GEOGRAFIA VAISHNAVA: UM ESTUDO DE UMA GEOGRAFIA SAGRADA ATRAVÉS DA GEOGRAFIA DO SAGRADO.

Publicado em - ISBN: 978-65-272-1352-9

Título do Trabalho
GEOGRAFIA VAISHNAVA: UM ESTUDO DE UMA GEOGRAFIA SAGRADA ATRAVÉS DA GEOGRAFIA DO SAGRADO.
Autores
  • CAIO DE MORAES LOBO
Modalidade
Resumo Expandido
Área temática
Religião e religiosidades
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/ix_neer/868000-geografia-vaishnava--um-estudo-de-uma-geografia-sagrada-atraves-da-geografia-do-sagrado
ISBN
978-65-272-1352-9
Palavras-Chave
Geografia da Religião; Hare Krishna; Vaishnava; Tradição Védica; Hermenêutica espacial
Resumo
1 INTRODUÇÃO A humanidade não suporta a ausência de significado, seja do mundo ao seu redor, seja da própria existência. Por isso há a busca de significados, e quando não os encontra os. A religião é um dos modos dessa busca de sentido, de significação e de ressignificação. Através das “Formas Simbólicas” de Ernst Cassirer esta pesquisa se fundamenta para compreensão da espacialidade Vaishnava, adoradores de Vishnu, mais especificamente inseridos no Movimento Hare, inserido na Tradição Védica e suas particularidades geográficas de seu Lebenswelt (mundo de vida). O viés cassireriano, além da obra do próprio autor, advém das pesquisas do Profº Sylvio Fausto Gil Filho, especialista em Cassirer e na Geografia da religião. Para a interpretação deste “mundo” através dos textos sagrados da espacialidade do templo e ritos Vaishnava será utilizada a mimese hermenêutica de Paul Ricoeur. Apenas a interpretação textual acadêmica é incompleta pois não adentra o Umwelt (mundo próprio) Vaishnava, que somente a vivência fenomenológica pode perscrutar, ainda que imperfeitamente. É através de dialéticas que a hermenêutica de Ricoeur trabalha, como evento e significação, distanciamento e apropriação, semiótica e semântica, sentido e referência, etc. Pode-se acrescentar a dialética “sagrado e profano” de Mircea Eliade, mas não de modo absoluto como o proposto pelo autor, pois um espaço é sagrado em relação a outros espaços. Se há a geografia “profana”, que inclui tanto a geografia humana quanto a física, pode-se dizer que há uma “geografia sagrada” das religiões, com lugares sagrados, orientações espaciais específicas, cosmologia e descrição das paisagens além do mundo visível. Os Vaishnavas também têm seu modo específico de espacialização. A horizontalidade e a verticalidade é outra dialética utilizada, onde a horizontalidade é onde funda-se a unidade ekstática [fora de si mesma] da temporalidade e “o horizonte de toda a temporalidade determina aquilo na perspectiva de que o ente existindo faticamente, se abre de modo essencial.” (HEIDEGGER, 2015, p. 454). Para complementar essa horizontalidade do mundo fático com a verticalidade da hierarquização a pesquisa se baseia na metafísica de René Guénon, onde “a expansão horizontal corresponde [...] à indefinidade das modalidades possíveis de um mesmo estado de ser considerado integralmente, e a sobreposição vertical corresponde à série indefinida de estados do ser total” (GUÉNON, 2023, p. 29-30). Para analisar o espaço Vaishnava fez-se a distinção entre geografia horizontal, que se refere ao mundo humano e seu horizonte de percepção e cotidianidade, e geografia vertical, com a cosmologia e planos transcendentes. Apesar de muitos destes autores parecerem díspares entre si, na verdade tem em comum em participarem de um novo espírito antropológico: Coincidindo, ou não, com o que recentemente se chama o novo espírito antropológico, de Gaston Bachelard a Gilbert Durand, de Georges Gusdorf a Henri Corbin, e ainda passando por René Guénon e Raymond Abellio, mas sem dúvida tocando as perspectivas de Carl Gustav Jung, de Ernst Cassirer, Mircea