DECISÕES JUDICIAIS E A DISPUTA EM TORNO DO DIREITO TERRITORIAL QUILOMBOLA

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
DECISÕES JUDICIAIS E A DISPUTA EM TORNO DO DIREITO TERRITORIAL QUILOMBOLA
Autores
  • Amanda Lacerda Jorge
  • Alessandro André Leme
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 11- Sociologia Política da Constituição
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/436410-decisoes-judiciais-e-a-disputa-em-torno-do-direito-territorial-quilombola
ISSN
Palavras-Chave
Campo jurídico, comunidades quilombolas, território, decisões judiciais
Resumo
Os direitos culturais, vinculados a todos os demais direitos humanos, estão relacionados ao conhecimento tradicional e ao modo de vida próprio das diversas coletividades de acordo com seus valores e cosmovisões (STAVENHAGEN, 1963; DUPRAT, 2007; NETO, 2007). Podemos considerar, portanto, que os direitos culturais não estão isolados de outros direitos, como o direito de acesso ao território, ou ao reconhecimento de uma identidade, pautas fundamentais por exemplo, da bandeira de luta das comunidades quilombolas. Estes grupos anteriormente denominados “comunidades negras rurais” conseguiram a partir da Constituição Federal de 1988 instituir uma agenda política própria de direitos e demandas. Configuração que vai na direção do que Stavenhagen (1963, p. 78) ressalta em seus estudos sobre direitos culturais, quando afirma que “las identidades culturales no son atributos fijos o permanentes de los individuos. Se trata, más bien, de artefactos, de construcciones, de inventos, de discursos, de comportamientos y de mundos simbólicos”. Por outro lado, Stavenhagen (1963, p. 82) ao refletir sobre o direito cultural na América Latina e sobre o arcabouço de demandas que este campo traz, também apresenta em suas reflexões os antagonismos que a questão dos direitos culturais vinculados principalmente à ideia de redistribuição material e reconhecimento étnico-identitário abarcam. Alguns discursos por exemplo, afirmar que: solamente los derechos individuales pueden ser considerados como derechos humanos; que los pueblos no pueden ser sujetos de derechos al margen del Estado; que la propiedad individual de la tierra y los recursos debe prevalecer por encima de los intereses colectivos (...). Em contraponto a essas ideias que acabam por fortalecer a invisibilização de diferentes modos de vida, diversos estudos nos mostram a existência de grupos sociais que carregam em seu dia a dia particularidades próprias, costumes e crenças que precisam ser respeitadas e legitimadas. Estamos nos referindo principalmente à existência de povos e comunidades tradicionais presentes na América Latina, os quais têm um vínculo diferenciado com o espaço onde vivem, tendo como base referências simbólicas e ancestrais de produção e reprodução cultural e material a partir do território (DUPRAT, 2007; NETO, 2007; ALMEIDA,1989). Posto isto, o objetivo deste trabalho é apontar algumas considerações a partir da pesquisa que está sendo desenvolvida através da análise de decisões judiciais que tem como escopo a disputa de comunidades quilombolas ao território. Dessa forma podemos nos perguntar: quais são as principais características destas decisões judiciais presentes no campo jurídico brasileiro? A pesquisa está sendo desenvolvida a partir do mapeamento de acórdãos de inteiro teor proferidos pelo Tribunal Superior de Justiça, Tribunais Federais Regionais e Supremo Tribunal Federal, tendo como recorte temporal os anos entre 1988 e 2020. A discussão proposta neste artigo faz parte da investigação que se encontra em sua fase inicial a partir de material coletado para a pesquisa de doutorado intitulada “Comunidades quilombolas e a disputa por direitos territoriais no judiciário brasileiro: discursos, decisões e interpretações” que está sendo realizada no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal Fluminense (2020-2024). Por outro lado, a aproximação desta autora com temas que têm como objeto o campo jurídico e o reconhecimento territorial e étnico-racial das comunidades quilombolas já vêm ocorrendo há algum tempo, tendo em vista pesquisas e publicações que se referem ao julgamento ocorrido no Supremo Tribunal Federal da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3239/2004, movido contra o