APRENDER A SISTEMATIZAR UMA EXPERIÊNCIA: A ARTE METODOLÓGICA PRÓPRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR, CAPAZ DE RESGATAR E PRODUZIR MEMÓRIA, INTELIGÊNCIA, AUTONOMIA E ORGANICIDADE.

Publicado em 10/03/2025 - ISBN: 978-65-272-1241-6

Título do Trabalho
APRENDER A SISTEMATIZAR UMA EXPERIÊNCIA: A ARTE METODOLÓGICA PRÓPRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR, CAPAZ DE RESGATAR E PRODUZIR MEMÓRIA, INTELIGÊNCIA, AUTONOMIA E ORGANICIDADE.
Autores
  • Carla de Paula Silva Campos
  • EUGENIA DE PAULA BENICIO CORDEIRO
Modalidade
Minicurso
Área temática
Educação, políticas públicas e justiça social na América Latina
Data de Publicação
10/03/2025
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/pensar-e-repensar/881421-aprender-a-sistematizar-uma-experiencia--a-arte-metodologica-propria-da-educacao-popular-capaz-de-resgatar-e-pro
ISBN
978-65-272-1241-6
Palavras-Chave
sistematização de experiências, educação popular, trabalho social, transformação social, oscar jara holliday, metodologia científica, pesquisa participativa
Resumo
1. Proposta, justificativa e objetivos do mini-curso: relação com o eixo temático e tema do encontro Propomos um mini-curso sobre o método “Sistematização de Experiências” forjado no bojo dos movimentos sociais latino-americanos e apropriado para atuar como interessante metodologia de pesquisa científica. Contemplando o eixo temático Educação, políticas públicas e justiça social na América Latina, entendemos que esta proposta visa apresentar ao público sobre um valioso método simples e poderoso, capaz de resgatar sabedorias marginalizadas, produzir conhecimento autônomo, incorporado e orgânico próprio aos protagonistas das agrupações coletivas de base popular, às instituições dedicadas ao trabalho social, ou mesmo contribuir nas empreitadas de pesquisa participativa alinhadas com a geração de conhecimento para a transformação social. Pretendemos apresentar as bases políticas do método e ensinar sobre sua execução detalhada. Entendemos que a Sistematização de Experiências atua como “justiceira” do conhecimento, valorizando o processo de pesquisa de caráter participativo como um sistema não só de investigação, mas como uma agente de educação orientado para a transformação social. Acreditamos, inclusive, que movimentos de práxis científica como esse são colaboradores na construção de políticas públicas mais qualitativas, na educação, para o desenvolvimento humano justo e igualitário. Para pensar e repensar a América Latina, pretendemos contribuir, resgatando determinados “patrimônios conceituais” nascidos e construídos no nosso território que carregam em si a filosofia da transformação social anticolonial e anti-imperialista. “A sistematização é uma forma de investigação que tenta romper essas dicotomias sobre as quais foi construído o conhecimento no Ocidente: natureza – cultura, público – privado, razão – emoção, conhecimento científico – saber local – saber popular, conhecimento natural – conhecimento social, conhecimento especializado – conhecimento leigo, trabalho manual – trabalho intelectual, e o pilar sobre o qual se construiu esse projeto da separação sujeito – objeto, o pensar esses aspectos como separados, hierarquizados e irreconciliáveis, onde a produção do conhecimento científico corresponde a uns indivíduos denominados pesquisadores pela posse de um método e uma legitimidade institucional.” (NOEL AGUIRRE apud MEJÍA, 2012, p. 16) 2. Breve explicação sobre a Sistematização de Experiências: relação com o eixo temático e tema do encontro A Sistematização de Experiências é uma metodologia formatada por Oscar Jara Holliday (2018), importante educador e pesquisador nascido no Peru e radicado na Costa Rica, obtida num exercício constante, de décadas, junto a movimentos sociais e redes de Educação Popular na América Latina. Trata-se de um procedimento orientado para o passado de um coletivo que, ao delimitar uma experiência, pode resgatar sua dinâmica de funcionamento, interpretar as forças visíveis e invisíveis que atuaram no percurso, ordenando e sistematizando a experiência. É uma maneira inteligente de se fazer uma interpretação crítica do vivido. A Sistematização de Experiências escapa ao movimento habitual de avaliação e tenta recuperar processos que, de certa forma, ficaram ocultos, mas serviram como marcha das atividades. Ou mesmo