PELOS CAMINHOS E SENTIDOS DE UMA EXPERIÊNCIA PAISAGEIRA NA CIDADE DE MONTRÉAL

Publicado em - ISBN: 978-65-272-1352-9

Título do Trabalho
PELOS CAMINHOS E SENTIDOS DE UMA EXPERIÊNCIA PAISAGEIRA NA CIDADE DE MONTRÉAL
Autores
  • Janise Bruno Dias
Modalidade
Resumo Expandido
Área temática
Representações da cidade e do urbano
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/ix_neer/901778-pelos-caminhos-e-sentidos-de-uma-experiencia-paisageira-na-cidade-de-montreal
ISBN
978-65-272-1352-9
Palavras-Chave
Experiência, pensamento-paisagem, paisagem urbana
Resumo
1.Introdução Entre maio e dezembro de 2023 estive vivenciando um estágio pós doutoral  na Universidade de Montréal, CA, na Cátedra da Unesco de Paisagem. O objetivo da pesquisa foi escavar a paisagem da agricultura urbana  na Ville de Montréal, interesses de pesquisa na UFMG, Brasil. Este texto parte desse processo da pesquisa, procura apresentar reflexões iniciais teórico-metodológicas que tenho feito sobre a “experiência paisageira”. Tenho como cenário a pesquisa que vivenciei na cidade de Montréal, na busca por compreender a agricultura urbana e periurbana que se revela pulsante, sobretudo as estações estivais na cidade. Para isso, além de buscar a produção de Augustin Berque (2016 em Marandola, 2018) sobre o “pensamento-paisageiro e o pensamento-paisagem” busquei dialogar com outros autores da geografia humanista e fenomenológica, no intuito de suportar minhas opções metodológicas. Aqui discuto como a experiência geográfica  “paisageira” acontece e revela - faz conhecer - a paisagem urbana através da “travessia” pela cidade, da forma como nos apresenta Jean-Marc Besse. É uma reflexão inicial que traz luz à compreensão da construção do conhecimento geográfico a partir da experiência do mundo. 2.Da vertigem a experiência paisageira  Nos últimos cinco anos já estive várias vezes em Montréal. Meu olhar de pesquisadora não deixou escapar a paisagem e sobretudo as mudanças, em especial as sazonais e que acontecem tão rapidamente. Numa espécie de “vertigem”( Dardel, 2011) “paisageira” des-cobri que os jardins urbanos e até a agricultura periurbana enfeitavam a paisagem nesse período. A cultura de jardins e jardineiros em Montréal remonta há muitos anos, desde a colonização. Questionei se haviam políticas que fomentam essas práticas, quem seriam esses atores, e como era possível acessar esses espaços?  E decidi descortinar a paisagem da agricultura urbana (AU) em Montreal, no final da primavera de 2023.  Não sabia o que iria encontrar, mas queria escavar a paisagem e os territórios da agricultura urbana em Montréal. Para isso, resolvi assumir o que considerei uma postura fenomenológica (Husserl, 1986). Deixei que o fenômeno se revelasse pra mim, pois, de acordo com Holzer, o estudo feito através do pensamento fenomenológico “ (...) procura levantar as experiências concretas do homem e encontrar nessas experiências uma orientação que não as limite a uma simples sucessão. Ela ( a fenomenologia - grifo meu) não se atém a estudar as experiências do conhecimento, ou da vida, tais como se apresentam na história. Sua tarefa é de: "analisar as vivências intencionais da consciência para perceber como aí se produz o sentido dos fenômenos, o sentido do fenômeno global que se chama mundo" (Dartigues, 1973, 30 conforme Holzer 1997).” Ele se refere ao princípio da intencionalidade que inclui o mundo na consciência caracterizando sua correlação entre o sujeito e o objeto, este último não se configura como um único objeto, ao invés disso, no mundo inteiro, o que significa o “ser-envolvido-no-mundo”. A intencionalidade torna possível a “redução fenomenológica” que (grifo meu) “(...) nos remete às experiências e ao mundo originais, sem considerar as teorias que lhe foram acrescentadas pelas ciências.”