QUANDO A RAÇA IMPORTA: ESTUDO SOBRE OS RASTROS E VESTÍGIOS DE MEMÓRIA COLONIAL PRESENTES NA NARRATIVA LITERÁRIA DE CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
QUANDO A RAÇA IMPORTA: ESTUDO SOBRE OS RASTROS E VESTÍGIOS DE MEMÓRIA COLONIAL PRESENTES NA NARRATIVA LITERÁRIA DE CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE
Autores
  • Tayene Mendonça Santos
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 08 - Memória, Narrativas e Discursos
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/426771-quando-a-raca-importa--estudo-sobre-os-rastros-e-vestigios-de-memoria-colonial-presentes-na-narrativa-literaria-d
ISSN
Palavras-Chave
Raça, identidade, memória, performances, literatura.
Resumo
Tayene Mendonça Santos (Mestranda do Programa de Pós-graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro) tayene.ms@edu.unirio.br QUANDO A RAÇA IMPORTA: ESTUDO SOBRE OS RASTROS E VESTÍGIOS DE MEMÓRIA COLONIAL PRESENTES NA NARRATIVA LITERÁRIA DE CHIMAMANDA ADICHIE O presente estudo faz parte do meu projeto de mestrado que tem por objetivo analisar de que maneira a narrativa literária em Americanah (2013), romance escrito por Chimamanda Adichie, aborda os conflitos da personagem principal Ifemelu a partir dos rastros e vestígios de memória presentes ao longo da narrativa. Para isto, o projeto pretende examinar de quais recursos a personagem lança mão para construir suas performances identitárias e qual contribuição suas memórias têm para tal construção, além de investigar quais recursos de linguagem presentes na narrativa literária atuam corroborando a imagem que a personagem tem de si mesma. Neste sentido, busca-se mostrar algumas memórias coloniais que comparecem nas performances identitárias de Ifemelu, especificamente, no capítulo 31 do romance. No capítulo em questão, a protagonista – uma mulher negra e nigeriana – relembra uma série de situações vividas por ela e um ex-namorado branco e estadunidense durante o tempo em que mantiveram um relacionamento. Para embasar as análises a serem realizadas, utilizamos os pressupostos teóricos de memórias coloniais propostos por Grada Kilomba (2008) e de linguagem como ação, por Judith Butler (1997). Não obstante, consideramos a definição de raça apresentada por Silvio de Almeida (2020) e a teoria de Achille Mbembe (2016) sobre colonização. 1. Fundamentação teórica Através da literatura, muitos autores têm buscado questionar construções de identidade em torno de categorias como raça e gênero, bem como apresentar outras perspectivas da cultura e da ideia de nação de alguns países africanos. Para melhor compreender de que maneiras tais categorias são discutidas dentro da narrativa literária, faz-se necessário refletir sobre seus conceitos. A raça, ao contrário do que se possa imaginar, nem sempre foi utilizada para caracterizar seres humanos. Conforme nos aponta Silvio Almeida (2020, p. 24), Raça não é um termo fixo, estático. Seu sentido está inevitavelmente atrelado às circunstâncias históricas em que é utilizado. Por trás da raça sempre há contingência, conflito, poder e decisão, de tal sorte que se trata de um conceito relacional e histórico. Ao compreendermos como o conceito de raça foi construído ao longo do tempo é possível entender melhor o que vem, então, a ser o racismo. Grada Kilomba, em seu livro “Memórias da Plantação” ([2008]2019), aponta que o racismo não se trata de fatores biológicos, mas de um ato discursivo. Em outras palavras, ações racistas são produzidas e estabelecidas discursivamente na sociedade. Por meio de narrativas, que são construídas e repetidas ao longo do tempo, ações racistas e discriminatórias são reforçadas. No que tangue a literatura, destaca-se o romance Americanah, escrito em 2013 por Chimamanda Adichie. O livro é narrado em terceira pessoa e composto das memórias da protagonista Ifemelu, uma imigrante nigeriana que se mudou para os EUA para estudar em uma universidade. 2. Resultados alcançados Partindo dos pressupostos propostos por Judith Butler (1997) sobre linguagem como ação, nesta pesquisa busco examinar de quais recursos a personagem lança mão para construir suas performances identitárias e qual contribuição suas memórias têm para tal construção. Não obstante, procuro investigar quais recursos de linguagem presentes na narrativa literária em questão atuam corroborando – ou não – a imagem que a personagem tem de si mesma. Ao observar as estratégias utilizadas pela narradora em Americanah (2013), é possível voltar o olhar para os pressupostos do historiador Achille Mbembe sobre a colonização e seus efeitos. Mbembe aponta que, no contexto colonizatório, há uma perda tripla para o indivíduo: do lar, do direito sobre o próprio corpo e de seu status político. Esta perda, por sua vez, “[...] equivale à dominação absoluta, alienação ao nascer e morte social (expulsão da humanidade de modo geral)” (2016, p. 131). Conforme aponta Grada Kilomba em seu livro “Memórias da plantação” (2008[2019], p. 75), “só se torna ‘diferente’ porque se ‘difere’ de um grupo que tem o poder de se definir como norma – a norma branca. Todas/os aquelas/es que não são brancas/os são construídas/os então como ‘diferentes’”. Em outras palavras, o processo de inclusão ou exclusão de determinada pessoa