A HORTA ORGÂNICA COMO FERRAMENTA DE RESSOCIALIZAÇÃO E PROMOÇÃO DA SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL ENTRE ADOLESCENTES DE UMA UNIDADE SOCIOEDUCATIVA DO DISTRITO FEDERAL

Publicado em 22/03/2023 - ISBN: 978-85-5722-682-1

Título do Trabalho
A HORTA ORGÂNICA COMO FERRAMENTA DE RESSOCIALIZAÇÃO E PROMOÇÃO DA SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL ENTRE ADOLESCENTES DE UMA UNIDADE SOCIOEDUCATIVA DO DISTRITO FEDERAL
Autores
  • Bruna dos Santos Nunes
Modalidade
Resumo expandido - Relato de experiência ou extensão
Área temática
Produção e processamento de alimentos para sistemas alimentares saudáveis
Data de Publicação
22/03/2023
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/venpssan2022/487941-a-horta-organica-como-ferramenta-de-ressocializacao-e-promocao-da-seguranca-alimentar-e-nutricional-entre-adolesc
ISBN
978-85-5722-682-1
Palavras-Chave
segurança alimentar e nutricional, horta, sistema socioeducativo
Resumo
Apresentação/Objetivos: O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) compreende o conjunto de princípios, regras e critérios que envolvem a execução de medidas socioeducativas, incluindo-se nele, por adesão, os sistemas estaduais, distrital e municipais, bem como todos os planos, políticas e programas específicos de atendimento a adolescente em conflito com a lei (BRASIL, 2012). Quando verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente uma série de medidas, entre elas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional (BRASIL, 1990). Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente e a internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias (BRASIL, 1990). A medida socioeducativa de internação consiste em uma medida de meio fechado, na qual haverá restrição de liberdade, podendo ser de execução provisória ou definitiva (BRASIL, 2012). Os estabelecimentos que desenvolvem programas de internação possuem determinadas obrigações, como a observância dos direitos e das garantias de que são titulares os adolescentes atendidos, a preservação da identidade e a promoção de um ambiente de respeito e dignidade, a oferta de itens de vestuário e alimentação suficientes e adequados à faixa etária dos adolescentes, a prestação de serviços de cuidados médicos, odontológicos, psicológicos e farmacêuticos, a manutenção de programas de apoio e acompanhamento dos adolescentes egressos das Instituições, o desenvolvimento de atividades culturais, esportivas e lazer e, também, a garantia de escolarização e profissionalização (BRASIL, 1990). A horta escolar possibilita relacionar a educação ambiental com a educação alimentar e os valores sociais, permitindo a participação dos sujeitos envolvidos no processo, na medida que desenvolve uma sociedade sustentável por meio de atividades educativas. Estas atividades devem reconhecer a educação como elemento de transformação social, ancorada no diálogo e no exercício da cidadania (Oliveira et al., 2018). A horta pode, ainda, tornar-se um instrumento facilitador do trabalho com diversos temas transversais, como meio ambiente, consumo, saúde e trabalho (Froes et al., 2015). Em linhas gerais, é comum que a horta seja vista apenas como um espaço que estimula a oferta de alimentos considerados saudáveis, inviabilizando o contexto histórico, ambiental e econômico em que as sociedades se inserem (Nunes et al., 2020). Contudo, quando se reconhece o conceito de alimentação adequada e saudável dentro do contexto da Segurança Alimentar e Nutricional e do Direito Humano à Alimentação Adequada e Saudável (BRASIL, 2006), sabe-se que estes elementos estão presentes. A horta pode, portanto, ser compreendida enquanto uma ferramenta que permite questionamentos quanto às desigualdades e à conjuntura que as fomenta, sendo possível, dessa forma, a promoção de uma educação ambiental transformadora e capaz de problematizar questões agudas da sociedade neoliberal (Nunes et. al, 2020). Descrição da experiência (local, tempo-ação, equipe-público envolvido, método-ação): Considerando o contexto pandêmico e as medidas sanitárias adotadas para a garantia da segurança e da integridade física e psicológica de todos os servidores e adolescentes acautelados por Unidades do Sistema Socioeducativo, reconhecidas como serviços essenciais ao Estado e, que, portanto, não poderiam ter suas atividades básicas suspensas, as obrigações relacionadas ao desenvolvimento de atividades culturais, esportivas e lazer e à garantia de escolarização e profissionalização, preconizadas pelo ECA, tiveram sua oferta suspensa (BRASIL, 1990). Neste sentido, com vistas a promover atividades que possibilitassem a saída dos adolescentes de seus alojamentos, diferente daquelas saídas já previstas e garantidas em lei, como o “banho de sol”, foram propostos por alguns servidores alguns projetos com atividades relacionadas à profissionalização, esporte, lazer e/ou cultura, dentre eles o Projeto Semear para a Vida. O Projeto Semear para a Vida foi proposto, em junho de 2020, por três servidores e, tendo sido aprovado pela Direção da Unidade, teve suas atividades iniciadas em setembro daquele mesmo ano. Inicialmente, então, foi conduzido por diferentes servidores da Instituição, cada qual representando uma equipe de trabalho; porém, tendo em vista a necessidade da garantia de sua continuidade e efetividade, passou a ser coordenado por uma única servidora da Instituição, que foi deslocada para dedicar-se exclusivamente ao Projeto a partir de março de 2021. Tendo uma natureza educativa e, também, profissionalizante, os objetivos do Projeto consistiam em promover a educação ambiental e a compreensão dos conceitos relacionados ao meio ambiente, sustentabilidade, preservação e conservação; formar cidadãos conscientes da sua função socioambiental, estimulando a consciência para a preservação ambiental e oferecendo oportunidades para a compreensão da interpelação e interdependência dos organismos; desenvolver nos adolescentes conhecimentos e habilidades que estimulem a produção, a comercialização e o consumo de alimentos adequados e saudáveis, bem como o descarte responsável de resíduos; favorecer o contato com a terra e a experiência da semeadura, do cuidado e da colheita; estimular a autonomia, a responsabilidade e a consciência sobre a alimentação saudável e o trabalho coletivo; compreender as diferentes técnicas de manejo do solo e a relação entre água, solo e nutrientes; e, por fim, gerar a compreensão da horta como meio de geração de emprego e renda. Sendo assim, entre o período de setembro de 2020 a outubro de 2021, foram realizados diversos encontros com os adolescentes para realização de oficinas do Projeto Semear para a Vida, conhecida entre os adolescentes como “Oficina de Horta”. Participaram das atividades apenas adolescentes do gênero masculino, tendo em vista que a Unidade trabalhada acautela apenas este gênero, e com faixa etária compreendida entre 13 e 19 anos. Para a realização das atividades, eram selecionados os adolescentes que tinham experiência no trabalho com hortas ou jardinagem ou, ainda, interesse pelo manejo da terra e a produção de alimentos, não possuíam histórico de ocorrências ou faltas disciplinares na Instituição e eram recomendados pela equipe técnica de psicólogos, pedagogos, assistentes sociais ou enfermagem. Estes adolescentes eram organizados em equipes de até três pessoas, para garantia da segurança e da viabilidade do serviço. Todos os equipamentos e as ferramentas utilizadas para as Oficinas foram adquiridos via doação de servidores ou Instituições parceiras ou, ainda, mediante a comercialização de hortaliças, o que garantia recursos para a aquisição de insumos como sementes e adubo e materiais de consumo. Grande parte dos materiais/instrumentos utilizados, como a composteira e a estufa, foram confeccionados pela coordenadora das atividades e os adolescentes. Nos encontros realizados entre os dias 13 e 20 de outubro de 2021, a facilitadora