TRADIÇÃO, GRAFISMOS, CURADORIA E EXPOGRAFIA DOS BANCOS INDÍGENAS DO BRASIL

Publicado em 10/03/2025 - ISBN: 978-65-272-1241-6

Título do Trabalho
TRADIÇÃO, GRAFISMOS, CURADORIA E EXPOGRAFIA DOS BANCOS INDÍGENAS DO BRASIL
Autores
  • Danilo Lorena Garcia
Modalidade
Minicurso
Área temática
Arte e Pensamento na América Latina
Data de Publicação
10/03/2025
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/pensar-e-repensar/865960-tradicao-grafismos-curadoria-e-expografia-dos-bancos-indigenas-do-brasil
ISBN
978-65-272-1241-6
Palavras-Chave
arte indígena, arte contemporânea, curadoria, expografia, grafismo
Resumo
O minicurso TRADIÇÃO, GRAFISMOS, CURADORIA E EXPOGRAFIA DOS BANCOS INDÍGENAS DO BRASIL tem como objetivo apresentar os mecanismos do trabalho de curadoria e de expografia, tendo os bancos indígenas como objeto de pesquisa. O minicurso tem como objetivo fomentar a pesquisa sobre a arte indígena, especificamente sobre os bancos indígenas, uma arte ancestral que vem passando de geração em geração, mas que são também obras únicas, nas quais é possível reconhecer não apenas os sinais da cultura de que provêm, mas o estilo único daquele que a talhou - o artista. Pensar a arte dos povos originários, e toda a sua carga anímica que carrega consigo, vem de encontro com o tema central do Simpósio “Pensar e Repensar a América Latina”, principalmente ao compreendermos que essa arte está presente antes mesmo da Colonização Portuguesa. O mergulho sobre esse universo estético ajuda a compreender as ligações entre a arte brasileira “oficial” e a arte indígena - ou, em outras palavras, mostra o quanto as manifestações artísticas do Brasil urbano e moderno devem à arte de seus povos originários, o que nos faz aproximar do área temática inscrita - Arte e Pensamentos na América Latina. Durante o minicurso será apresentada a Coleção BEI, hoje conhecida como a maior coleção de Bancos Indígenas do Brasil, com 53 etnias diferentes e mais 1.300 peças em seu acervo. A coleção vem realizando exposições em diferentes cidades do Brasil e no exterior, sempre expondo a arte dos povos originários. Durante a aula os alunos terão acesso às estratégias de curadoria adotada pela BEI, o processo de seleção das obras em diálogo com o recorte proposto para exposição e o projeto expográfico. METODOLOGIA Será exposto aos alunos uma série de imagens e vídeos sobre bancos indígenas, curadoria e projetos expográficos realizados pela Coleção BEI, como modo de estabelecer diálogos e discussões sobre o tema. Roteiro da aula: 1 - Apresentação da coleção bei Apresentação da Coleção BEI- o motivo de colecionar os bancos, a quantidade e a diversidade que ela possui. Apresentar historicamente quando começou a confecção dos bancos. Reproduzir o vídeo de como fazer um banco Mehinaku e Tikuna - produzidos pela Coleção BEI 2 - Curadoria e expografia O que é a curadoria? Quando surgiu a curadoria? Qual o papel do curador? Quais são os cuidados que o curador deve ter ao realizar uma exposição? O que é a expografia? Qual a relação do espaço com a Obra de arte? Como escolher um local para exposição? Quais elementos devem ser levados em consideração para a construção de uma expografia? Quais são os desafios na construção da exposição dos bancos indígenas a partir da expografia? Qual a relação entre curadoria e expografia na construção da exposição dos bancos indígenas? 3 - Os grafismos e sua ancestralidade Quais são os significados dos grafismos? Como eles são feitos e qual a sua função? 4 - Os tensionamentos da arte indígenas na contemporaneidade Quais são os desafios da arte indígena atualmente ? Qual a relação da Arte e artesanato ? Como o público e o mercado de arte recebe a arte dos povos originários? Quais são as expectativas da arte indígena, tanto na venda, quanto na visibilidade e no mercado nacional e internacional? RESULTADOS A SEREM ALCANÇADOS Por meio do minicurso os alunos terão a oportunidade de aprofundar o saber sobre curadoria, expografia e a arte dos povos originários, conhecimento este que poderão usar em suas práticas curatoriais, expográficas e em suas pesquisas sobre os temas do minicurso. SOBRE A COLEÇÃO BEI A Coleção BEI nasceu de um deslumbramento estético com a beleza das formas, cores, grafismos e texturas dos bancos indígenas brasileiros. Sua trajetória, portanto, começou no encantamento, mas seguiu em direção a uma compreensão mais profunda de seus