Eliade, de Paul Ricoeur e de René Alleau, pretende-se descobrir o elemento não apenas mediador, mas a fonte originária, donde mito e razão derivariam, na dimensão simbólica. (DO CARMO SILVA, 1982, p.49-51) Além da pesquisa bibliográfica dos autores citados e literatura da ISKCON, foram feitas visitas aos templos para observação dos seus espaços e a narrativa dos adeptos. O mito aqui está como “história sagrada”, pois para os adeptos Hare Krishna os fatos narrados são realidades históricas divinas. Com isso se busca compreender as espacialidade desta tradição no contexto fenomenológico junto ao tradicional. 2 GEOGRAFIA VAISHNAVA A geografia emerge para os Vaishnava da necessidade de organizar o espaço para atender da melhor forma a Deidade seguindo preceitos védicos para dispor o ambiente de modo auspicioso e para conhecer os locais sagrados onde ocorreram as histórias de sua literatura. Uma "geografia metafísica" surge para compreensão cosmológica. 2.1 GEOGRAFIA “HORIZONTAL” Os Hare Krishna têm sete princípios básicos, sendo o quinto o que interessa aqui: “Erigir, para os membros e para a sociedade em geral, um local sagrado de passatempos transcendentais dedicado à personalidade de Krishna.” (ISKCON BAHIA, 2024). Este item mostra que deve haver lugares todos possa participarem dos passatempos transcendentais de Deus. Um local sagrado é onde se presta reverência a Deus, onde se pode cantar e até mesmo alimentar e banhar a Deidade. O altar é coração do templo, ali as Deidades são reverenciadas, sendo este um local de relacionamento com Deus. A estrutura do templo é sagrada, pois tudo aquilo que é utilizado para adoração de Krishna se torna sacro, seja instrumento musical, livro, utensílio ou o prédio do templo, então estes objetos devem ser tratados com reverência. O mesmo ocorre com o alimento lacto-vegetariano servido, a prasada, que segue preceitos védicos. Este alimento é distribuindo para a purificação de todos que quiserem se beneficiar dele. Os templos da ISKCON têm o programa “Alimentos para a Vida” para a distribuição de prasada, que busca alcançar e beneficiar as pessoas num raio de dez milhas (16,0934 km) a partir do templo. Ou seja, o templo é o centro de onde se irradia o sagrado, seja através dos objetos de culto ou do alimento distribuído. Toda história sagrada pressupõe locais sagrados, que no caso dos Hare Krishna há exemplos como a vila Mayapur na Bengala Ocidental, local de nascimento de Sri Caitanya Mahaprabhu, e as cidades de Mathura e Vrindavanan em Uttar Pradesh, onde Krishna passou infância e adolescência. Aqui o mito surge como a forma simbólica que dá base para a religião. Segundo Fernandes e Gil Filho (2011, p. 218-219), Cassirer questiona a visão de realidade material como absoluta, pois vivemos “mais no mundo dos símbolos do que no mundo concreto”, logo há um mundo simbólico do Vaishnava que pode parecer irracional dentro da forma simbólica da ciência, mas é congruente para a religião. A visão religiosa do mundo se desenvolve com a vivência, e aquilo que parece “irracional” dentro de uma visão ocidental é natural na vivência cotidiana do devoto, este é Unwelt: As experiências — e portanto as realidades — de dois organismos diferentes são incomensuráveis entre si. No mundo de uma môsca, diz Uexküll, só encontramos coisas de môscas”; no mundo de um ouriço do mar só encontramos “coisas de ouriços do mar”. (CASSIRER, 1977, p. 47-48). O mundo, sob perspectiva Vaishnava, tem espaço e tempo diferenciados. Um exemplo é a Ponte de Rama, banco de areia que conecta o litoral sul da Índia com o noroeste do Sri Lanka. Na geografia oficial é uma formação geológica natural, na geografia Vaishnava é uma ponte construída pelo arquiteto divino Visvakarma com auxílio de macacos para que Rama pudesse regatar sua esposa raptada pelo rei Ravana, fato ocorrido há milhões de anos atrás. O oceano permitiu que grandes pedras flutuassem e os macacos construíram a ponte, cobrindo dezenas de quilômetros até Lanka (VEDABASE.IO, 2024). Há a influência divina na construção do lugar sagrado dentro do plano horizontal, que advém do eixo vertical dos múltiplos estados do ser que se formam cosmologicamente. 