( 1997, p.78) Inspirada na experiência de Lemos e Dantas (2020 p. 246) para os quais: “Os citadinos em suas trajetórias cotidianas criam suas próprias paradas para registrar fragmentos das cenas urbanas. No ir e vir diário percebem as diferentes dimensões das paisagens, seja a pé ou no uso do transporte urbano. Nos percursos múltiplas trajetórias coexistem no espaço (Massey, 2006) e se entrecruzam pelas ruas. O ato de se mover e o ato de ver unem-se: o espaço da cidade torna-se o espaço da vida.” Caminhei pela cidade Montréal e vivenciei a chegada da estação estival deixando acontecer nessa travessia, no espaço da vida citadina, a paisagem revelada em misturas, cores, cheiros, gostos, hábitos e afetividades que des-cortinam modos de vida e se constituem na realidade geográfica. (...) “As realidades geográficas representam um símbolo da alma que não tem nada a ver com um saber, mas que a Ciência retoma posteriormente como um projeto novo. O que o homem encontra, assim, na Terra é uma “feição”, um certo acolhimento.” (Dardel, 2011 p. 30,) A experiência dessa realidade geográfica despertou o pensamento-paisageiro (Berque, 2016 em Marandola, 2018 p. 56) _ “como a relação íntima existente entre o homem e a Terra, dessa relação se revela a paisagem sendo transformada e transformando o homem “- e uma curiosidade intrépida de vivenciar as essências daquele mundo montrealense. Como nos fala Dardel (...) “Pode haver uma “vertigem geográfica” o homem , diante da revelação de certas paisagens terrestres, se sente esmagado pelo excesso, pela superabundância” (2011 p. 30, ). Vivenciar o cotidiano dessa cidade durante oito meses que pude andar por ruas, avenidas, parques, jardins e canteiros e vivenciar as experiências que se abriam para mim, me revelou diversas paisagem sazonais e citadinas que se entrelaçam com as minhas experiências e mundos originais. Mas como decifrar a - minha - “experiência paisageira” urbana em Montréal da forma como se apresentou? As reflexões iniciais apresento a seguir. 3.As sensações e os sentidos da experiência paisageira O exercício de caminhar sozinha pelos bairros - “quartiers” - floridos e verdejantes me tocou e fez aflorar meus lugares escondidos. Muitas das vezes que visitei os jardins comunitários estavam “vazios” de pessoas, mas cheios de vida. Expressavam a discrição dos cidadãos montrealenses. Mas vi famílias inteiras chegarem ao final da tarde para cuidar juntos do seu canteiro, também pessoas idosas solitariamente a manejar seu jardim. Cada um tinha uma razão pra fazer daquele canteiro um pedaço da sua vida. Pareceu-me que uma razão unia todos, o gosto de tocar a “terra”. Num lugar onde essa - a terra - se cobre do manto branco de neve por cerca de oito meses, e adormece, como para se recuperar para a próxima estação. “A experiência de cada sujeito revela as significações atribuídas e as histórias que enredam os lugares intimamente. Assim a interpretação acontece não a distância como prevê a ciência, e sim em proximidade.”Lemos e Dantas (2020 p. 246) Cotidianamente buscar os encontros. “O cotidiano revela o devir(...)” afirmaram Lemos e Dantas (2020 p. 246). Encontros com pessoas, mas encontro com as formas da cidade, com sua dinâmica diária, com o ir e vir, com as cores que se divergem das cidades da minha experiência pretérita. Observar que nos jardins o ritmo de vida muda, parece ser mais lento, uma velocidade do sentir, do afeto, do prazer, do pensar sobre. “A experiência de cada sujeito revela as significações atribuídas e as histórias que enredam os lugares intimamente.Os signos, códigos e significados se relacionam ao que seexpõe, para compreendê-los é preciso abrir-se aos modos pelos quais as pessoas vivem a mobilidade na efemeridade doir e vir cotidiano.”Lemos e Dantas (2020 p. 246) É “a experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm (Larrosa, 2016 p. 25 )”.  Assim, a experiência da paisagem deve ser entendida como uma “saída no real, mais precisamente uma exposição à realidade geográfica. Esse acontecimento é o encontro entre o corpo-mundo que o envolve, experimentado com todos os sentidos. A experiência paisagística é uma experiência que remete o homem a uma maneira de estar no mundo e ser “atravessado” por ele “ A paisagem é o nome dado a essa presença do corpo e ao fato dele ser afetado, tocado fisicamente pelo mundo ao redor, suas texturas, estruturas e espacialidades: há nisso algo como um acontecimento. A paisagem é primeiro vivenciada (...) só “depois de vivida a paisagem, talvez possa ser falada, a palavra buscando prolongar a vida, (...) o vivo que faz desta uma experiência.