conhecer fatores que suspenderam os intuitos do coletivo, entendendo lógicas importantes do andamento que não foram apreendidas. O processo de sistematizar a experiência prioriza resultados que terão uma forte carga de autoria coletiva, uma vez que recomenda instrumentos e procedimentos para recuperar conhecimentos orgânicos a um coletivo, priorizando os sentidos das ações dados pelas atrizes a atores protagonistas do processo vivido. Suas visões, motivações, sentimentos, objetivos e alianças são componentes a serem evidenciados de uma experiência do passado, produzindo uma reflexão crítica e autocrítica sobre as ações de um grupo. É importante dizer que Sistematizar a Experiência não é catalogar informações, nem promover uma reflexão pura. É uma estratégia para buscar o “processo” de um grupo, mais do que o seu “projeto”. “[...] desde o primeiro momento em que um projeto começa a ser executado, surge um componente sem precedentes: um processo. Isso dependerá principalmente de como, em última instância, as diferentes pessoas envolvidas na execução do projeto se interpretam, sentem, agem e se relacionam. O processo surge, então, como o componente vital do projeto e, certamente, surgirão em seu percurso elementos inesperados que não poderiam ser previstos ou planejados anteriormente.” (JARA HOLLIDAY, 2018, p. 126, tradução nossa) Segundo Jara Holliday, oito correntes teórico-práticas serviram como base para o surgimento da Sistematização de Experiênciass, são elas: Trabalho social reconceituado, Educação de adultos, Educação popular, Comunicação popular, Teatro do Oprimido, Teologia da Libertação, Teoria da dependência, Pesquisa-ação participativa. E é importante lembrar também que marcantes eventos históricos latino-americanos atuaram como impulsionadores dessas bases, tendo gerado grandes rompimentos com a lógica colonial de produção de conhecimento predominante até os anos 50 na América Latina. Jara Holliday (2018) cita, portanto, a Revolução Cubana (anos 60), o Governo da Unidade Popular de Chile (Salvador Allende,1970/1973) e a Revolução Sandinista (Nicarágua, entre 1979 e 1990) que atuaram como promotores de importantes revoluções culturais, contaminando toda a América Latina com novos paradigmas conceituais. Algumas perspectivas que servem como base para a Sistematização de Experiências vêm principalmente do campo do Trabalho Social e podem ser resumidas nas seguintes afirmações: a. A referência à particularidade do contexto latino-americano e, portanto, à influência das perspectivas de transformação sociais que se tornam predominantes no contexto teórico daquele período. b. A negação de uma metodologia neutra, que era o que mantinham correntes norte-americanas dominantes no período anterior. c. A centralidade da prática cotidiana e do trabalho de campo profissional como fonte de onhecimento. d. A necessidade de superar a dicotomia entre formação teórica e aprendizagem prática. e. O interesse em construir pensamento e ação sustentados e orientados com rigor científico. (Jara Holliday, 2018, p. 37, tradução nossa) As principais diferenças entre avaliar, sistematizar a experiência e pesquisar podem ser descritas da seguinte forma: na primeira, nosso objetivo é valorar a experiência; na segunda, nosso objetivo é identificar a dinâmica dos processos; na terceira, nosso objetivo é confrontar a experiência com teorizações. Nesse sentido, o método de sistematizar pode ser uma valiosa metodologia de pesquisa para se extrair aspectos preciosos de uma experiência e colocá-los em foco para análise e diálogo com o campo teórico. Para se produzir conhecimento na América Latina, vemos a Sistematização como um empreendimento nascido na Educação Popular com um potencial científico robusto, valorizando o conhecimento latino-americano inspirado nas diversas experiências que foram empreendidas no nosso território. Como diz Streck (2018): “Nos últimos anos, percebe-se um renovado interesse em pesquisas que, de modo geral, podem ser agrupadas sob o guarda-chuva da pesquisa-ação e da pesquisa participante (STRECK, 2014). Enquanto na Europa se trabalha com conceitos como pesquisa colaborativa ou interativa, na América Latina verifica-se um intenso movimento de práticas de Sistematização de Experiênciass, uma metodologia que se situa entre avaliação, pesquisa e formação e é amplamente difundida em meios não