A PARTICIPAÇÃO NEGRO-FEMININA NA MANIFESTAÇÃO DO CAVALO-MARINHO POR MEIO DE RASTROS MNEMÔNICOS

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
A PARTICIPAÇÃO NEGRO-FEMININA NA MANIFESTAÇÃO DO CAVALO-MARINHO POR MEIO DE RASTROS MNEMÔNICOS
Autores
  • Camylla Herculano De Barros Portela
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 08 - Memória, Narrativas e Discursos
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/435438-a-participacao-negro-feminina-na-manifestacao-do-cavalo-marinho-por-meio-de-rastros-mnemonicos
ISSN
Palavras-Chave
Cavalo-Marinho, Feminino negro, Memória
Resumo
A PARTICIPAÇÃO NEGRO-FEMININA NA MANIFESTAÇÃO DO CAVALO-MARINHO POR MEIO DE RASTROS MNEMÔNICOS Regina Abreu Professora adjunta da UNIRIO abreuregin@gmail.com Camylla Herculano de Barros Portela Doutoranda da UNIRIO camylla.herculano@gmail.com Introdução Pretendemos analisar a participação das mulheres negras no folguedo Cavalo-Marinho, que atualmente se enquadra como bem cultural de forma de expressão, é uma manifestação cultural tradicional que ocorre na parte do Estado de Pernambuco mapeada como Zona da Mata Norte e representa um estrutura multifacetada que conecta teatro, música, dança e poesia à dois extratos básicos da sociedade canavieira: o dos escravizados – atualmente trabalhadores rurais – e dos senhores de engenho – atualmente usineiros e políticos, sendo sua prática um espaço de resistência e de recusa a ordem estabelecida. Histórias representadas que permitem a preservação e redefinição das identidades e memórias, que através da ironia e da brincadeira denotam questões presentes no cotidiano e no imaginário dos trabalhadores canavieiros. O interesse é pensar como o corpo da mulher negra é observado nesse brincante, bem como entender como a manifestação se caracterizou/caracteriza como um processo de reconhecimento da identidade dessas mulheres — que desde o período da cana-de-açúcar lutam por um lugar de fala, mesmo entre seus pares. Desse modo, o Cavalo-Marinho configura-se como espaço legítimo de luta feminina desde os tempos da escravidão. Então, lançamos uma pergunta: como tais mulheres veem resistindo? Como suas memórias são representadas? 1. Fundamentação teórica A fundamentação teórica deste projeto vai buscar respaldo nos conceitos de cultura, memória e corpo, tendo como princípio norteador as noções sobre a performance com pesquisadores como Érika Fischer-Lichte (2011), Inaicyra Falcão dos Santos (2002), que trabalham a questão da ancestralidade e sua representatividade no corpo e na sociedade, perpassando pelo corpo dentro do rito popular do Cavalo-Marinho aprofundando nas reflexões de Maria Acselrad (2002. p. 124-125), que afirma que o corpo não é apenas uma estrutura biológica, mas uma produtora e veiculadora de significados, assim, o corpo é um eixo de relação com o mundo. Buscaremos ainda nos deleitar sobre essa relação corpo como forma de comunicação nos servindo principalmente de dois filósofos Gilles Deleuze e Jacques Derrida. Ainda sobre corpo nos apoiaremos em Maria Augusta Babo (1990, p. 8), que nos afirma que “se o corpo não é linguagem, mas espaço da sua inscrição, ele estará, desde logo, ex-posto às múltiplas inscrições dos vários códigos que nele se vêm alojar”. Serão analisados também os conceitos de sociedade, manifestação cultural e memória coletiva. Neste último, buscaremos embasamento teórico e crítico em Halbwachs que buscava em suas obras uma discussão sobre a consciência social e as experiências. Para Halbwachs o indivíduo que lembra é sempre um indivíduo inserido e habitado por grupos de referência; a memória é sempre construída em grupo apesar de ser um trabalho do sujeito. A importância das lembranças também é um ponto de grande valia, uma vez que para Halbwachs (1990, p.32), o esquecer é perder contato com quem nos rodeava, logo o Cavalo-Marinho consegue, através de sua manifestação, manter viva uma tradição. No contexto do Cavalo-Marinho analisaremos o corpo negro e por meio das idéias de Frantz Fanón (2008) vamos entender a construção psíquica de subalternização do sujeito negro. Fanon mostra em sua obra que o esquema corporal se transmuta em um esquema epidérmico racial, em que sua cor de pele se torna a principal marca do seu estigma, arcabouço de discursos culturais, políticos e históricos. O negro é então reduzido a cor de sua pele, o que leva o autor a pensar sobre um esquema corporal por uma perspectiva histórico-social. Ao trazermos um aprofundamento sobre gênero utilizaremos as idéias da filósofa Judith Butler, que em sua obra Problemas de gênero: feminismo e Subversão da Identidade (2003) desconstrói o conceito de gênero no qual está baseada toda a teoria feminista e reflete sobre as diferenças entre sexualidade e gênero, postulando que não podemos colocar nenhuma dessas concepções num local de sistemas naturais e nem imutáveis, uma vez que a autora busca não separar mente e corpo, pois acredita que esses conceitos são construções sociais e as ideias de Bell Hooks (1995) vem trazer questões sobre feminismo, posições sociais e experiências das mulheres negras. 