significados. Mais que um agrupamento de objetos belos, a Coleção é uma reunião de obras estreitamente ligadas à identidade brasileira, que revelam quanto às manifestações artísticas do Brasil urbano e moderno devem à arte dos povos originários. São peças fabricadas segundo técnicas antigas, transmitidas de geração a geração, mas são também obras únicas, nas quais é possível reconhecer não apenas a cultura de que provêm, mas também o estilo único daquele que as talhou – a marca do autor, que não se confunde com a do grupo. Podem ser funcionais ou exercer um papel simbólico e ritualístico nas aldeias, mas respondem também à demanda de compradores e colecionadores externos. Os grafismos que adornam os bancos são marcas de identidade de cada etnia, embora possam ser compartilhados por diferentes culturas, por força da interação entre os povos; nesse caso, o mesmo padrão pode assumir significados distintos em cada cultura. Traçados com pigmentos naturais, os desenhos fazem referência aos mitos, à cosmogonia das culturas e/ou a animais, cuja pelagem é representada de forma estilizada. Os grafismos encontrados nos bancos também podem ser vistos na pintura corporal usada em rituais e em outros objetos de uso cotidiano ou sagrado. Dessa forma, vistos em conjunto, os bancos refletem a dialética entre a arte e o artefato, o objeto sagrado e a mercadoria, a tradição e a experimentação. Embora permeáveis às demandas contemporâneas, preservam características que revelam a grande sofisticação estética das civilizações que floresceram no Brasil pré-colonial. Assim, a partir deste único objeto, pode-se reconstruir toda a variedade, a diversidade e o refinamento das culturas ancestrais brasileiras, que permanecem vivas e em contínua transformação. TEXTOS PRODUZIDOS PARA A COLEÇÃO BEI DESIGN E SÍMBOLO Claudia Moreira Salles Designer Função, ergonomia, forma e tecnologia são questões inerentes ao design. O conjunto de bancos indígenas apresentados neste livro provoca a reflexão sobre os limites tênues e por vezes subjetivos desses conceitos. Quando se pensa no ato de sentar, a primeira associação é a busca do conforto. É a função essencial dessa postura que permite relaxar os músculos e descansar da posição ereta. Ao vermos imagens de um escriba egípcio de pernas cruzadas ou de um candango de cócoras percebemos que cada cultura estabelece códigos diferentes para o sentar, e o conforto passa a ser uma noção subjetiva. Os assentos criados pelas diversas tribos indígenas não têm encosto, são baixos e individuais. No entanto, não havia nenhum limitador para que os índios não colocassem apoios para as costas ou aumentassem sua altura. Os bancos eram concebidos de acordo com o que lhes parecia necessário. As superfícies dos assentos são, na grande maioria, arredondadas. Em alguns exemplares, como no veado feito pelos Trumai ou na onça dos Kuikuro, a curvatura nos dois sentidos traz um conforto adicional. Acredito que houve uma intenção nesse sentido, não apenas o acompanhamento da forma do tronco de madeira. Cantos vivos são desagradáveis no contato com o corpo. Os bancos tem inspiração na natureza e nela não existem ângulos retos. Os assentos indígenas ampliam o conceito de função para outra dimensão: a simbólica. Os bancos tinham uma função sagrada e um papel importante nos rituais como veículos de transformação e transporte para outros estados da mente e da alma. A maior parte é zoomórfica, e cada animal carrega sua simbologia. As aves, por exemplo, levam para longe, para o mundo sobrenatural; a onça remete à força. Acredita- se que para os indígenas as pernas flexionadas, com os joelhos apontados para cima, propiciava o contato entre a terra e o céu -- talvez uma explicação para a pouca altura dos assentos (ou talvez , nesse universo mágico, não caiba buscar explicações). Para os índios, sentar em bancos era, quase sempre, uma prerrogativa masculina; seu uso indicava a hierarquia entre os indivíduos. Há uma grande diversidade nas estilizações dos animais e nas pinturas decorativas usadas por certas tribos. A necessidade de fazer diferente é inerente a quem cria, e o artesão quer deixar sua marca. O material, como não poderia deixar de ser para povos que vivem cercados de florestas, é a madeira. O esmero nas curvas e nos acabamentos atesta a alta qualidade dos artesãos. O racionalismo do século XX repudiou o aspecto simbólico dos objetos, privilegiando a