“ASSIM COMO O MAR É IMENSO, ABUNDANTES SÃO AS BÊNÇÃOS DE MÃE IEMANJÁ”: FESTA DE IEMANJÁ NA PRAIA DO CASSINO/RS A PARTIR DA GEOGRAFIA DA RELIGIÃO

Publicado em - ISBN: 978-65-272-1352-9

Título do Trabalho
“ASSIM COMO O MAR É IMENSO, ABUNDANTES SÃO AS BÊNÇÃOS DE MÃE IEMANJÁ”: FESTA DE IEMANJÁ NA PRAIA DO CASSINO/RS A PARTIR DA GEOGRAFIA DA RELIGIÃO
Autores
  • Valdoir Guimarães Oliveira Junior
  • Juliana Cristina Franz
Modalidade
Resumo Expandido
Área temática
Religião e religiosidades
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/ix_neer/900222-assim-como-o-mar-e-imenso-abundantes-sao-as-bencaos-de-mae-iemanja--festa-de-iemanja-na-praia-do-cassinors-a-
ISBN
978-65-272-1352-9
Palavras-Chave
Espaço sagrado, Espacialidades, Religiosidade, Religiões afro-brasileiras, Rio Grande,
Resumo
Introdução A presente pesquisa toma como central a Geografia da Religião desenvolvida por Sylvio Fausto Gil Filho (2007, 2012) que afirma que o sagrado não pode ser compreendido exclusivamente pelo estudo dos objetos presentes no mundo material, pois é o ser humano quem define o sentido e o significado dos objetos como sagrados, ou seja, para o autor, os objetos não possuem sacralidade por si próprios, o que torna eles sagrados é o olhar de quem vê os objetos como sagrado. Diante do exposto, o presente trabalho tem como objetivo compreender as espacialidades produzidas no espaço da Festa de Iemanjá que ocorre na Praia do Cassino/RS. Para isso, investigou-se na Geografia da Religião perspectivas teóricas que possibilitam analisar a Festa de Iemanjá a partir de uma abordagem cultural, visando compreender as espacialidades produzidas durante o período da festividade que acontece na Praia do Cassino que está localizada no município do Rio Grande, no extremo sul do Rio Grande do Sul. A cidade do Rio Grande foi fundada em 1737, está localizada na desembocadura da laguna dos Patos, o município representa o primeiro marco lusitano nas terras rio-grandenses (Martins, 2022). As influências multiculturais da Nação (Batuque) estão presentes no território gaúcho desde o século XIX e da Umbanda desde a década de 1920. Entretanto, a celebração anual da Festa de Iemanjá na Praia do Cassino ocorre apenas a partir da década de 1960. Porém, existem registros de que antes desse período já existiam rituais e entregas de oferendas na praia, buscando homenagear a Rainha do Mar. Em 1975, a festa foi oficializada por um vereador da cidade, porém, somente em 1999 a partir da Lei 5.291/99 que a festa passou a fazer parte do calendário oficial de eventos do município do Rio Grande, posteriormente em 2008, foi reconhecida pela Lei estadual 12.988 como patrimônio cultural do Rio Grande do Sul (Camargo, Calloni 2012; Pereira, 2015). A estátua de Iemanjá, localizada no final da Avenida Rio Grande, no Bairro Cassino, foi esculpida pelo escultor rio-grandino Érico Gobbi, a estátua possui 2,10 metros de altura e pesa aproximadamente duas toneladas. De acordo com Camargo e Calloni (2012), ao perceber a euforia da população durante a Festa de Iemanjá de 1971, o escultor decidiu esculpir uma estátua em homenagem à divindade, finalizando a obra de arte em 1973. A estátua ficou em exposição em seu ateliê até a aquisição da estátua pelos umbandistas pelo valor de 35.000 cruzeiros. Cabe destacar que a principal motivação para realizar esse estudo é devido a grande importância da estátua de Iemanjá para a cidade do Rio Grande, uma vez que para além de sua materialidade, o monumento é um local de fé e comunhão, onde as religiões afro-brasileiras resgatam um símbolo da sua história e da sua cultura. Também enfatizo o meu interesse pessoal pelas questões religiosas a partir dos estudos geográficos, visto que tal abordagem tem muito a contribuir quando colocamos em ênfase a singularidade das conformações simbólicas dos grupos sociais que praticam determinadas religiões. Também vale reforçar que este trabalho faz parte da dissertação de mestrado do autor, que está sendo desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGGEO) da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Metodologia Para realização da pesquisa, utilizou-se da pesquisa bibliográfica de cunho qualitativo, buscando levantar fontes que discutem a Geografia da Religião e espacialidades. A partir da ótica da pesquisa qualitativa, foi feito