REFLEXÕES SOBRE O TRABALHO DAS PROSTITUTAS NO BRASIL CONTEMPORÂNEO

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
REFLEXÕES SOBRE O TRABALHO DAS PROSTITUTAS NO BRASIL CONTEMPORÂNEO
Autores
  • Ana Júlia Soares de Campos
  • INGRID BARBOSA BETTY
  • Sandra Francisca Bezerra Gemma
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 22 - Estudos de gênero, feminismos e interdisciplinaridade.
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/432633-reflexoes-sobre-o-trabalho-das-prostitutas-no-brasil-contemporaneo
ISSN
Palavras-Chave
Ergonomia da atividade; trabalho; prostitutas; direitos
Resumo
Introdução Este artigo se propõe a debater, por meio de abordagem interdisciplinar entre as ciências humanas e as ciências do trabalho (notadamente a ergonomia, a psicodinâmica do trabalho e o laboratório de mudança), o contexto e as problemáticas que circundam e determinam o reconhecimento da prostituição feminina enquanto profissão no Brasil. Para isso, em nossa metodologia de investigação lançamos mão de dois instrumento: o primeiro configurado pela revisão extensiva do conteúdo do livro “O ponto zero da revolução: trabalho doméstico, reprodução e luta feminista”, de Silvia Federici (2019) e; o segundo, pela coleta de informações oriundas das reflexões realizadas durante o primeiro semestre de 2021 na disciplina Vulnerabilidade e Proteção Social, cursada no programa de pós-graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas (ICHSA), vinculado à Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA/UNICAMP). Nesta disciplina de 60 horas oferecida em formato virtual estiveram presentes semanalmente estudantes de mestrado e doutorado, discutindo bibliografias, práticas e experiências dos docentes e discentes acerca da temática central da disciplina. Desta forma, após as leituras e debates realizados nos encontros, as informações registradas foram sistematizadas para a elaboração de uma narrativa coerente e lógica, em formato de artigo. Contribuindo assim, para compreensão do trabalho das prostitutas na contemporaneidade brasileira. 1. Pensando o trabalho de forma ampliada Para as teorias marxistas, o trabalho pode ser compreendido como a transformação da natureza pelo homem. Com isso, o ser humano possui a capacidade de objetivar-se, extraindo o que se passa dentro de si, para o mundo externo. Ao mesmo tempo em que se apropria deste contexto, transformando a si mesmo. Dessa forma, o trabalho passa a ser considerado como atividade vital humana, à medida que, através dele, constituímos quem nós somos, nossa identidade e afetos (DEJOURS, 2012). Esta atividade humana vai muito além de apenas receber um determinado provento, em troca da exploração de sua força de trabalho, afinal trabalhar é enfrentar os obstáculos e colocar sua inteligência e experiência para a resolução de problemas que ocorrem incessantemente (WISNER, 1987). No contexto capitalista neoliberal, o trabalho foi sendo organizado em legislações, visando garantir os direitos humanitários dos sujeitos e a proteção social de indivíduos. Entretanto, na atualidade, mesmo havendo um capítulo específico sobre o trabalho feminino na legislação brasileira e frequentes reformas no campo das Leis do Trabalho, as mulheres seguem segregadas “em atividades de baixa qualificação, escolaridade e renda, produzindo dinâmicas semelhantes em termos de precarização e intensificação do trabalho que comprometem, sobretudo, a conciliação entre vida familiar e laboral” (LIMA; BERGSTRÖM; GEMMA, 2020, p. 16). É importante ressaltar também, a quantidade de trabalhos não remunerados que as mulheres desempenham em nossa sociedade, colonialismo e patriarcado (SANTOS, 2020) estes trabalhos são considerados como não trabalho consoante às condições ideológicas que ditam sua realização por meio do ato de cuidar e de amar (MOLINIER, 2013), sempre destinados de maneira natural às mulheres, as quais, sob essa perspectiva absolutamente reducionista, nasceram para reproduzir e se submeter ao trabalho doméstico por uma suposta vocação (READ, 2003). De acordo com Silvia Federici, em sua obra “O ponto zero da revolução: trabalho doméstico, reprodução e luta feminista”, o reconhecimento do trabalho doméstico por meio da imposição de um salário significa lutar pela transformação do poder social das mulheres tendo em vista o papel confinado a elas. Nesse sentido, o sexo para as mulheres não deixa de ser um dever no campo das relações sociais, uma vez que nos é imposto “a ter prazer em dar prazer, em provocar os homens e excitá-los”; o que, por sua vez, subordina a sexualidade feminina às normas vigentes da heterossexualidade, ou seja, tudo o que não é reprodutivo para a moral burguesa é considerado “obsceno, antinatural, pervertido” (FEDERICI, 2019, p. 56-57). Na mesma lógica da luta salarial para o reconhecimento do trabalho doméstico, a luta pela regulamentação da prostituição se faz necessária para o reconhecimento dessas mulheres como sujeito de direitos na sociedade capitalista, tanto pelo viés do trabalho feminino, quanto pela estima social da mulher prostituta. Sendo assim, a fim de impactar o status quo da violência estrutural contra os corpos femininos, principalmente aqueles que estão sob marginalidade e invisibilidade, discutir a prostituição como um trabalho é de extrema relevância na contemporaneidade. Seguindo a literatura da Teoria da Atividade (VIRKKUNEN & NEWNHAM, 2015) conseguimos compreender a prestação de serviços na prostituição, como uma atividade, com suas regras, instrumentos, objetivo, produto, comunidade e divisão de trabalho. Sendo esta inclusive, reconhecida como uma atividade profissional na categoria de “prestador de serviço” pela Classificação Brasileira de Ocupações (CBO nº 5198-05), regulamentada pelo Ministério do Trabalho (MT) . Mas, por outro lado, esta profissão não é contemplada pela Consolidação da Legislação Trabalhista (CLT), com consequências negativas para as mulheres. 