tecnologia e a verdade dos materiais. Só a partir dos anos 1980, a reação pós-moderna provocou o renascimento da linguagem simbólica e decorativa dos objetos, aproximando design e arte. Na produção indígena a simplicidade e a busca da forma espiritual emocional nessas duas dimensões. Forma e função, crença e arte: uma só intenção, um só desígnio. BANCOS INDÍGENAS: ENTRE ARTE E ARTEFATO Cristiana Barreto Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo Origens, tradição e resistência Foi sentada em seu banco de quartzo que a Avó do Universo, moradora da Maloca do Céu, criou os homens, os animais, a terra e as águas. O banco foi entregue aos ancestrais dos atuais Tukano, que passaram a reproduzi-lo em madeira. O mito Tukano – povo do noroeste da Amazônia que ainda hoje fabrica os bancos em seu estilo tradicional – indica o lugar dos bancos entre os objetos sagrados, ao mesmo tempo parte do universo primevo e fonte do poder de criação. A presença nos mitos de origem de alguns povos atesta a antiguidade da arte de talhar bancos: os primeiros registros do uso desses objetos entre ameríndios das terras baixas da América do Sul, do Caribe e da América Central datam de, pelo menos, 4 mil anos. São assentos individuais feitos de pedra ou de cerâmica (materiais que, diferentemente da madeira, resistiram ao ambiente tropical) de diferentes dimensões. Existem desde verdadeiros tronos esculpidos em pedra, encontrados dentro de antigos templos ou palácios (como os famosos bancos da cultura Manteña da costa do Equador, feitos entre os séculos IX e XVI) até pequenos bancos circulares de cerâmica, típicos de algumas culturas pré-incaicas do Equador e do Peru (como Narrío e La Tolita), mas presentes também na Amazônia, como os da cultura Marajoara, fabricados entre os séculos IV e XIV. Se não temos bancos arqueológicos de madeira, podemos inferir seu uso e forma a partir de estatuetas e urnas funerárias cerâmicas que retratam indivíduos sentados. Essas representações mostram que os bancos usados no passado não eram diferentes dos atuais: sempre talhados em uma única peça, com uma dupla base de apoio e decoração externa, tomando às vezes a forma de animais. Constata-se assim que, ao contrário do que aconteceu com outras práticas tradicionais, a produção de bancos perdurou até nossos dias, chegando mesmo a revitalizar-se nas últimas décadas. Atualmente, os bancos mais conhecidos, por sua comercialização, são os feitos pelos índios que habitam o Alto Xingu, no Mato Grosso. Seus diferentes estilos refletem a diversidade de origens, línguas e histórias de cada um dos dezesseis povos que o Parque Indígena do Xingu abriga. Fora do parque, os Tukano mantêm-se como um importante polo de produção. Vivendo ao lado de outros vinte povos indígenas, eles compartilham um complexo sistema de trocas de diferentes objetos e produtos, no qual os bancos são não só a sua especialidade artesanal, mas também um distintivo de identidade. Povos de outras áreas também continuam a fazer bancos, como os Karajá, os Asurini e os Tapirapé, no Brasil central, ou como os Waiwai, os Wayana e os Palikur do norte amazônico, na região das Guianas e Amapá. Seja como objetos usados no cotidiano da aldeia ou em situações cerimoniais, seja como produtos para a venda externa, oferecidos como artesanato ou design ou colecionados como arte indígena, os banquinhos hoje fazem parte dos poucos itens da cultura material indígena que, mesmo quando reapropriados fora de seu universo original, permanecem símbolos de uma duradoura tradição. Os bancos indígenas fazem parte, assim, do rol dos objetos ditos “resistentes”, isto é, aqueles que não foram substituídos pelos produtos industrializados introduzidos aos índios desde os primeiros contatos com o branco. Machados, panelas, roupas e barcos, entre outros, foram rapidamente absorvidos em razão de sua eficácia funcional e maior durabilidade, bem como pela facilidade em obtê-los prontos. A resistência dos bancos é um bom indício de que a sua função utilitária certamente não é a razão principal pela qual os índios continuam a fabricá-los, reproduzindo, ao longo de gerações, uma cadeia operatória de técnicas de entalhe e decoração que, ao fim de três ou quatro dias, produz um único banquinho. Entre muitos povos indígenas, o uso dos bancos materializa algumas regras sociais internas da comunidade. Sentar em bancos é quase sempre uma prerrogativa