SEMENTES CRIOULAS, COLONIALIDADE ALIMENTAR E EROSÃO BIOCULTURAL

Publicado em 10/03/2025 - ISBN: 978-65-272-1241-6

Título do Trabalho
SEMENTES CRIOULAS, COLONIALIDADE ALIMENTAR E EROSÃO BIOCULTURAL
Autores
  • MARINA AUGUSTA TAUIL BERNARDO
  • Katya Isaguirre
  • Shirleyde Alves dos Santos
Modalidade
Minicurso
Área temática
Campesinato latino-americano nos mundos das águas, das florestas e dos campos
Data de Publicação
10/03/2025
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/pensar-e-repensar/819000-sementes-crioulas-colonialidade-alimentar-e-erosao-biocultural
ISBN
978-65-272-1241-6
Palavras-Chave
Agrobiodiversidade; Agroecologia; Campesinato; (R)Existências
Resumo
Ministrantes: Dra. Katya Regina Isaguirre-Torres (Docente do Programa de Pós-graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná – UFPR); Msc. Shirleyde Alves dos Santos (Docente no Centro de Ciências Agrárias e Ambientais da Universidade Estadual da Paraíba); Msc. Marina Augusta Tauil Bernardo (Doutoranda em Direito e Democracia – UFPR). Ementa Este minicurso visa como objetivo principal ampliar o debate interdisciplinar entre diferentes áreas, especialmente com as ciências sociais e ciências agrárias, sobre as sementes crioulas, variedades milenares conservadas e manejadas por agricultores familiares, quilombolas, indígenas e outros povos tradicionais. Ainda que não pretenda esgotar o tema em um dia, como objetivos específicos o minicurso buscará, tanto quanto possível, abarcar questões que decorrerem do processo histórico de colonização de territórios latinoamericanos e da resultante colonialidade alimentar propagada pela manutenção de um modelo de sistema agroexportador de commodities no Brasil, além de evidenciar práticas de extensão e pesquisa em Agroecologia realizadas em territórios nacionais. De modo empírico, compartilharemos sobre duas experiências: Projeto “Territórios Livres” desenvolvido pela Associação Brasileira de Agroecologia, com o apoio da Fundação Heinrich Böll Brasil, realizado em territórios de Alagoas, Ceará, Pernambuco e da Paraíba, durantes os anos de 2021 a 2023, e o “Banco de Sementes Crioulas” mantido pelo Grupo de Agroecologia Gaia, da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), desde 2015, junto a discentes e agricultores familiares da região centro sul do Rio Grande do Sul. Ademais, pretende-se, possibilitar o contato dos participantes com as sementes crioulas, através de uma pequena exposição dessas variedades durante a ocorrência do minicurso. Com isso, busca-se uma diversidade de pesquisadores, estudantes de Pós-Graduação, Graduação e latinoamericanos dispostos a constituir um espaço de diálogo sobre universo biocultural das sementes crioulas e a urgência de conservação dessas variedades. Justificativa O conceito de sementes crioulas - também chamadas de sementes de variedade local ou tradicional - são aquelas conservadas e manejadas por agricultores familiares, quilombolas, indígenas e outros povos tradicionais e que, ao longo de milênios, vêm sendo permanentemente adaptadas às formas de manejo dessas populações e aos seus locais de cultivo. Estão em constante processo de evolução e adaptação ao meio e às práticas de manejo, e esse processo sofre a influência dos tradicionais sistemas de trocas e intercâmbio de material genético praticados por comunidades rurais, refletindo a identidade cultural de diferentes povos. Importante apontar que termos “descoberto” e “descobrimento” são utilizados de formas errôneas quando associado ao processo de conquista do continente americano, sendo válido, somente, sob uma perspectiva histórica eurocêntrica. Nesse viés, com intuito de colonização e desenvolvimento dos países periféricos, as raízes do processo histórico social de formação latinoamericana decorre de uma ideologia dualista e segregacionista que usurpa a natureza e inviabiliza os saberes e conhecimentos ancestrais de povos não eurocêntricos. Desse modo, os saberes locais foram (e ainda são) ocultados e silenciados por essa força epistemológica estrangeira e criada na intenção de conquista de novos territórios, o que nos possibilita apresentar e/ou