PROCESSOS EM DISPUTA NO CONFLITO SOCIOAMBIENTAL DA UHE FORMOSO: UM ESTUDO DE CASO

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
PROCESSOS EM DISPUTA NO CONFLITO SOCIOAMBIENTAL DA UHE FORMOSO: UM ESTUDO DE CASO
Autores
  • Mauro Toledo
  • Clara Sena Mata Oliveira- Andrea Maria Narciso Rocha de Paula- Programa PROAP da CAPES
  • Ana Paula Glinfskoi Thé
  • Rômulo Soares Barbosa
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 01 - Conflitos Socioambientais
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/434743-processos-em-disputa-no-conflito-socioambiental-da-uhe-formoso--um-estudo-de-caso
ISSN
Palavras-Chave
Conflito Socioambiental, Rio São Francisco, Licenciamento Ambiental, Povos e Comunidades Tradicionais .
Resumo
Introdução Em 2020, o Governo Federal autorizou a inclusão da Usina Hidrelétrica (UHE) Formoso no Programa de Parceria de Investimento (PPI), liberando R$1,8 bilhão em recursos disponíveis para a instalação do empreendimento. Nesse processo, agentes de Estado atuam como fomentadores da instalação deste mega empreendimento no único trecho do médio Rio São Francisco que não possui barramentos, entre a UHE Sobradinho/BA, e a UHE Três Marias/MG, próximo aos municípios de Buritizeiro/MG e Pirapora/MG, sendo projetada para ter uma área alagada equivalente a 32.425 hectares. Com esse porte, a UHE tem o potencial de causar grandes danos ambientais, culturais e socioeconômicos. Seis municípios serão impactados, incluindo diversas comunidades que dependem do rio São Francisco e seu ecossistema para produzirem seus modos tradicionais, sendo: quilombolas, pescadores artesanais, vazanteiros e povos indígenas. Desde o anúncio do projeto no PPI, os povos e comunidades tradicionais, movimentos sociais, ONG’s e a sociedade civil se mobilizaram para denunciar os impactos do projeto arquitetando uma conjuntura de conflito socioambiental. O objetivo deste artigo consiste em analisar e identificar parte dos processos e mecanismos que se apresentam em disputa e que configuram o conflito ambiental em torno da possível implementação da UHE Formoso. Para isso, contaremos com análises documentais e processuais do licenciamento ambiental e suas legislações, ações populares registradas pelo Coletivo Velho Chico Vivo (CVCV) e revisões bibliográficas. Fundamentação teórica A política econômica neoextrativista se reinventa na lógica de extração de matéria prima com enclaves ao mercado internacional, para isso, acompanha os territórios que possuem riquezas em biodiversidade e recursos naturais. Acosta (2019), denomina tal fenômeno de “paradoxo da abundância”, em que países ricos em recursos naturais, como o Brasil, parecem amaldiçoados pela ação extrativista em seus territórios, gerando pobreza para a população. No entanto, esse paradoxo decorre de opções históricas, relacionadas com a subalternização derivada da colonização e consequente dependência da importação de mercadorias para o norte global. Nesse sentido, inúmeras condições do desenvolvimento podem ser observadas na exploração socioambiental, desde os impactos sobre territórios tradicionais e suas pessoas, até a falsa retórica do crescimento, frequentemente atrelada a desterritorialização de povos e comunidades tradicionais para empresas multinacionais. Ressalta-se ainda, que o neoextrativismo se materializou na América Latina através de subsídio estatal. Muitos governos progressistas se aliaram à evolução financeira, mercantilizando os territórios e a natureza para a constituição de empreendimentos econômicos (GUDYNAS, 2015). No que tange nosso entendimento acerca dos conflitos socioambientais, convencionou-se identificar tais fenômenos sociais quando ocorre a disputa entre os sentidos atribuídos à natureza, seus usos e ocupações realizados diante relações assimétricas de poder. Nesses conflitos, os impactos indesejáveis que comprometem o modo de vida e a reprodução das comunidades através de distintas práticas socioespaciais servem como alavanca para acionar a organização destes mesmos grupos sociais atingidos em oposição à atividade com potenciais destrutivos (ACSELRAD, 2004). Identifica-se tal disputa socioecossistêmica entre sociedades diante o projeto da UHE Formoso. A categoria de povos e comunidades tradicionais (PCT’s) é reconhecida e legitimada pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), que versa sobre sujeitos pertencentes a grupos culturalmente diferenciados a partir do auto-reconhecimento, possuindo uma relação histórica e cultural com o ambiente, denominado de “territórios tradicionais” (BRASIL, 2007). Segundo Costa (2011), essa categoria é formada por vários grupos etnicamente diferenciados, que emergiram de forma jurídica, política e cultural nas mais diversas regiões do Brasil. Superando o processo de invisibilização construído pelo Estado, diversas comunidades passam a se auto-reconhecer a partir dos modos de vida relacionados à ancestralidade e apresentando uma estreita ligação com os ecossistemas em que se inserem. Atrelam assim, suas identidades coletivas ao manejo tradicional da terra, produzindo socialmente o território tradicional. Reconhecido pela legislação brasileira, esses territórios são compostos pelas memórias e conhecimentos que se constroem no processo de transformação tradicional da natureza, caracterizado pelo uso sustentável dos recursos ali existentes. Nesse sentido, a presença dos PCT’s está associada à existência e preservação da biodiversidade local, sem a qual não seria possível a reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica dessas pessoas. 