masculina; às mulheres são reservadas as esteiras, colocadas diretamente sobre o chão, o que determina que elas mantenham as pernas estendidas. O ato de sentar sobre bancos implica flexionar as pernas e colocar os pés no solo com os joelhos apontando para o céu, numa posição que cria o contato entre a terra e o céu, entre o mundo natural dos humanos e o mundo sobrenatural dos espíritos, posição esta muitas vezes só permitida a alguns homens mais importantes da aldeia. Durante as cerimônias e os rituais, sobretudo, os bancos são usados de forma a diferenciar os indivíduos da comunidade, separando os homens das mulheres, os jovens dos velhos, os guerreiros e xamãs do restante da comunidade. Entre quase todos os povos que fabricam bancos, seu tamanho está diretamente relacionado à idade e ao prestígio do usuário. O uso dos bancos varia entre os diferentes povos. Entre os Suyá, eles são usados por todos na aldeia, mas a mulher, o filho ou a filha não podem sentar no banco do pai. Entre os Kaiabi, apenas os xamãs e grandes chefes podiam usar o banco. Entre os Wayana, os bancos femininos são visivelmente mais baixos que os masculinos, e há um modelo diferente, com figuras de animais de cada lado, para os homens mais idosos. Entre os Yudjá, os bancos eram feitos especialmente para o uso ritual dos xamãs e grandes chefes. No Alto Rio Negro, o banco, denominado kumurõ, é também o artefato do pajé, do kumu, aumentando de tamanho segundo seu prestígio. Os bancos também podem ser feitos para serem trocados com outros povos indígenas ou ofertados a seus aliados. Os homens Tukano, que devem casar com mulheres de povos vizinhos, muitas vezes fazem bancos para seus cunhados ou sogros. Além de funcionarem como um demarcador social ou uma insígnia de prestígio, os bancos possuem uma dimensão sagrada. São utilizados pelos xamãs para se transformar, ascender a mundos sobrenaturais e interceder junto àqueles que causam doenças, mortes ou outras crises. Muitas vezes, é sentado sobre um banco que o xamã é induzido a um estado alterado de transe, seja por meio do consumo de bebidas alcoólicas ou de drogas alucinógenas, seja fumando tabaco, ou ainda apenas através dos cantos e das danças executados ao seu redor. Não por acaso, entre os Desana, o desenho na superfície do banco é chamado de pahmelin gohori, isto é, desenho da transformação. O banco permite ao usuário se destacar do que está à sua volta; usá-lo é um ato essencial da procura do xamã por poderes visionários, porque simboliza um eixo, um ponto de referência central para mediar, pressagiar e realizar as curas. Assim, em muitos rituais, os bancos, junto com outros objetos sagrados, adquirem poderes próprios e são usados como verdadeiros veículos de transformação e transporte. Entre alguns dos povos do Alto Xingu que produzem bancos zoomórficos, tradicionalmente os bancos dos xamãs eram entalhados na forma de aves, animais considerados mais próximos do mundo sobrenatural pela capacidade de voar. Aparecem, sobretudo, aves de rapina como o urubu-rei ou o jaburu, que em geral assumem um grande protagonismo nos mitos de origem desses povos. Alguns desses bancos/aves apresentam duas ou mais cabeças e uma concavidade na superfície do assento, usada para triturar e preparar os pigmentos usados na pintura corporal. Assim, para além do sentar, os bancos materializam conhecimento, tradição e crenças que são de certa forma reatualizadas a cada vez que se talha uma nova peça. Como muitos dos outros objetos rituais indígenas, fazer o banco é tão importante quanto usá-lo. Os bancos bonitos são aqueles que são bem feitos. A produção indígena artesanal contemporânea A preservação da cultura material, de seus objetos e técnicas tradicionais, é uma ação de autodeterminação e uma das formas mais eficazes de resistência dos povos indígenas. A salvaguarda e a revitalização de conhecimentos tradicionais vêm sendo feitas de inúmeras maneiras. É crescente o número de cooperativas de produção de artesanato, de cursos e oficinas para a transmissão de conhecimentos tradicionais dos mais velhos para os mais novos, de atividades de pesquisa e documentação de objetos tradicionais por agentes indígenas. Cresce também o número de publicações, vídeos, filmes, exposições e museus que trazem à luz o rico universo artístico e tecnológico indígena. Um olhar aprofundado sobre os objetos produzidos hoje pelas comunidades indígenas revela