programas e em que ordem o usuário verá em sua tela e que atrações serão sugeridas sempre que ele puder ser bombardeado por novidades, os algoritmos operam em um sistema de caixa preta. Os meios que usam para obter informação sobre os assinantes e determinar o que tem mais chance de agradá-los são conhecidos apenas por um grupo de iniciados, formado por engenheiros e executivos de alto nível, e protegidos por bem remuneradas bancas de advogados corporativos. Mas estudiosos do tema fornecem evidências sobre aspectos gerais de seu funcionamento e impactos sobre o próprio comportamento de uma geração conectada. Por meio de pesquisa bibliográfica, esta pesquisa pretende reunir algumas destas pistas, a fim de compreender melhor o funcionamento dos algoritmos da Netflix. 1. Fundamentação teórica Algoritmos são programas de computador capazes de tomar decisões baseadas em regras, sejam elas determinadas em sua programação ou depreendidas a partir de machine learning, que permite a essas aplicações processar informação e produzir, com pouca ou nenhuma intervenção humana, modelos analíticos capazes de originar protocolos particulares de atuação. Em um mundo cada vez mais automatizado, os algoritmos estão em todo lugar: não apenas coordenam a distribuição de publicidade em sites e aplicativos, como determinam quem terá acesso a crédito e a que taxas, onde polícias concentrarão suas patrulhas, auxiliam juízes a decidirem quem tem mais chance de reincidir, e decidem que profissionais devem ser promovidos e quais devem ser demitidos. Zuboff (2021) empreende uma investigação em profundidade a respeito da natureza do contexto socioeconômico e técnico que permitiu a essas ferramentas proliferarem e assumirem aspectos cada vez mais numerosos e importantes da vida cotidiana. No que ela chama de Capitalismo de Vigilância, companhias de tecnologia passam a coletar e processar dados de seus usuários, obtidos a partir de hábitos na Internet, que são usados para formar padrões de comportamento que permitam predizer decisões de consumo futuras. Essa informação é empregada em modelos de negócio desenhados para captar a atenção e o dinheiro de internautas ou comercializada a terceiros que desejem fazê-lo. O'Neil (2020) mostra como os algoritmos podem ser opacos. Ao mesmo tempo em que empresta à operação uma imagem de neutralidade científica, isso garante que seus fundamentos permaneçam inacessíveis aos usuários e elimina qualquer possibilidade de apelação acerca de suas decisões. Adicionalmente, ela exemplifica como esses sistemas podem refletir vieses dos criadores, incorporando visões de mundo excludentes e perpetuando desigualdades e preconceitos social, de gênero e de raça. Pasquale (2015) se aprofunda na natureza secreta das operações de empresas de tecnologia e as caracteriza como caixas pretas. O funcionamento de seus sistemas é envolto em camadas de mistério que permitem a um observador apenas perceber a entrada e a saída de dados, mas não a forma e os critérios pelos quais eles são processados. Também aprofunda o conceito de opacidade e mostra como, ao mesmo tempo em que acumulam uma imensa quantidade de informação, essas empresas evitam prestar esclarecimentos a respeito de suas atividades a autoridades reguladoras. Por fim, Gomez-Uribe e Hunt (2016) proporcionam um raro olhar pela fechadura. Executivos com posição privilegiada na estrutura da Netflix à época da publicação, jogam alguma luz sobre o funcionamento do conjunto de algoritmos de recomendação do serviço de streaming e como eles atuam para reforçar valores da empresa. 2. Resultados alcançados O serviço de streaming da Netflix é movido por um sistema de recomendação de conteúdo que vem sendo aprimorado ao longo dos anos para garantir ao usuário uma experiência personalizada. As sugestões exibidas ao usuário na tela principal da plataforma são agrupadas em faixas, que servem tanto para ajudar o usuário a gerenciar sua experiência de uso, com sessões como “Continuar assistindo” e “Assistir novamente”, quanto para ofertar atrações selecionadas segundo critérios como popularidade e aclamação da crítica ou por semelhança de gêneros e temas com obras já assistidas. Tanto as faixas quanto os títulos que elas contêm são ordenados por um conjunto de algoritmos executados pelo sistema de recomendação de forma automática e independente, mas coordenada, com a finalidade de traçar um perfil do usuário e determinar que conteúdo tem mais chance de atrair sua atenção: “Nosso sistema