(Besse, 2014 p. 47-48)“. Estar na paisagem não é estar diante dela, é estar envolto por ela, na presença de todos os horizontes da paisagem. Besse (2014 p.51) . Para Berque, “[...] o pensamento paisageiro é primordial em relação ao pensamento da paisagem. Este é o sentido profundo da paisagem”( 2016 p. 59 citado por Marandola, 2018, p.146). Berque (2023) enfatiza na sua discussão a “mediance” dessa relação, criticando o dualismo da relação sujeito e objeto na modernidade. E vai buscar nas culturas do oriente esse sentimento e pensamento paisageiro que para ele devemos resgatar. Esse pensamento paisageiro aparece como uma pré reflexão da paisagem, a noção de paisagem é pré conceitual à paisagem e expressa o sentir e o pensar a paisagem a partir dessa mediação da relação do ser-no-mundo. O caminhar se constitui numa experiência da paisagem ou melhor numa experiência paisageira. O caminhar não é apenas estar no mundo, mas assumir uma forma interrogativa. É questionar o estado do mundo, é interpelá-lo naquilo que pode oferecer aos homens que nele estão. (Besse, 2014) Ela nos aproxima do pensamento paisageiro, e da essência do pensamento-paisagem, o que nos possibilita aclarar a essência da realidade humana, na Terra (Berque, 2023). Nesse sentido, a experiência do caminhar e viver a paisagem da agricultura urbana, esverdeada, das estações estivais em Montreal, foram arrebatadoras e tornaram a profusão de sentimentos em pensar, possibilitando a transição do pensamento-paisageiro ao pensamento-paisagem. 4.Para novas travessias Muito instiga buscar lavrar estudos que trabalham a experiência geográfica, estas são reflexões iniciais nessa travessia e que tenho perseguido no meu fazer geográfico onde tenho trabalhado uma abordagem geográfica humanista.  Como Werther Holzer (2021) nos esclarece “a fenomenologia não é um método, mas uma maneira de pensar o mundo”. Já não é possível ( pra mim), um fazer geográfico sem a experiência geográfica, carregada de sua relação corpo-terra, comprometida com uma geografia das “paisagens encarnadas” - parafraseando De Paula (2015).  Há ainda muitos encontros e muitos “sentidos” a desbravar. 5. Referências bibliográficas Berque, A. (2023) O Pensamento-paisagem(trad. Vladimir Bartalini e Camila Gomes Sant´Anna), Ed. da Universidade de São Paulo, 1a edição, São Paulo. 141 p. Besse, J. M. (2014). Ver a terra: Seis ensaios sobre a paisagem e a geografia. (Trad. Vladimir Bartalini) São Paulo, Ed. Perspectiva 108 p. Dardel, E. (2011) O homem e a terra: natureza da realidade geográfica.(Trad.Werther Holzer). Perspectiva: São Paulo, . De Paula, F. C. (2016). Sobre geopoéticas e a condição corpo-Terra / About geopoetics and the body-Earth condition. Geograficidade, 5(Especial), 50-65. https://doi.org/10.22409/geograficidade2015.50.a12928 Holzer, W (1997). Uma discussão fenomenológica sobre os conceitos de paisagem e lugar,território e meio ambiente, Território, no 3, jul./dez 77-85 Husserl E.(1986) A ideia da Fenomenologia (trad.Artur Morão), Edições 70, Lisboa, Portugal 133 p. Lemos, F. S., & Dantas, E. M. (2020). Ver a cidade em movimento: fragmentos perceptivos de um olhar em movimento / Perceptive fragments of a moving look. Geograficidade, 10(Especial), 245-254. https://doi.org/10.22409/geograficidade2020.100.a38346 Marandola, H. L., & Oliveira, L. de. (2018). Origens da paisagem em Augustin Berque: pensamento paisageiro e pensamento da paisagem / Landscape origins in Augustin Berque: landscaping thought and landscape thinking. Geograficidade, 8(2), 139-148. https://doi.org/10.22409/geograficidade2018.82.a13140 Serpa, A. (2020). Lugar, paisagem e experiência / Place, landscape and experience. Geograficidade, 10(Especial), 99-105. https://doi.org/10.22409/geograficidade2020.100.a38410
Título do Evento
IX NEER
Cidade do Evento
Curitiba
Título dos Anais do Evento
Anais do Colóquio Nacional do NEER: Movimentos e devires, espaço e representações
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

DIAS, Janise Bruno. PELOS CAMINHOS E SENTIDOS DE UMA EXPERIÊNCIA PAISAGEIRA NA CIDADE DE MONTRÉAL.. In: . Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/ix_neer/901778-PELOS-CAMINHOS-E-SENTIDOS-DE-UMA-EXPERIENCIA-PAISAGEIRA-NA-CIDADE-DE-MONTREAL. Acesso em: 25/07/2025

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