aprofundar a temática da usurpação da agrobiodiversidade da América Latina e Caribe, assunto relacionado ao tema do encontro. Nessa perspectiva, com o advento da formação da sociedade capitalista brasileira, um novo processo de integração da economia mundial se articulou através da proposta de desenvolvimento industrial centralizado nas necessidades dos países europeus e dos Estados Unidos da América. Nessa integração, não existem países excluídos, todos estão incluídos na lógica do capitalismo que produz ao mesmo tempo desenvolvimento e subdesenvolvimento, como um produto do desenvolvimento capitalista mundial. O que reflete no modelo de produção agrícola difundido e incorporado pelo Brasil após a 2º Guerra Mundial. No que tange a esse novo modelo de desenvolvimento, no final da década de 1950 e início da de 1960, os centros econômicos impulsionaram o processo de industrialização brasileira e a disseminação ideológica da “modernização” do campo através da disseminação de práticas agrícolas e alimentares, denominada “Revolução Verde”. Nesse sentido, a introdução de um “modelo industrial de agricultura” se caracterizou pela constituição de cadeias agroindustriais, o uso de pacotes tecnológicos e o acesso ao crédito rural, direcionado aos cultivos para agroexportação, abundante e com juros baixos, visando o aumento da produção de commodities. Sem considerar as realidades socioeconômicas dos países economicamente dependentes, impulsionou a invisibilização da importância das práticas agrícolas realizadas pelos agricultores e agricultoras para a manutenção da agrobiodiversidade. Embora detentor do poderio legislativo de direcionar a construção de legislações que assegurassem o patrimônio natural dos povos que compõem a população brasileira, o Estado Brasileiro cede à pressão dos mercados e potências internacionais, impulsionando a construção de legislações coadunadas às políticas neoliberais de abertura econômica ao mercado internacional. Em decorrência desse contexto, surgiram então legislações e políticas públicas, inclusive relativas a sementes, destinadas a orientar o desenvolvimento de um setor “moderno” de produção agrícola que de forma progressiva fortalecesse os processos de mercantilização da natureza. O que de acordo com a Teoria Crítica Marxista da Dependência, pensamento desenvolvido nos anos 60 e 70 a partir de autores como Ruy Mauro Marini, evidencia-se a relação de subordinação entre nações formalmente independentes e a periferia dependente do capitalismo mundial que se forma. Todavia, analisar a questão das sementes crioulas no Brasil também requer observar a perspectiva do que se considera como conceito de território geograficamente situado. Sendo um país tão diverso, cabe problematizar as condições histórico geográficas que levaram à centralidade do território constituído a partir da estrutura fundiária brasileira constituída pela colonização europeia e que se perpetua na atualidade. Desse modo, a partir de uma perspectiva de análise teórica decolonial, observa-se que a erosão biocultural das sementes crioulas decorra desse processo histórico social de colonialidade alimentar deflagrada pela colonização dos territórios nacionais e a resultante desconstrução dessas variedades no imaginário de agricultoras e agricultores latinoamericanos. Entretanto, partindo de uma análise interseccional, mesmo com o modelo de produção agrícola monocultor e agroexportador dominante perpetuado desde a época da colonização, estudos científicos demonstram que as variedades crioulas são conservadas pelas práticas de (r)existências realizadas por guardiãs e guardiões campesinos em prol das variedades crioulas, torna-se possível tal análise na perspectiva do eixo temático de “campesinato latino-americano nos mundos das águas, das florestas e dos campos”, previsto pelo evento. Nesse sentido, Organizações, Entidades e Movimentos Sociais que atuam de modo local, regional e territorial, tornaram-se importantes coletivos na luta pela conservação das sementes crioulas Nesse sentido, criada em 2004, a Associação Brasileira de Agroecologia reúne profissionais e estudantes das mais