acadêmicos (JARA H., 2012). O que essas metodologias têm em comum é o pressuposto de que a produção de conhecimento pode ser desenvolvida de forma dialógica entre sujeitos que se propõem a compreender e transformar o seu mundo. A relação entre conhecer e transformar não é de causa e efeito, no sentido de que se conhece parar transformar, mas se conhece ao transformar e se transforma ao conhecer.” (STRECK et al, 2018, p. 119) A Sistematização tem como proposta de execução uma sequência detalhada por Jara Holliday (2018) em cinco tempos: - A experiência: Ter participado da experiência e ter registros das experiências - Formular um plano de sistematização: Objetivo, objeto, eixo, fontes, procedimento e prazo - A recuperação do processo vivido: Reconstruir, ordenar e classificar a informação - As reflexões de fundo: Processos de análise, síntese e inter-relações; interpretação crítica; identificação de aprendizagens - Os pontos de chegada: Formular conclusões, recomendações e propostas; estratégia para comunicar aprendizados e projeções (JARA HOLLIDAY, 2018, p. 135 - tradução nossa) O eixo de uma Sistematização é a alma do processo, trata-se do aspecto sobre o qual se quer explorar a experiência delimitada do passado, ou seja, que tema vai motivar a busca das informações. O eixo tem relação com o aprendizado que se quer formular com a Sistematização. E esse objetivo deve ser de interesse do coletivo. A execução do método deve ser liderada preferencialmente por uma pessoa ou um grupo membro do coletivo, mas as decisões sobre cada etapa devem ser revisadas pelo coletivo e, principalmente, a produção de conteúdo e conclusões sobre a o processo vivido deve ter, sem dúvida, o protagonismo das pessoas envolvidas com a experiência do passado. O objetivo de Sistematizar deve servir ao coletivo, deve contribuir com seu amadurecimento e produzir autonomia. Vê-se que o processo de Sistematizar é, em si, um processo educador. Jara Holliday (2018) nos lembra que: “Podemos reafirmar e fundamentar com maiores argumentos os sentidos com os quais estamos realizando determinados processos. Podemos encontrar coletivamente os laços de nossas forças para reforçá-los e os fios de nossas fraquezas para superá-los, assim podemos caminhar com maior força e maior clareza.” (JARA HOLLIDAY, 2018, p. 65 - tradução nossa) Para além de um resgate de elementos de uma experiência e construção de aprendizados, a Sistematização tem o poder de provocar mudanças numa coletividade, de produzir identidade, autonomia e novos funcionamentos internos, pois irá evidenciar elementos e sentidos que permaneciam ocultos ou na periferia de uma coletividade. Jara Holliday enfatiza: “Temos que concluir que a Sistematização de Experiênciass nunca pode ser concebida como um empreendimento diante do qual possamos nos colocar a partir de uma posição de neutralidade. Trata-se de produção de conhecimento, mas de um conhecimento historicamente situado, portanto carregado de todas as contradições em que está imersa a experiência e situado também, para quem a realiza, como desafio ativo para ser protagonista de uma história a construir. Nesse sentido, a sistematização está intimamente ligada às relações de poder nas quais a experiência é debatida e, na medida em que for um esforço de apropriação crítica, proposital e transformadora, a sistematização contribuirá para a construção de novas relações de poder. (Jara Holliday, 2018, p. 64 - tradução nossa) Portanto, quando falamos de “Educação, Políticas Públicas e Justiça Social na América Latina”, o eixo ao qual pretendemos nos alinhar no Simpósio, entendemos que a Sistematização de um poder disruptivo de produção de conhecimento, capaz de revelar tensionamentos e contradições, promover novas relações de poder e produzir novas perspectivas de ação no campo da educação. A própria Sistematização é um agente educador e transformador. E, enquanto possível metodologia parte de uma pesquisa, a Sistematização de Experiências funciona como uma arte capaz de irromper com a formulação de conhecimento de herança positivista, marcado pelo norte global, pois abre espaço para que conhecimentos genuínos dos participantes da experiência possam ser postos em evidência e aprimorados. Com esse método, podemos penetrar na dinâmica implícita do percurso das ações, aquele conhecimento que escapa aos moldes racionais e racionalizantes