de recomendação não é um algoritmo, mas uma coleção de diferentes algoritmos atendendo a diferentes casos de uso, que se unem para criar a experiência Netflix completa”. (GOMEZ-URIBE; HUNT, 2015, p. 13:1-13:2) Cada algoritmo tem uma finalidade e eles interagem para oferecer a maior gama possível de conteúdo, utilizando como base o histórico do assinante, mas também fazendo associações a partir de termos consultados. Segundo Gomez-Uribe e Hunt (2016, p. 13.5), “nossos algoritmos de pesquisa combinam dados de exibição, dados de pesquisa e metadados para chegar aos resultados e recomendações que oferecemos.” Trata-se de uma experiência arquitetada para manter o usuário o máximo de tempo possível dentro do ambiente construído pela companhia: “quando um membro inicia uma sessão e nós o ajudamos a encontrar algo atraente dentro de alguns segundos, isso previne que ele abandone o nosso serviço por outra alternativa de entretenimento.” (GOMEZ-URIBE; HUNT, 2015, p. 13:6) Para além dessas linhas gerais, porém, há pouca certeza. Matemáticos, cientistas de dados, cientistas sociais, pesquisadores e ativistas da informação vêm, nos últimos anos, empreendendo um esforço para preencher as lacunas a partir do cruzamento de informações disseminadas de forma controlada pela big techs com evidências distribuídas tanto no discurso de seus executivos quanto em patentes de suas tecnologias, obtidas por meio de engenharia reversa de aplicações, a partir dos fundamentos matemáticos e psicológicos que subsidiam a criação desses serviços ou de suas experiências pessoais na indústria. O interesse desses pesquisadores é atraído, com maior frequência, para empresas como Google, Apple e Amazon, cujas operações impactam em aspectos fundamentais da vida cotidiana e dizem respeito diretamente ao exercício de direitos fundamentais, como privacidade e segurança, e da própria cidadania em uma era fundada na conectividade. Mas seu esforço em compreender como essas companhias subverteram a promessa de emancipação inaugurada pela Internet 2.0 nos possibilita entender a mudança que se operou com a proliferação do método da vigilância entre as empresas de tecnologia e como elas passaram a privilegiar modelos de negócio altamente rentáveis ao perceberem seus usuários como fonte de extração de matéria-prima e descobrirem como instrumentalizar sua capacidade de escolha (PASQUALE, 2015). Aplicações digitais que ofereçam produtos e serviços personalizados se valem de tecnologias de coleta e processamento de informações pessoais para calibrar seus algoritmos às expectativas e gostos dos usuários, e isso inclui a Netflix. Para O’Neill (2020), o que diferencia o potencial danoso dessas operações é se esses dados são usados somente como feedback para aprimorar o modelo feito a partir dos dados obtidos do assinante ou se eles são empregados para interferir em sua liberdade de escolha ou para subsidiar decisões de terceiros. Embora o serviço de streaming não seja comumente associado às práticas mais destrutivas do Capitalismo de Vigilância, é certo que a plataforma surge no — e se beneficia do — ambiente de liberdade operacional defendido simbólica e legalmente pelas grandes corporações de tecnologia para manter desregulado esse mercado do que chamam de superávit comportamental (ZUBOFF, 2021). Conclusões Os algoritmos que compõem o sistema de recomendação de filmes e séries da Netflix só são conhecidos à medida que interessa à empresa. Produtos de uma lógica de vigilância, esses algoritmos permitem não apenas projetarem escolhas de seus usuários, como manipulá-las diretamente. Referências bibliográficas GOMEZ-URIBE, C. A.; HUNT, N. The Netflix recommender system: algorithms, business value and innovation. Nova York: ACM, 2016. Disponível em: https://dl.acm.org/doi/10.1145/2843948. Acesso: 31 jan. 2021. O’NEIL, C. Algoritmos de destruição em massa. Santo André: Editora Rua do Sabão, 2020. PASQUALE, F. The black box society. Cambridge: Harvard University Press, 2015. ZUBOFF. S. A era do capitalismo de vigilância - a luta por um futuro humano na nova fronteira do poder. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2021.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

CURVELLO, Marcos José Vieira; MARTINS, Analice de Oliveira. SISTEMAS DE RECOMENDAÇÃO DA NETFLIX: POR DENTRO DA MÁQUINA.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/437650-SISTEMAS-DE-RECOMENDACAO-DA-NETFLIX--POR-DENTRO-DA-MAQUINA. Acesso em: 10/07/2025

Trabalho

Even3 Publicacoes