decreto nº 4887-2003. A pesquisa tem como recorte temporal decisões judiciais proferidas entre 1988 e 2020. É importante levarmos em consideração estes períodos diante das mudanças dos dispositivos constitucionais ao longo da construção e legitimação do reconhecimento das comunidades quilombolas como sujeitos de direitos. Para a construção de um banco de dados com decisões judiciais que envolviam a questão territorial quilombola no Brasil foram pesquisados acórdãos finais a partir de palavras chaves como quilombolas, quilombo, direito territorial quilombola no site pertencente a cada Tribunal Federal em que é possível localizar um banco de dados de cada processo e decisão judicial sobre titulações e disputas territoriais envolvendo comunidades quilombolas. O que foi possível perceber ao realizar o mapeamento das decisões judiciais que envolvem as comunidades quilombolas e os seus territórios é que existem certas questões que se repetem no campo jurídico brasileiro. Entre estes elementos encontramos a morosidade nos processos de execução da política de titulação previstas desde a CF de 1988, problema enfrentando pela maioria das comunidades quilombolas no Brasil, que tem a sua identidade étnico-racial reconhecida pelo Estado no papel, mas não tem o seu direito territorial efetivado. Reconhecimento, que não podemos esquecer, fruto de mobilizações desde a década de 1980, de grupos antes denominados “comunidades negras rurais”. De acordo com Bourdieu (1996) o discurso jurídico possui características criativas, que fazem existir o que ela enuncia. Ou seja, por meio da competência técnica e social os intérpretes do campo do direito são tomados como locutores legítimos capazes de normatizar, universalizar e racionalizar as relações sociais a partir de uma força específica. E mais, sabendo que o campo jurídico e a sociedade possuem influências simultâneas e recíprocas, é possível considerar que as interpretações e a posição dos agentes e agências do campo do direito são produzidas também a partir de condições econômicas e sociais e a partir das verdades enunciadas por outros campos como o do estado e da ciência, por exemplo. Dessa forma, entendemos que a questão territorial quilombola apesar de, por si só, já constituir um “campo”, é recortada por outros campos que a precedem, que compartilham, produzem ou contradizem afirmações de verdade com pretensão de legitimidade. Estamos neste sentido, frente a luta por reconhecimento e por redistribuição quando trazemos à tona a previsão da regularização dos territórios quilombolas como uma ação de reparação. Tal quadro visa tanto garantir a reprodução material destas comunidades a partir de um direito fundamental que é ter acesso à moradia, assim como dar visibilidade a coletividades que precisam ter o reconhecimento da sua cultura e história frente a sociedade. O que nos mostra que devemos nos afastar de interpretações que relacionam os “quilombolas” unicamente aos problemas agrários ao compreender que a “questão quilombola” faz parte do campo de reconhecimento das diferenças culturais – sendo a luta pelo território uma bandeira importante de auto identificação que precisa ser garantida o quanto antes. Referências: ABRAJI. Direito a terra quilombola em risco (abril de 2021). Disponível em:https://www.achadosepedidos.org.br/uploads/publicacoes/Terra_Quilombola.pdf. Acesso em 05-05-2021. ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. “Terra de preto, terra de santo, terra de índio: uso comum e conflitos”. In: DE GODOI, E.P.; MENEZES, M.A.; MARIN, R.A.(Org.). Diversidade do campesinato: expressões e categorias: estratégias de reprodução social, v. 2. São Paulo: EdUNESP, 1989. BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas: sobre a teoria da ação. São Paulo: Papirus, 1996. ___________, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. DUPRAT, Deborah. 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Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

JORGE, Amanda Lacerda; LEME, Alessandro André. DECISÕES JUDICIAIS E A DISPUTA EM TORNO DO DIREITO TERRITORIAL QUILOMBOLA.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/436410-DECISOES-JUDICIAIS-E-A-DISPUTA-EM-TORNO-DO-DIREITO-TERRITORIAL-QUILOMBOLA. Acesso em: 09/08/2025

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