2. Resultados alcançados Investigar o brincante do Cavalo-Marinho implica estabelecer um recorte de um passado escravocrata que nos faz perceber um local de opressão e exclusão. Esse recorte está presente até hoje no corpo e na narrativa desses artistas, e, por muito tempo, esse foi um lugar onde o negro era atuante, pois, mesmo que por poucas horas, lá eles apresentavam suas expressões com liberdade. Entretanto, para as mulheres, os corpos e as vozes eram silenciados e suas capacidades, inferiorizadas e não reconhecidas. O Cavalo-Marinho possibilita uma ligação com as raízes ancestrais, trazendo à tona memórias e histórias de uma população subjugada. Precisamos compreender a relação desse passado com o que é vivido no presente e sobre as memórias de um grupo que permanecem vivas até os dias atuais. A memória no posicionamento teórico de Pierre Nora (1993) tem a capacidade de costurar um mapa historiográfico o que nos permite pensar sobre recortes de tempo e espaço. As memórias das mulheres, sobretudo negras, no brincante do Cavalo-Marinho, refletem histórias de mulheres relegadas aos homens, ao silêncio. Mulheres que resistem através dos processos mnemônicos — que contribuem não apenas para a permanência das memórias, mas também como construção de saber. Quando pensamos no Cavalo-Marinho nos deparamos com uma narrativa de costumes e rotina vivenciada por homens e mulheres negros, porém o brincante foi ganhando força e se estruturando através apenas das vivências narradas pelos homens, esquecendo o ponto de vista das mulheres que também vivenciavam as condições opressoras. O folguedo representou por muitos anos um estado de segregação das mulheres, pois a predominância masculina existia desde a formação das regras à transmissão das memórias que essa manifestação representava. As mulheres estavam na narrativa representadas por homens vestidos de mulheres que as apresentavam com falas quase que incompreensíveis, ou nos bastidores — tratando da alimentação, costura e cuidando das crianças — mas, até os anos 2000, nunca haviam participado de forma ativa no brincante. Alguns estudiosos, entre eles Rosely Tavares (2013), trazem que a não participação da mulher pode ser um reflexo de uma sociedade que mascara esse sujeito na sociedade local, ou seja, coloca a mulher uma posição de não autonomia nessa troca com o outro— especificamente no brincante —, mas que ela nunca parou de negociar e de tentar uma participação mais ativa no Cavalo-Marinho, isso é possível perceber através das tentativas de formação de grupos com predominância feminina, que se concretizou apenas no ano de 2019 com o grupo Flor de Majerona, idealizado pelas filhas de mestre Salustiano, fundador da Associação de Maracatus de Baque Solto de Pernambuco. Existe, ainda hoje, um grande estigma da participação das mulheres no folguedo — inclusive pela própria comunidade, onde patriarcado e a imagem de superioridade do homem ainda se faz presente. Isso acontece principalmente pela forma como a representatividade desses corpos negros e femininos são retratados na narrativa do Cavalo-Marinho: inferiorizados e erotizados. Pensar sobre a opressão que a mulher negra sofre foi um dos temas trabalhados pela socióloga Patrícia Hill Collins (2015), trazendo-nos a reflexão de que não há necessidade de comparar formas de opressão, todas as opressões, são processos que falam sobre subalternidade, e no Cavalo-Marinho, em específicos, fala-se sobre mulheres negras inferiorizadas e excluídas desde o período canavieiro. Conclusões Concluímos trazendo as contribuições de Maurice Halbawachs— no que toca à memória social — e que nos faz pensar como as memórias tanto dos escravizados quanto das diásporas servem como um construto de memória individual e coletiva para o resgate da mulher que foi inferiorizada. Para o sociólogo (1990), esquecer um período da vida é perder contato com aqueles que então nos rodearam. Assim, quando pensamos no corpo feminino e na noção de sujeito, as contribuições de Judith Butler se fazem presentes para a compreensão de como se dá o conceito do feminismo em sua obra e a percepção sobre o corpo feminino — que sempre foi subalternizado —; isso a partir do desenvolvimento de um diálogo sobre o corpo como um lugar de memória, refletindo assim, sobre o papel do grupo na reelaboração das histórias dessas mulheres. Portanto, concluímos que desde o ano 2000, a inserção da mulher dentro do brincante vem ficando mais ativa como fruto de uma luta diária para essa participação. Uma luta de reconhecimento de suas memórias, histórias e corpos. Mas ainda percebemos um grande percurso para que essas mulheres negras sejam ainda mais ativas através de um reconhecimento de equidade. Referências bibliográficas BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e Subversão da Identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Tradução de Renato Silveira. Salvador: EDUFBA, 2008. HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Tradução de Laurent Léon Schaffter. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais LTDA, 1990. TENDERINI, Helena Maria. Cavalo Marinho na fronteira traçada entre brincadeira e realidade. Dissertação (Mestrado) - Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife. 2003.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

PORTELA, Camylla Herculano De Barros. A PARTICIPAÇÃO NEGRO-FEMININA NA MANIFESTAÇÃO DO CAVALO-MARINHO POR MEIO DE RASTROS MNEMÔNICOS.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/435438-A-PARTICIPACAO-NEGRO-FEMININA-NA-MANIFESTACAO-DO-CAVALO-MARINHO-POR-MEIO-DE-RASTROS-MNEMONICOS. Acesso em: 03/08/2025

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