em algum grupo, quando pensamos no racismo, se dá através de características tidas como referenciais. Estas ações racistas, por sua vez, ocorrem através do discurso que, como afirma Kilomba, funcionam “através de uma cadeia de palavras e imagens que se tornam associativamente equivalentes, mantendo identidades em seu lugar” (2008[2019]:156-157). Se entendemos que a sociedade atua por meio do discurso (ou narrativa), podemos dizer que os conceitos de raça e racismo, discutidos anteriormente, se moldam aos interesses de quem os produz. Em Americanah (2013), há uma cena em que a personagem principal, Ifemelu, vivendo nos Estados Unidos há alguns anos, vai a um jantar com outras pessoas negras e de diferentes nacionalidades. Lá, uma mulher haitiana, em determinado momento, afirma que já namorou homens brancos na América e que raça não era uma questão. Segundo ela, a diferença racial não se fazia presente. Ifemelu, que também já tinha tido um relacionamento com um homem branco americano, retruca tais afirmações, causando desconforto no jantar: ‘O único motivo pelo qual você diz que a raça nunca foi um problema é porque queria que não fosse. Nós todos queríamos que não fosse. Mas isso é uma mentira. Eu sou de um país onde a raça não é um problema; eu não pensava em mim mesma como negra e só me tornei negra quando vim para os Estados Unidos. Quando você é negro nos Estados Unidos e se apaixona por uma pessoa branca, a raça não importa quando vocês estão juntos sem mais ninguém por perto, porque então é só você e seu amor. Mas no minuto em que põe o pé na rua, a raça importa. Mas nós não falamos sobre isso’ (ADICHIE: 2013, p. 315). Segundo a personagem, conflitos em relação à raça não estavam presentes em seu país de origem, a Nigéria, enquanto nos Estados Unidos havia um discurso racista que se materializava através de performances. Ela segue, então, rememorando situações vividas por ela quando namorava Curt que corroborem tal ponto de vista. Curt, um homem jovem, branco e de classe social alta, uma vez a levou para conhecer uma tia dele e esta é uma das lembranças que Ifemelu utiliza em sua narrativa: Mas, certa vez, eles foram visitar a tia de Curt, Claire, em Vermont, uma mulher que tinha uma fazenda de produtos orgânicos, andava descalça e falava sobre o quanto aquilo a fazia sentir-se conectada com a terra. Por acaso Ifemelu tinha tido uma experiência parecida na Nigéria?, perguntara ela, fazendo uma cara de decepção quando Ifemelu respondeu que sua mãe lhe daria um tapa se ela saísse sem sapatos. Durante toda a visita, Claire falou sobre seu safári no Quênia, sobre a elegância de Mandela, sobre sua adoração por Harry Belafonte, e Ifemelu temeu que fosse começar a usar as gírias dos negros americanos ou a falar suaíli’. Depois que eles deixaram sua enorme casa, ela disse: ‘Aposto que ela seria uma mulher interessante se fosse ela mesma. Não preciso que se esforce tanto para me assegurar que gosta de pessoas negras’. E Curt disse que a questão não era a raça, mas o fato de que sua tia tinha uma consciência aguda da diferença, qualquer diferença. ‘Ela teria feito exatamente a mesma coisa se eu tivesse aparecido lá com uma russa loura’. É claro que a tia dele não teria feito a mesma coisa com uma russa loura. Uma russa loura era branca, e a tia não teria sentido a necessidade de provar que gostava de pessoas com a aparência da russa loura. Mas Ifemelu não disse isso a Curt, porque lamentou que não fosse óbvio para ele” (ADICHIE, 2013, p. 247). Neste trecho, podemos observar uma situação que Grada Kilomba chama de “constelação triangular do racismo” (2008[2019], p. 147). A autora nomeia de tal maneira uma situação em que há três pessoas desempenhando funções diferentes na manutenção do racismo: a personagem que performa o racismo, a personagem que sofre a agressão e a terceira, a “plateia branca, que observa a performance”. O silêncio de Curt enquanto as ações aconteciam também diz muito sobre o consenso que existe em sua performance. 3. Conclusões Dentro de tal narrativa, a protagonista evoca memórias que Grada Kilomba (2008[2019]) caracteriza como racismo cotidiano. Faz-se necessário, portanto, continuar desenvolvendo pesquisas que tenham como objeto de estudo analisar a narrativa literária de autores negros e africanos para compreendermos como a raça e o racismo são vistos a partir da ótica de quem sofre seus desdobramentos. Referências bibliográficas ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Americanah. London: Fourth State, 2013. ALMEIDA, Silvio Luiz de. Racismo estrutural. São Paulo, Editora Jandaira, 2020. KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. MBEMBE, A. Necropolítica. Arte & Ensaios, n. 32, 2016, p. 122-151. BUTLER, Judith. Excitable speech. A politics of the performative. Routledge: New York, 1997.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

SANTOS, Tayene Mendonça. QUANDO A RAÇA IMPORTA: ESTUDO SOBRE OS RASTROS E VESTÍGIOS DE MEMÓRIA COLONIAL PRESENTES NA NARRATIVA LITERÁRIA DE CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/426771-QUANDO-A-RACA-IMPORTA--ESTUDO-SOBRE-OS-RASTROS-E-VESTIGIOS-DE-MEMORIA-COLONIAL-PRESENTES-NA-NARRATIVA-LITERARIA-D. Acesso em: 05/06/2025

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