diversas áreas do conhecimento, com a finalidade de incentivar e contribuir para a produção de conhecimentos técnico científicos no campo da agroecologia, de forma integrada ao saber popular, bem como contribuir na elaboração e implantação de políticas públicas, visando a melhoria da qualidade de vida e a inclusão social. Com o lema, que reafirmamos “Sem feminismo não há Agroecologia”, propôs o Projeto “Territórios Livres”, com o apoio da Fundação Heinrich Böll Brasil, realizado em territórios de Alagoas, Ceará, Pernambuco e da Paraíba, durantes os anos de 2021 à 2023, de modo a articular e visibilizar, a partir da agroecologia feminista e antirracista, o trabalho de mulheres agricultoras agroecológicas e de pesquisadoras que atuam com as mulheres rurais. Nesse cenário, as mulheres se apresentam como agentes de transformação, promovendo a massificação de territórios livres, os quintais produtivos e a linha de frente de (r)existência pelas sementes crioulas. Ademais, como outra experiência a ser compartilhada, o “Banco de Sementes Crioulas” mantido pelo Grupo de Agroecologia Gaia (UERGS), envolvendo docentes, discentes e a comunidade, foi formado em 2015, de forma a atuar através de propostas pedagógicas articuladas a práticas sociais que despertem conscientização e atuação em prol da agroecologia nos atores sociais no âmbito do município de Cachoeira do Sul, localizada na região central do Rio Grande do Sul, distante a 196 km de Porto Alegre, capital do Estado. Transformado em “Núcleo de Estudos em Agroecologia Gaia Centro Sul”, em 2020, a partir da aprovação do Projeto CNPq 21/2016, as ações do projeto foram ampliadas a municípios vizinhos, com intuito de possibilitar novas relações sociais atreladas à realidade local e oportuniza o resgate da autonomia dos agricultores familiares e a formação e educação de discentes e integrantes da comunidade. Todavia, os impactos causados pelos sistemas agroalimentares industriais e os oligopólios de produção alimentar seguem contribuindo à concentração, processamento, padronização e distanciamento do consumidor/agricultor. Com o aumento dos centros urbanos e outras mudanças na cultura alimentar, cada vez mais a população está incluindo os ultraprocessados, alimentos sintéticos e transgênicos e derivados em seus cardápios e segue reduzindo a diversidade de alimentos naturais que comia anteriormente. Tal lógica industrial de alimentação resulta no incentivo à manutenção de um modelo agrário monocultor, que possui como pilar o uso excessivo de agrotóxicos e fertilizantes químicos. E as sementes crioulas estão sofrendo um processo de extinção. Nesse sentido, vislumbra-se como resultados, através deste minicurso, a oportunidade de realizar uma necessária conscientização sobre as sementes crioulas e evidenciar como o processo de mercadorização dos alimentos usurpam dos indivíduos o direito de escolher alimentos livres de transgênicos, distanciando-os de suas identidades culturais. Metodologia O minicurso ocorrerá em duas sessões divididas em três momentos, através de exposição oral dos assuntos abordados pelas ministrantes e com a utilização de recursos audiovisuais. Na primeira sessão, pela manhã, que ocorrerá após a apresentação dos ministrantes e participantes como recurso pedagógico de integração, serão apresentados aspectos mais gerais, que dizem respeito usurpação da biodiversidade latinoamericana, e aspectos legislativos e mais técnicos, como a liberação de organismos genéticos modificados no meio ambiente brasileiro e a erosão genética causada pela extinção das sementes crioulas. Já na segunda sessão, pela tarde, abordaremos temáticas mais específicas, a partir de uma perspectiva decolonial, relacionadas às práticas tradicionais e ancestrais de (r)existência que possibilitam a conservação da biodiversidade brasileira. De modo empírico, dialogaremos sobre duas experiências: Projeto “Territórios Livres” desenvolvido pela Associação Brasileira de Agroecologia, com o apoio da Fundação Heinrich Böll Brasil e o “Banco de Sementes Crioulas” mantido pelo Grupo de Agroecologia Gaia (UERGS). Por derradeiro, de modo a ampliar o debate, reservamos os momentos finais das duas sessões para discussões, dúvidas, questionamentos e trocas de experiências. Cronograma O Minicurso terá duração de seis horas e ocorrerá em duas sessões, no dia 04 de novembro, das 9h às 12h e das 14h às 17h. 1º sessão: Colonização Estrutural e a (Des)Construção da Cultura Alimentar Latinoamericana Manhã: das 9h às 12h Apresentação de ministrantes e participantes. 