das Oficinas convidou os participantes das atividades a responderem alguns questionamentos. O Diretor da Instituição foi consultado e autorizou que as perguntas fossem realizadas e registradas pela servidora, com vistas a ouvir os adolescentes e compreender os impactos que as atividades poderiam causar em suas vidas. Tendo em vista que grande parte dos adolescentes possui dificuldades relacionadas ao ensino tradicional, tendo a maioria abandonado a escola ou reprovado mais de uma vez os graus escolares, foram elaboradas cinco perguntas, com linguagem simples e clara: 1) Você já possuía alguma experiência no trabalho com hortas?; 2) Você gosta de participar das oficinas do Projeto?; 3) O que participar das oficinas do Projeto significa para você?; 4) Você acredita que os conhecimentos adquiridos nas oficinas têm aplicação prática na sua vida? e 5) Você tem interesse em continuar trabalhando com hortas após o desligamento desta Unidade?. Resultados/discussão: Ao longo desses 13 meses, estima-se que o número de adolescentes que participaram das atividades do Projeto tenha se aproximado de 250, tendo sido realizados diferentes plantios e uma grande diversidade de colheitas. Foram plantados e colhidos os seguintes alimentos: alface crespa, alface americana, repolho, tomate-cereja, cebolinha, coentro, salsinha, manjericão, cenoura, beterraba, rabanete, alho, pimenta, abobrinha, abóbora, melão, melancia, mamão, maracujá, cajá e pitaya, dentre outros. Para a pesquisa realizada, apenas 15 adolescentes participaram. Destaca-se que, destes 15, nenhum deles se recusou a responder. Em relação à experiência no trabalho com hortas, 60% dos adolescentes responderam possuir alguma experiência no manejo com a terra, jardinagem ou plantio de hortaliças, sendo que 15% relataram que esse contato com as hortas havia ocorrido em outros momentos, em Unidades do Sistema Socioeducativo. Aproximadamente metade dos adolescentes responderam que faziam uso de fertilizantes químicos e agrotóxicos, e que não sabiam ser possível realizar o plantio de alimentos sem a sua utilização. Sobre gostar ou não de participar das oficinas do Projeto, todos responderam afirmativamente. Quando questionados sobre o que significava participar da Oficina de Horta, os adolescentes responderam partindo de diversas perspectivas e, portanto, optou-se por manter o registro de suas falas, conforme apresentado a seguir: • “É uma coisa boa pra mim e pros outros jovens que vem, porque além de sair de dentro, aprende a cuidar da Horta” (T., 18 anos) • “É bom, deixa nois mais de boa, fica mais calmo” (D., 18 anos) • “Pega experiência e aprende coisa nova” (L., 17 anos) • “Passa o tempo mais rápido e é bom” (G., 16 anos) • “É melhor que ficar na tranca” (G., 13 anos) • “Aprende mais um pouco, aprende coisas novas, mesmo que eu já mexia com plantação, aqui não usa veneno” (P., 18 anos) • “Desenvolvimento da mente porque quando a gente tá no alojamento nois fica muito tempo pensando e quando não tem o que fazer pensa tanto que acaba entrando em ocorrência e levando medida. Aqui distrai a mente, conversa” (J., 18 anos) • “Pra mim é um passatempo e um aprendizado, é uma coisa boa, tá com a natureza acalma, sente mais solto, feliz” (N., 18 anos) • “Tô cuidando das plantas, fazendo elas crescer e isso é uma boa coisa, ar mais fresco e pode servir pra comer” (D., 16 anos) • “Mais aprendizado na vida, deixa a mente mais tranquila, não pensa no mal, só pensa no bem, até o módulo fica mais tranquilo. Aprendizado que nois não tem na rua e isso aqui que nois faz na rua é uma profissão. Acho tudo legal com planta, mas na rua não tem essa oportunidade que tem aqui, tô internado aqui mas tento tirar uma coisa boa, as oficinas” (G., 16 anos) • “É um ensino pra mim quando eu sair, pra eu ter um jeito melhor de vida, pra mudar de vida” (W., 17 anos) • “Cuidar do meio ambiente, sai da tranca, fica mais tempo fora, aprende coisas na Horta. Penso até em aprofundar nas plantações, fazer