de produção de conteúdo. Como exemplo de espaços onde uma Sistematização faria um excelente trabalho, podemos pensar em coletivos onde as pessoas protagonistas da experiência têm pouca aproximação com o universo letrado. Ou, mesmo nos universos letrados, a Sistematização é digna de penetrar no campo material das ações, nos diferentes aspectos contextuais da experiência, dando voz às diferentes pessoas e hierarquias e produzindo, assim, informações que revelam o componente vital de um projeto. Nesse caso, as diversas modalidades de forças atuantes de uma experiência ganham importância e temos aí, então, um empreendimento capaz de promover um conhecimento alinhado com perspectivas mais justas de relações coletivas. 3. Metodologia do mini-curso: 1º dia: - Exposição dialogada através de slides sobre a origem do método Sistematização de Experiências e sobre princípios para execução. - Exposição de vídeo sobre o método Sistematização de Experiências. - Exposição dialogada através de slides sobre etapas práticas para execução do método Sistematização de Experiências. - Leitura de textos distribuídos em sub-grupos sobre os objetivos próprios de uma Sistematização de Experiências. Debate em cada sub-grupo sobre experiências que podem ser sistematizadas. 2º dia: - Continuação do último exercício em cada sub-grupo: debate sobre o que torna a Sistematização especial para um trabalho científico. Apresentação para o grupo. - Criação de instrumentos em sub-grupos a partir dos seguintes nomes: ficha de recuperação de aprendizagem, linha do tempo, matriz de ordenamento e reconstrução, mapa da descontinuidade. Apresentação dos instrumentos criados ao grupo. Em seguida, a facilitadora expõe os instrumentos originais que carregam esses nomes. - Exposição livre individual dos participantes sobre suas pesquisas ou trabalhos sociais onde já observaram a presença da Sistematização ou sobre como a Sistematização poderia atuar. Exposição livre individual sobre os aprendizados obtidos no mini-curso. Resultados a serem alcançados: - Espera-se que os e as participantes tenham contato com a metodologia de Sistematização de Experiências, entendendo sua gênese própria aos movimentos sociais da América Latina e seu caráter produtor de conhecimento alinhado com a construção de mundos mais justos, diversos e igualitários. - Espera-se que os e as participantes apreendam a Sistematização de Experiências como um modelo metodológico muito além do que um instrumento, mas como uma proposta de metodologia de produção de conteúdo com profundidade e densidade de informações capazes de enriquecer fortemente uma pesquisa científica de caráter participativo. - Espera-se que os e as participantes memorizem as etapas de uma Sistematização de Experiências e possam compreender o detalhamento técnico que é necessário para executar o método, segundo o autor Oscar Jara Holliday (2018). - Espera-se que os e as participantes possam exercitar sua criatividade e criar ideias de instrumentos que sirvam para execução de uma Sistematização de Experiências. - Espera-se que os e as participantes possam refletir sobre a aplicabilidade do método da Sistematização em seus trabalhos sociais e pesquisas científicas.
Título do Evento
IV Simpósio Internacional Pensar e Repensar a América Latina II Congresso Internacional Pensamento e Pesquisa sobre a América Latina
Cidade do Evento
São Paulo
Título dos Anais do Evento
Anais do Simpósio Internacional Pensar e Repensar a América Latina e do Congresso Internacional Pensamento e Pesquisa sobre a América Latina
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

CAMPOS, Carla de Paula Silva; CORDEIRO, EUGENIA DE PAULA BENICIO. APRENDER A SISTEMATIZAR UMA EXPERIÊNCIA: A ARTE METODOLÓGICA PRÓPRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR, CAPAZ DE RESGATAR E PRODUZIR MEMÓRIA, INTELIGÊNCIA, AUTONOMIA E ORGANICIDADE... In: Anais do simpósio internacional pensar e repensar a América Latina e do congresso internacional pensamento e pesquisa sobre a América Latina. Anais...Sao Paulo(SP) Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2024. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/pensar-e-repensar/881421-APRENDER-A-SISTEMATIZAR-UMA-EXPERIENCIA--A-ARTE-METODOLOGICA-PROPRIA-DA-EDUCACAO-POPULAR-CAPAZ-DE-RESGATAR-E-PRO. Acesso em: 16/07/2025

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