1º Momento: 09:30h às 10:30h Tema: Processo de Colonização, Colonialidade Alimentar e Usurpação da Biodiversidade Latinoamericana 2º Momento: 10:30h às 11:30h Tema: Dependência Brasileira, Construções Normativas, Commodities e a Erosão Biocultural 3º Momento: 11:30h às 12:00h Roda de Conversa e Troca de Saberes 2º sessão: Agrobiodiversidades e os Processos de (R)Existências no Brasil Tarde: das 14h às 17h 1º Momento: 14:00h às 14:45h Tema: Ancestralidade e as Práticas Tradicionais de Conservação da Biodiversidade 2º Momento: 14:45h às 15:30h Tema: Mulheres, Quintais Produtivos, Sementes da Paixão e Territórios Livres 3º Momento: 15:30h às 16:15h Tema: Agrobiodiversidade Gaúcha e o Banco de Sementes Crioulas do Grupo de Agroecologia Gaia 4º Momento: 11:30h às 12:00h Roda de Conversa e Troca de Saberes Bibliografia Inicial Recomendada: CARVAJAL, Laura María. Extractivismo en América Latina: impacto en la vida de las mujeres y propuestas de defensa del territorio Bogotá/Colômbia. Fondo de Acción Urgente de América Latina (FAU-AL), 2016. ESCOBAR, Arturo. La invención del desarrollo. Popayán: la nossa alimentação, v. 1, 2017. GARCIA, Rosa Wanda Diez. Reflexos da globalização na cultura alimentar: considerações sobre as mudanças na alimentação urbana. Revista de nutrição, v. 16, p. 483-492, 2003. LORIMER, Rosemeire Bertolini. O impacto dos primeiros séculos de história da América portuguesa na formação da brasilidade alimentar. 2001. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo. MACIEL, Maria Eunice; MENASCHE, Renata. Alimentação e cultura, identidade e cidadania. Você tem fome de quê?. Democracia viva, v. 16, 2003. MAGALHÃES, Clarissa. Comida de comer, comida de pensar. Cadernos de debate, v. 3, p. 29-57, 1995. MARINI, Ruy Mauro. Dialéctica de la dependência. In: MARINI, Ruy Mauro. América Latina, dependencia y globalización /antología y presentación, Carlos Eduardo Martins. — México, D. F.: Siglo XXI Editores; Buenos Aires: CLACSO, 2015, p.107-150. 1ª reimpressão: 1991. QUIJANO, Anibal. El Fantasma del Desarrollo en América Latina. In: Acosta, A. (comp.), “El desarrollo en la globalización. El resto de américa latina”. Caracas: Nueva Sociedad e Ildis, p. 11-27, 2000. SANTILLI, J. Agrobiodiversidade e Direitos dos Agricultores. São Paulo: Petrópolis, 2009. SANTILLI, J. A Lei de sementes brasileiras e seu impacto sobre a agrobiodiversidade e os sistemas agrícolas locais e tradicionais. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi Ciências Humanas, Belém, v.7, n.2, p. 457 – 475, 2012. SILVA, Antônio Carlos Barbosa da. Debates sobre culturas alimentares: conversas em torno da cultura alimentar brasileira. RELACult-Revista Latino-Americana de Estudos em Cultura e Sociedade, v. 4, n. 3, 2018.
Título do Evento
IV Simpósio Internacional Pensar e Repensar a América Latina II Congresso Internacional Pensamento e Pesquisa sobre a América Latina
Cidade do Evento
São Paulo
Título dos Anais do Evento
Anais do Simpósio Internacional Pensar e Repensar a América Latina e do Congresso Internacional Pensamento e Pesquisa sobre a América Latina
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

BERNARDO, MARINA AUGUSTA TAUIL; ISAGUIRRE, Katya; SANTOS, Shirleyde Alves dos. SEMENTES CRIOULAS, COLONIALIDADE ALIMENTAR E EROSÃO BIOCULTURAL.. In: Anais do simpósio internacional pensar e repensar a América Latina e do congresso internacional pensamento e pesquisa sobre a América Latina. Anais...Sao Paulo(SP) Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2024. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/pensar-e-repensar/819000-SEMENTES-CRIOULAS-COLONIALIDADE-ALIMENTAR-E-EROSAO-BIOCULTURAL. Acesso em: 12/07/2025

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