um trabalho de campo durante os dias 1 e 2 de fevereiro de 2024, na Festa de Iemanjá na Praia do Cassino. Durante esse período, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os devotos, objetivando compreender as perspectivas e experiências dos devotos entrevistados sobre a festividade. Cassirer (2021) destaca que a realidade não é uma coisa singular e homogênea, sendo cada organismo um ser monádico, que possui um universo próprio devido as suas experiências únicas, portanto, se fez necessário, como proposta metodológica para a presente pesquisa, criar um roteiro de campo que buscasse associar as espacialidades estruturantes do espaço sagrado com a Festa de Iemanjá, reconhecendo a particularidade dos elementos presentes na celebração que se distinguem das práticas religiosas ocidentais, objetivando compreender as experiências únicas dos devotos. Resultados e discussão Entende-se que o ser humano religioso vive em um espaço sagrado, assim, o/a crente parte do sentido atribuído a este espaço e aos seus símbolos à sua experiência cotidiana, pois a partir dela, ele conforma seu mundo. Para Gil Filho (2007, 2012) o espaço sagrado possui um caráter material como estruturas de referência religiosa e um caráter simbólico, em razão de que essas mesmas estruturas possuem significados atribuídos pelos discursos religiosos de seus devotos. Desse modo, o espaço sagrado é constituído por estruturas espaço-temporais, tanto materiais quanto ideais, sendo nesse espaço sagrado onde “[...] a atividade simbólica modela o mundo em dimensões de experiências que realiza o ser. Sendo construtora de cosmovisões, a religião estrutura mundos de significados e organiza o ‘devir’" (Gil Filho, 2007, p.220). Assim, de acordo com Fernandes e Gil Filho (2011), as espacialidades que articulam o espaço sagrado podem ser destacadas em três níveis: espacialidade concreta das expressões religiosas; espacialidade das representações simbólicas; espacialidade do pensamento religioso. A espacialidade concreta das expressões religiosas concebe o nível da materialidade imediata, podendo ser representada pela paisagem religiosa ou pelo templo onde ocorrem os cultos e outros lugares sagrados. Desta forma, o espaço sagrado é compreendido como estrutural, já que o ser religioso define as próprias hierarquias reveladoras das práticas religiosas, enquanto o espaço profano é apenas funcional (Gil Filho, 2012). Neste caso, a estátua de Iemanjá, localizada em frente a Praia do Cassino se torna a principal referência como templo onde os devotos depositam suas oferendas enquanto cultuam a Orixá. Os devotos entrevistados destacaram a importância do monumento como principal local de reuniões e de entrega das oferendas, agradecimentos e pedidos, como citado por um entrevistado, “é um momento de experiência única e de conexão espiritual com o Orixá”. Durante a noite, a escultura é iluminada enquanto os devotos aguardam a chegada da procissão, aumentando de forma significativa a quantidade de oferendas e agrados ao redor da estátua, além de velas que ajudam a iluminar o espaço destinado às oferendas. Já na espacialidade das representações simbólicas, o espaço é apresentado no plano da linguagem, na medida em que as percepções religiosas são conformadas a partir da forma que a linguagem e a oralidade são espacializadas durante a prática religiosa afro-brasileira. Durante esse momento, a prática religiosa é configurada rumo ao processo de desenvolvimento das representações, sendo a linguagem responsável por desempenhar a função de conectar o mundo factual ao mundo simbólico. Neste âmbito, os objetos não adquirem significados por si mesmos, eles devem ser explicados a partir do significado que o sujeito atribui ao objeto, configurando um espaço de representações simbólicas, em que o espaço sagrado é forjado nas representações de um espaço das religiões, uma vez que durante o ato de realizar entregas/oferendas, cada sujeito tem sua forma de ofertar agrados, como destacado por um entrevistado, que afirmou que existem incontáveis possibilidades para as oferendas, sendo algumas para pedir algo para a divindade, outras para agradecer e etc. Para outro entrevistado, a oferenda tem o papel de “atrair a energia que está sendo cultuada", assim, espacializando o desejo e a prática religiosa. Por fim, a espacialidade do