3. Resultados alcançados Em 1985 ocorre uma movimentação pela então estatal, Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG), que entrou com o pedido de licenciamento ambiental para a implementação de uma UHE no trecho do córrego do Formoso, município de Buritizeiro/MG, entretanto, com a lei 10.629/92 do estado de Minas Gerais, de forma inovadora, um trecho do leito do rio São Francisco torna-se Área de Preservação Permanente (APP) devido a vulnerabilidade da fauna aquática, inviabilizando o projeto. Com as recentes alterações e flexibilizações do Governo Federal (2017-2021), o empreendimento foi retomado em 2017, em que a construtora Quebec Engenharia S/A assumiu o pleito do licenciamento ambiental e projeto de construção e instalação. Por outro lado, emerge uma mobilização social de pesquisadores, movimentos sociais, ONG’s, ambientalistas e povos e comunidades que serão impactadas, em processo de luta contra a implementação da UHE. Ademais, a utilização de dados do antigo processo não mais contempla a ação, considera-se então a necessidade de levantamento de dados atuais. Dessa forma, nos deparamos atualmente com o caso da UHE Formoso, em que estudos estão em andamento e movimentos se mobilizam em defesa da vida. Segundo o parecer da Análise Preliminar De Riscos Ambientais (APR), Agência Peixe Vivo (2020), que analisa o processo de licenciamento ambiental da UHE Formoso, são detectados riscos de impactos socioeconômicos, hidrológicos, assim como da fauna e flora. De forma geral, a APR conclui que: “a implantação da UHE Formoso vai afetar diretamente a fauna regional por alterações ambientais, perda de habitat e transformação do ambiente aquático” (pág. 340). No bojo das inconsistências do projeto da UHE Formoso, violação de direitos humanos também são identificados no que se refere à garantia dos direitos de povos e comunidades tradicionais, assegurados por leis federais, estaduais e a convenção internacional 169 da Organização Mundial do Trabalho (OIT). O direito à consulta livre, prévia e informada não tem sido garantido, em um processo de licenciamento que a empresa Quebec não identificou a presença das diversas comunidades tradicionais que serão afetadas. Diante desse cenário, agindo de forma a resistir aos imperativos do Estado e do empreendimento, os movimentos sociais atuam na articulação de organizações e atores sociais para garantirem os direitos das pessoas e territórios que serão atingidos, assim como dar visibilidade aos impactos ambientais. Na esteira dessa mobilização social, o Coletivo Velho Chico Vivo materializa a organização dos esforços e ações em prol da visibilidade da luta dos povos do lugar e assegurar a proteção do Rio São Francisco. Igualmente, os movimentos representam indagações acerca da situação do empreendimento por meio de uma Ação Civil Pública (ACP) movida em abril de 2021, juntamente com ofícios, notas técnicas, palestras, seminários, inquéritos, dentre outras atividades. 5. Conclusões De fato, a retomada do empreendimento somente foi possível por meio das flexibilizações das legislações ambientais que caracterizam uma política econômica desenvolvimentista adotada pelo Estado. Nota-se que por meio desses processos em disputa, a implantação do projeto ultrapassa os limites de conservação ambiental, da valorização de identidades e modos de viver. Ademais, também é notável que a voz da população local, potencialmente atingida, é desconsiderada, a representação democrática parece não considerar os afetamentos das minorias e então movimentos sociais se apresentam como formas de tensão, que lutam fortemente para a garantia de direitos e um mundo mais justo. 4. Referências bibliográficas ACOSTA, Alberto. Extrativismo e neoextrativismo: duas faces da mesma maldição. In DILGER, Gerhard; LANG, Miriam; PEREIRA FILHO, Jorge. Descolonizar o imaginário: debates sobre pós-extrativismo e alternativas ao desenvolvimento. São Paulo: Fundação Rosa Luxemburgo, 2016. ACSELRAD, Henri (org.). Conflitos ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará; Fundação Heinrich Boll, 2004. AGÊNCIA PEIXE VIVO. Agência da Bacia Hidrográfica Peixe Vivo. Pareceres técnicos (fauna, socioeconomia e hidrologia) consolidados na forma de “Análise Preliminar de Riscos Ambientais (APR)” relacionado à leitura e interpretação de documentação relativa ao processo de licenciamento ambiental do empreendimento uhe formoso, projetado para implantação no rio São Francisco, em Minas Gerais, nº 005/2017. Minas Gerais, 2020. Disponível em: <https://cdn.agenciapeixevivo.org.br/media/2020/11/Parecer-_UHEFormoso_REV02_13-11-20.pdf> . Acesso em: 07 de outubro de 2021. BRASIL. Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007. Política Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6040.htm> Acesso em: 5 de out. 2021. COSTA, João Batista de A. A (des) invisibilidade dos povos e das comunidades tradicionais: a produção da identidade, do pertencimento e do modo de vida como estratégia para efetivação de direito coletivo. In: GAWORA, D. IDE, M. H. de S. e BARBOSA, R. S. (org). Povos e comunidades tradicionais no Brasil. Montes Claros: Ed. Unimontes, 2011 ESTEVA, Gustavo. Desenvolvimento. In: SACHS, Wolfgang. Dicionário do Desenvolvimento: guia para o conhecimento como poder. Petrópolis: Editora Vozes, 2000. GUDYNAS, Eduardo. Extractivismos: ecologia, economia y política de um modo de entender el desarrollo y la naturaleza. Bolívia: CEDIB, 2015.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

TOLEDO, Mauro et al.. PROCESSOS EM DISPUTA NO CONFLITO SOCIOAMBIENTAL DA UHE FORMOSO: UM ESTUDO DE CASO.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/434743-PROCESSOS-EM-DISPUTA-NO-CONFLITO-SOCIOAMBIENTAL-DA-UHE-FORMOSO--UM-ESTUDO-DE-CASO. Acesso em: 05/06/2025

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