2. Reflexões sobre o trabalho na prostituição A ausência de regulamentação da prostituição ao longo da história do Brasil pode ser resultante de uma cultura patriarcal e religiosa que sempre buscou restringir o exercício da mulher como sujeito, tanto na esfera pública quanto privada. Realizando uma análise histórica temos, no final de 1980, um cenário de debates sistemáticos durante o 1º Encontro Nacional de Prostitutas, que resultou na criação da Rede Brasileira de Prostitutas (1987) e na difusão dos grupos organizados de prostitutas pelo Brasil em busca da defesa do exercício da prostituição em “condições dignas, livres da criminalização e da violência (CAMINHAS, 2020). No entanto, a partir dos anos 90, houve a ascensão da corrente abolicionista que refutava de maneira parcial ou total a regulamentação da prostituição, pois entendia-se que se tratava de uma violência contra a mulher. No geral, haviam outras correntes que não possuíam o mesmo posicionamento, porém os argumentos abolicionistas tinham destaque na esfera pública, expondo os principais fatores que levavam as mulheres a se prostituírem, como a pobreza, a carência material, os traumas que causavam sofrimento psicológico (CAMINHAS, 2020). Diante disso, vale mencionar que a pauta legislativa sobre a prostituição no país e no mundo é caracterizada por estas posições antagônicas: os argumentos centrais a favor buscam a regulamentação como meio de inclusão social, com o objetivo de diminuir a marginalização do grupo e promover o reconhecimento social da prostituta e; por outro lado, há correntes que entendem que a regulamentação irá reforçar a indústria da prostituição, fazendo com que as prostitutas se tornem vítimas de cafetões/empresários, pois levam em consideração que a grande maioria das pessoas que buscam a prostituição possuem a intenção de sobreviver à pobreza; como também consideram que a prostituição só existe em face do machismo estrutural. No Brasil, dentre os debates acerca da problemática, o projeto de lei nº 4.211 de 2012, o qual previa a regulamentação da prostituição, foi arquivado em 31 de janeiro de 2019. O projeto de lei tinha como objetivo retirar as profissionais do sexo da ilegalidade e garantir uma aposentadoria especial, já que a proibição legal ou moral não se mostrou eficiente, nos últimos séculos, para evitar a prática. Com isso, nota-se que o reconhecimento da prostituição como um trabalho é de extrema importância para o reconhecimento social dessas pessoas, mas não é única e isolada estratégia para a obtenção de justiça tendo em vista que há a necessidade da promoção de direitos de cidadania e a implementação de políticas públicas que visem a diminuir a violência estrutural. Sem contar que faz-se necessário investigar no âmbito das ciências do trabalho como suas teorias, metodologia e práticas podem contribuir neste debate sobre trabalho de prostitutas. Conclusões Através da metodologia utilizada que propôs reflexões interdisciplinares acerca do tema da prostituição no contexto da vulnerabilidade social, foi possível perceber o quanto o trabalho feminino, em especial, das mulheres cis prostitutas, ainda é precarizado e marginalizado no Brasil contemporâneo. Além disso, fica claro que, formalmente, a troca de serviço por um valor, ainda não é considerada como um labor em nossa sociedade, gerando ainda mais vulnerabilidades à estas profissionais, devido à não garantia de direitos trabalhistas básicos. Compreendendo ainda, que em nosso país o público feminino ainda enfrenta diversas disparidades de gênero, e que somos reconhecidos internacionalmente pelas lacunas ainda existentes em nosso contexto, entendemos que, em muitos casos, o labor da prostituição está conectado diretamente à um modo de sobrevivência social, não sendo uma escolha voluntária de muitas brasileiras. Por isso, a regularização da prostituição demonstra ser uma alternativa razoável para que as prostitutas sejam consideradas sujeitos de direitos. Referências bibliográficas CAMINHAS, Lorena. A REGULAMENTAÇÃO DA PROSTITUIÇÃO É UMA DEMANDA POR JUSTIÇA? Revista Brasileira de Ciências Sociais, [S.I.], v. 35, n. 103, p. 327-345, maio 2020. DEJOURS, Christophe. Trabalho Vivo: Trabalho e emancipação. Vol. 2. Brasília: Paralelo 15, 2012. FEDERICI, Silvia. O ponto zero da revolução: trabalho doméstico, reprodução e luta feminista/ Silvia Federeci; tradução de Coletivo Sycorax – São Paulo. Elefante, 2019. LIMA, Flávia; BERGSTRÖM, Gustavo; GEMMA, Sandra. Reforma trabalhista: contrato intermitente e trabalho feminino. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 3, p. 1-19, 2020. VIRKKUNEN, Jaakko; NEWNHAM, Denise Shelley. O laboratório de mudança: uma ferramenta de desenvolvimento colaborativo para o trabalho e a educação. Tradução de Pedro Vianna Cava – Belo Horizonte: Fabrefactum, 2015.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

CAMPOS, Ana Júlia Soares de; BETTY, INGRID BARBOSA; GEMMA, Sandra Francisca Bezerra. REFLEXÕES SOBRE O TRABALHO DAS PROSTITUTAS NO BRASIL CONTEMPORÂNEO.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/432633-REFLEXOES-SOBRE-O-TRABALHO-DAS-PROSTITUTAS-NO-BRASIL-CONTEMPORANEO. Acesso em: 16/06/2025

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