pensamento religioso é uma desconstrução do espaço das expressões empíricas, tornando-se um espaço das representações simbólicas, de acordo com Gil Filho (2007, p.219) “trata-se de um espaço propositivo e sintético que articula o plano sensível ao das representações galvanizada pelo conhecimento religioso”. Neste momento, o espaço sagrado incorpora a ideia unificadora do pensamento religioso e sua divindade, ultrapassando os ditames funcionais da linguagem e atingindo o plano da transcendência. Assim, compreende-se que a espacialidade dos textos sagrados e das tradições orais sagradas está presente nas práticas religiosas cotidianas e nas representações das mesmas, sendo uma ponte entre a espacialidade de expressão concreta e a espacialidade das representações simbólicas (Gil Filho, 2007; 2012). Nesse sentido, os devotos entrevistados deram destaque aos cantos e rezas proferidas durante a festividade, tanto ao redor da estátua quanto na beira do mar. Durante a primeira noite da festa, a procissão realizada é a parte mais importante para os devotos, sendo o momento em que os mesmos expressam sua fé e devoção a partir de cantos, toques de atabaques, exibição de bandeiras e vestimentas ao redor do carro que leva a Orixá na Avenida Rio Grande. Carros e caminhões decorados acompanham a Orixá ao som de sinos, cantos e rezas, carregando imagens e oferendas para o Orixá. Um dos entrevistados destacou que o momento de ir até a beira do mar para proferir sua oração para Iemanjá é o momento em que ele se sente mais conectado com a divindade durante o período da festividade, sendo um espaço que o devoto sente o retorno e a força da Rainha do Mar com um “chuá”, como destacado pelo mesmo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Assim, a partir do diálogo com os fiéis durante o trabalho de campo, foi possível perceber a importância da Festa de Iemanjá para os devotos, sendo um espaço de celebração e também um espaço onde a fé e a experiência fornecem sentido à vida. Para mais, a partir das espacialidades do sagrado, foi possível observar a articulação estrutural entre a espacialidade da expressão concreta e a espacialidade das representações, concebida a partir das práticas próprias de cada tradição religiosa, configurando uma experiência única para cada devoto em sua prática religiosa cotidiana. REFERÊNCIAS CAMARGO, T. G.; CALLONI, H. O sagrado e o profano presente na festa de Iemanjá: uma leitura possível de educabilidade ambiental. Rio Grande: FURG Revista Eletrônica Mestrado Educação Ambiental. v. 28, p. 344-356, jan. -jun., 2012 CASSIRER, E. Ensaio sobre o Homem: introdução a uma filosofia da cultura humana. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2021. (1ª ed. 1944). FERNANDES, D.; GIL FILHO, S. F. Geografia em Cassirer: perspectivas para Geografia da Religião. Revista Geo Textos. Salvador, v.07, nº02, dez, 2011 GIL FILHO, S.F. Geografia da Religião: reconstruções teóricas sob o idealismo crítico. In: KOZEL, S.; SILVA, J. da C.; GIL FILHO, S. F. (orgs.). Da Percepção e Cognição à Repretsentação: reconstruções teóricas da Geografia Cultural e Humanista. São Paulo: Terceira Margem; Curitiba, NEER, 2007. p. 207-222. GIL FILHO, S.F. Espaço Sagrado: estudos em Geografia da religião. Curitiba: InterSaberes, 2012. MARTINS, S.F. Cidade do Rio Grande: industrialização e urbanidade (1873-1990). Rio Grande, RS, Ed. da FURG, 2022. PEREIRA, R. A. Tributo a Iemanjá: festa religiosa na praia do Cassino – Rio Grande – RS – Brasil, Revista Geografar, Curitiba, v. 9, n° 2, p. 84-103, fev. 2015. ROSENDAHL, Z. Espaço & Religião: uma abordagem geográfica. Rio de Janeiro, UERJ, NEPEC, 1996.
Título do Evento
IX NEER
Cidade do Evento
Curitiba
Título dos Anais do Evento
Anais do Colóquio Nacional do NEER: Movimentos e devires, espaço e representações
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

JUNIOR, Valdoir Guimarães Oliveira; FRANZ, Juliana Cristina. “ASSIM COMO O MAR É IMENSO, ABUNDANTES SÃO AS BÊNÇÃOS DE MÃE IEMANJÁ”: FESTA DE IEMANJÁ NA PRAIA DO CASSINO/RS A PARTIR DA GEOGRAFIA DA RELIGIÃO.. In: . Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/ix_neer/900222-ASSIM-COMO-O-MAR-E-IMENSO-ABUNDANTES-SAO-AS-BENCAOS-DE-MAE-IEMANJA--FESTA-DE-IEMANJA-NA-PRAIA-DO-CASSINORS-A-. Acesso em: 10/07/2025

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