não apenas a ênfase no processo, o “fazer com arte” característico da produção artesanal indígena, mas também a relação entre esse fazer e a salvaguarda de conhecimentos tradicionais. A revitalização da cultura material acaba também por recuperar importantes aspectos da cultura imaterial: gestos e modos de fazer, denominações linguísticas, memórias, mitos, cantos e danças rituais são reatualizados através da produção material. Em 2003, por exemplo, a partir da pesquisa e do dossiê montado por agentes indígenas sobre a pintura corporal e os grafismos dos índios Wajãpi, povo indígena do Amapá, sua arte gráfica foi reconhecida como Patrimônio Imaterial Nacional pelo Iphan e depois como obra-prima do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade pela Unesco. A pesquisa evidenciou que os grafismos estavam intimamente associados aos mitos e à memória oral desse povo. Outro exemplo importante ocorreu em 2008, com a criação do Museu Kuahi pelos indígenas do Oiapoque, também no Amapá, com a proposta de integrar a produção estética de distintos povos da região, promovendo atividades de intercâmbio entre aldeias, instituições acadêmicas e museus. Isso mostra a participação ativa de comunidades indígenas na elaboração de seus próprios museus ou em programas de pesquisa e preservação de seu patrimônio, fenômeno resultante de um duplo processo de amadurecimento: de um lado, as comunidades percebem suas tradições estéticas como um instrumento efetivo de afirmação de sua identidade específica; de outro, a sociedade nacional valoriza a complexidade dessas manifestações ancoradas em tradições orais, conhecimentos e cosmologias nem sempre visíveis e tangíveis. É nesse quadro que se situa a atual produção artesanal dos banquinhos para a venda. A renda gerada pela venda de artesanato raramente se constitui na principal fonte de recursos de qualquer comunidade indígena, mas vem sendo mantida entre muitos povos por também propiciar uma atividade agregadora, coletiva e de salvaguarda de conhecimentos tradicionais. A venda realizada por meio de lojas da Funai, de cooperativas indígenas ou de comerciantes especializados em artesanato indígena traz elementos tanto de revitalização como de mercado. Modificações podem ser introduzidas a partir de padrões estéticos ocidentais, isto é, de quem compra, estabelecendo-se uma dinâmica nem sempre positiva para a manutenção de tradições. O mercado talvez não seja a via ideal para que se estabeleça um diálogo estético entre os índios e a sociedade nacional. Mas é através dele que muitos dos objetos indígenas como os bancos, a rede de dormir, os cestos e os adornos corporais têm entrado no universo do design ocidental. Alguns antropólogos estudiosos das artes indígenas brasileiras acreditam mesmo que o fato de que os povos indígenas não concebam a arte como um domínio autônomo e meramente contemplativo -- ou seja, não separem arte de artefato, ou o belo do útil -- faz com que suas criações se aproximem mais de nossos projetos de design do que de obras de arte. Acreditam, ainda, que somente quando o design suplantar as “artes puras” ou as “belas artes” é que teremos na sociedade ocidental um quadro similar ao das sociedades indígenas. Enfim, na fruição estética dos bancos indígenas, sejam eles reconhecidos como obras de arte, artefatos ou objetos de design, talvez a lição mais importante que tenhamos a aprender seja a de que nada deve ser feito sem arte, tradição e beleza.
Título do Evento
IV Simpósio Internacional Pensar e Repensar a América Latina II Congresso Internacional Pensamento e Pesquisa sobre a América Latina
Cidade do Evento
São Paulo
Título dos Anais do Evento
Anais do Simpósio Internacional Pensar e Repensar a América Latina e do Congresso Internacional Pensamento e Pesquisa sobre a América Latina
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

GARCIA, Danilo Lorena. TRADIÇÃO, GRAFISMOS, CURADORIA E EXPOGRAFIA DOS BANCOS INDÍGENAS DO BRASIL.. In: Anais do simpósio internacional pensar e repensar a América Latina e do congresso internacional pensamento e pesquisa sobre a América Latina. Anais...Sao Paulo(SP) Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2024. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/pensar-e-repensar/865960-TRADICAO-GRAFISMOS-CURADORIA-E-EXPOGRAFIA-DOS-BANCOS-INDIGENAS-DO-BRASIL. Acesso em: 28/06/2025

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