BEIRA RIO, BEIRA VIDA: A LITERATURA DE BEIRA E DE ABISMO DE ASSIS BRASIL

Publicado em 14/03/2022 - ISSN: 2316-266X

Título do Trabalho
BEIRA RIO, BEIRA VIDA: A LITERATURA DE BEIRA E DE ABISMO DE ASSIS BRASIL
Autores
  • Luiz Antonio Ribeiro
Modalidade
Comunicação Oral - Resumo
Área temática
[GT 12] Memória, Narrativas e Discursos
Data de Publicação
14/03/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/viiconinter2018/103407-beira-rio-beira-vida--a-literatura-de-beira-e-de-abismo-de-assis-brasil
ISSN
2316-266X
Palavras-Chave
literatura, memória, limiar
Resumo
A literatura é, também, uma dança. Uma perda de bordas, de fronteiras e limites do texto diante do corpo. A escrita, neste sentido, é uma espécie de preparação para um movimento, um esvaziamento e um transbordamento simultâneos, tal como previu Alain Badiou (2002) em seu Pequeno Manual de Inestética, ao afirmar que há na dança “um corpo de antes do corpo” (BADIOU, 2002, p. 79). A literatura, seguindo esta trilha, seria este corpo “por fora da convenção”, uma espécie de transbordamento de suas próprias fronteiras: ao mesmo tempo, beira e abismo. Este trabalho tem como objetivo analisar o romance “Beira Rio, Beira Vida” do escritor piauiense Assis Brasil, partindo da ideia de que Assis Brasil, a partir de sua escrita e da ideia de beira/margem, engendra uma outra possibilidade de memória e história no interior da literatura brasileira. A obra narra a história de uma família de mulheres que vive à beira do Rio Parnaíba, no Piauí, e que busca sobreviver como prostitutas, junto a marinheiros. A obra propõe pensar estas vidas que se dão, tanto na beira do rio, quanto na beira da vida e são jogadas à margem da sociedade, empurradas para a beira deste rio. Assim, elas se constroem como discursos e como memórias. Além disso, a partir de uma escrita que busca transbordar a si própria, diante dos limites de suas zonas de margem, pode-se pensar a escrita de Brasil através de uma imagem de “entre”, que chamamos de “linguagem de beira” - o que, em certo sentido, pode ser pensado como uma escrita que se circunscreve a partir dos limites do universo que propõe retratar. Partindo deste ponto, nosso objetivo é pensar que, “Beira Rio, Beira Vida” e seus corpos e memórias ali descritos trazem uma potência capaz de compor uma reformulação das instituições de memória, história e literatura, principalmente ao engendrar linhas de fuga ao às formulações que se dão entre o centro e a margem. Raul Antelo (2014), no ensaio “Só Centro: Elipses”, afirma que “o modernismo pensou seu fluxo a partir do centro. Atribuiu-lhe consistência, dinamismo, duração, autonomia. Deu-lhe o nome de rua, cidade, literatura.” (ANTELO, 2014, p. 1). Neste sentido, seria possível pensar que a escrita de Assis Brasil, ao propor a imagem de uma “vida de beira”, busca desfazer esse centro, esse nome, essa cidade e essa literatura e, a partir da vertigem da beira do rio, da margem de um rio cuja borda sempre é transparente, traçar uma espécie de cartografia sobre essas vidas precárias, ou seja, uma sequência de gerações de “corpos abjetos” que seriam passíveis de serem matados, como diria Judith Butler (2015), ao mesmo tempo em que, de certa forma, traça memórias inaparentes como formas de potência e resistências, criações de possíveis e, assim, permite uma leitura da história que se dê pelo seu avesso, ou, como diria Walter Benjamin (1987), a contrapelo. Assim, buscamos pensar a história e a memória como uma espécie de rasgadura na cidade, a partir daquilo que dela sobra, na linha do que propõe Didi-Huberman (2013). Para ele, a proposição desta rasgadura poderia ser expressa de diversas maneiras, partindo da ideia de gesto que deixa de lado um “saber” para perder a “unidade de um mundo fechado para se encontrar na abertura desconfortável de um universo agora flutuante, entregue a todos os ventos dos sentidos.” (DIDI-HUBERMAN, 2013, p. 186). Para ele, seria preciso “rachar ao meio a noção de imagem”, em busca da “figura figurante, a saber, o processo, o caminho, a questão em ato, feita cores, feita volumes: a questão ainda aberta. (DIDI-HUBERMAN, 2013, p. 187). As figuras de Beira Rio, Beira Vida, então, se dariam como memórias de uma “figura figurante”, processos que se constroem e reconstroem, traços de uma escrita, tal como faz a personagem Mundoca, diante de sua boneca: Ao lado estava a caixinha de costura, o novelo de linha, o papel com agulhas – a tesoura enferrujada da avó mal cortava os trapos. Mordia a língua, caprichando, entortava a cabeça, mas acabava rasgando os pedaços de pano. (…) A boneca Ceci esperava de olhos duros o vestido novo – porque em nova forma – se ajeitando nos retalhos furta-cores roubados da avó, da mãe e até mesmo de Mundoca, que não queria saber de brincadeira. (BRASIL, 1965. p. 11) A escrita de beira é esta que se retalha através dos restos e ruínas da história ou, talvez, através daquilo que a história oficial descarta ou não consegue contemplar. Estas figuras na beira, cuja nudez expõe as violências e omissões do Estado e as opressões de classe, gênero e raça, apontam para o que Raul Antelo (2008) chama de “limiares”, cujo conceito de limiar, retomando o conceito de vida de Agamben, seria “a rigor, nem direito nem pena, ele não está nem dentro nem fora da ordem jurídica e constitui, de fato, a soleira, o limiar de indiferença entre o externo e o interno, entre a exclusão e a inclusão.” (ANTELO, p. 11) Buscamos, por fim, partir desta ideia de limiar, ou seja, desta indeterminação entre a exclusão e inclusão, algo que está entre o centro e a margem, para chegar à imagem do abismo, conceito de Nietzsche de vida que seria esta “dançar a beira do abismo”. Da beira ao abismo há uma política e uma potência que se inscrevem no corpo e que Assis Brasil, em certa medida, inscreve na literatura brasileira como marca, como força de resistência. REFERÊNCIAS ANTELO, Raul. Lindes, limites, limiares. Boletim de Pesquisa – NELIC - Edição Especial Lindes, 2008 ANTELO, Raul. Revista de Estudos Latino-Americanos. 2014. Número 1. Ano 1. 2014 BADIOU, Alain. Pequeno Manual de Inestética São Paulo: Estação. Liberdade, 2002 BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política. Tradução de Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1987 BRASIL, Assis. Beira Rio, Beira Vida. Rio de Janeiro: Edições O Cruzeiro. 1965 BUTLER, Judith. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Civilização Brasileira, 2015 DIDI-HUBERMAN, Georges. Diante da Imagem. Tradução Paulo Neves. São Paulo: Editora 34, 2013
Título do Evento
VII Coninter
Cidade do Evento
Rio de Janeiro
Título dos Anais do Evento
Anais VII CONINTER
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

RIBEIRO, Luiz Antonio. BEIRA RIO, BEIRA VIDA: A LITERATURA DE BEIRA E DE ABISMO DE ASSIS BRASIL.. In: Anais VII CONINTER. Anais...Rio de Janeiro(RJ) UNIRIO, 2018. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/VIIConinter2018/103407-BEIRA-RIO-BEIRA-VIDA--A-LITERATURA-DE-BEIRA-E-DE-ABISMO-DE-ASSIS-BRASIL. Acesso em: 02/08/2025

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