curso, essas coisas, como plantar e colher, os tempos” (W., 17 anos) • “Acho bom até pra nossa própria alimentação, mais saudável e orgânica. A agitação diminui no módulo, não quer se envolver com ocorrência” (D., 16 anos) • “Significa que a pessoa vai descobrindo mais experiências sobre Horta e ajuda na mente da pessoa, tipo, a pessoa, como pode se dizer, a pessoa se sente mais livre na Horta. E a pessoa pode levar pra vida, quando sair daqui já pode ser um começo pra trabalhar e ser um rumo de vida e não ir pra vida errada” (K., 17 anos) • “Eu não sabia que eu era bom nas coisas, achava que o que eu fazia era normal. Só agora que eu entendi que eu faço bom, porque as pessoas ficam dizendo que eu levo jeito, mas eu juro que eu não acreditava nisso” (E., 19 anos) Quanto à possível aplicação prática que os conhecimentos adquiridos nas oficinas poderiam ter em suas vidas, todos responderam acreditar que sim, tendo um deles afirmado que “sim, no futuro vai ter, porque um dia a gente colhe o que planta”. Por fim, em relação ao interesse em continuar trabalhando com hortas após o desligamento da Unidade, aproximadamente 75% responderam que sim, sendo que alguns dos que responderam negativamente, informaram que os motivos da negativa estavam na falta de espaço em suas casas, na ausência de oportunidades fora da Instituição ou na incerteza sobre aconteceria daquele momento em diante. Conclusão/considerações finais: Considerando a motivação de oportunizar atividades que possibilitassem a saída dos adolescentes de seus alojamentos e, ainda, a participação dos socioeducandos em atividades relacionadas à profissionalização, lazer e/ou cultura, o Projeto Semear para a Vida cumpriu com a sua proposta. Os adolescentes, em geral, apresentavam-se bastante interessados em participar e motivados a aprender, sendo sempre orientados a manter o respeito mútuo, o diálogo e uma conversa saudável entre si enquanto realizavam o manejo da terra, o plantio ou a colheita. Sobre as dificuldades vivenciadas, destacam-se o pouco apoio institucional e a falta de recursos financeiros para a melhor viabilização das atividades, tendo o projeto contado basicamente com o engajamento dos servidores envolvidos. Referências bibliográficas: BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. BRASIL. Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN). Lei n. 11.346, de 15 de setembro de 2006. BRASIL. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Lei n. 12.594, de 18 de janeiro de 2012. FROES, E. H.; PEZENTI, M.; KRUG, A. L.; MILANO, M. Z.; PEDROZA, F. A. Hortas escolares: uma proposta de integração da horta às disciplinas do ensino fundamental nas escolas do Alto Vale do Itajaí. In: Mostra Nacional de Iniciação Científica e Tecnologia Interdisciplinar. Santa Rosa do Sul: Campus IFC. 2015 NUNES, L. R.; ROTATORI, C.; COSENZA, A. A horta escolar como caminho para a agroecologia escolar. Revista Sergipana de Educação Ambiental, Sergipe, V. 9, No1, 2020. OLIVEIRA, F. R.; PEREIRA, E. R.; PEREIRA JÚNIOR, A. Horta escolar, educação ambiental e a interdisciplinaridade. Revista Brasileira de Educação Ambiental, São Paulo, V. 13, No2:10-31, 2018.
Título do Evento
V Encontro Nacional de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional
Título dos Anais do Evento
Anais do V Encontro Nacional de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

NUNES, Bruna dos Santos. A HORTA ORGÂNICA COMO FERRAMENTA DE RESSOCIALIZAÇÃO E PROMOÇÃO DA SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL ENTRE ADOLESCENTES DE UMA UNIDADE SOCIOEDUCATIVA DO DISTRITO FEDERAL.. In: Anais do V Encontro Nacional de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. Anais...Salvador(BA) UFBA, 2022. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/VEnpssan2022/487941-A-HORTA-ORGANICA-COMO-FERRAMENTA-DE-RESSOCIALIZACAO-E-PROMOCAO-DA-SEGURANCA-ALIMENTAR-E-NUTRICIONAL-ENTRE-ADOLESC. Acesso em: 21/05/2025

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