2.2 GEOGRAFIA “VERTICAL” A cosmologia é parte da geografia vertical, pois se refere à planos existenciais e metafísicos superiores e inferiores ao mundo humano, formando camadas paralelas hierarquizadas. Loka Saksi Dasa [VALERA] (2022) explica essa hierarquia se baseando em fontes como o Srimad Bhagavatam e Upanishads. Entre os mundos superiores e inferiores está este mundo humano ao centro, lugar onde não há demasiado sofrimento nem prazeres em excesso para distrair a busca espiritual. Os mundos deste universo, em ordem decrescente, são: Mundos superiores: Satyaloka ou Brahmaloka - mundo de Brahma Tapoloka - mundo dos seres mais elevados Janaloka - mundo dos filhos de Brahma Maharloka - mundo dos santos Svargaloka - mundo celestial Bhuvarloka - atmosfera e espaço sideral Mundo central: Bhurlokah - planeta Terra Mundos inferiores: Atala - mundo do desejo sexual Vitala - mundo de Shiva Sutala - mundo do rei Bali Maharaja Talatala - mundo do demônio Danava Mahatala - mundo das serpentes monstruosas Rasatala - mundo de demônios Patala - mundo de serpentes demoníacas e tesouros escondidos Deve-se destacar que na cosmologia védica não há apenas este universo e sim infinitos que emanam de Krishna que também tem seu mundo próprio além de tempo e espaço. Este mundo é Vaikuntha, onde Krishna na forma de Vishnu reside, mas mais além deste mundo há Gokula, que é o planeta supremo onde reside Krishna e de lá emana de si toda a existência: O mundo (dhama) dEle [Krsna] que recebe o nome de Gokula é a morada suprema. Ele é o centro (verticilo) de um lótus com mil pétalas e é mantido por uma porção (amsha) da Sua energia espiritual conhecida como Ananta. (BRAHMA SAMHITA 5.2 apud VALERA, 2022, p. 12) Mas não somente lá está Krishna, pois está neste universo sem ser desse universo, como explica o Bhagavad Gita 6:5 K???a diz “embora [Eu] esteja em toda parte, não faço parte desta manifestação cósmica” (PRABHUPADA, 2015, p. 465). Krishna é o axis mundi, o centro deste e de todos os universos, sendo e estando o próprio Krishna também em todas as periferias. Considerações Finais A existência forma o eixo horizontal, ou seja, o mundo de vida. A verticalidade surge como essência que atravessa os planos existenciais, que para os Vaishnava é Krishna. O espaço é sagrado pela devoção, pois onde há devoção Krishna se mostra. Para os devotos, Krishna é o centro e a relação com Ele é direta e literal, e não simbólica/metafórica. Mas essa é apenas parte da discussão, pois os próximos trabalhos devem partir da hermenêutica védica, o Mimamsa, e verificar se esta hermenêutica pode auxiliar na interpretação de outras tradições. REFERÊNCIAS CASSIRER, Ernst. Antropologia Filosófica. Um ensaio sobre o homem, tradução de Vicente Felix de Queiroz, ed. Mestre Jou, São Paulo, 1977. DO CARMO SILVA, Carlos Henrique. Da natureza anfibológica do símbolo: a propósito do tema:«Mito, Símbolo e Razão». Didaskalia, v. 12, n. 1, p. 45-65, 1982. ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano: A Essência das Religiões. Tradução de Rogério Fernandes. 4. ed. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2018. FERNANDES, Dalvani; GIL FILHO, Sylvio Fausto. Geografia em Cassirer: perspectivas para a geografia da religião. GeoTextos, 2011. GUÉNON, René. O simbolismo da cruz. Tradução: Victor Bruno. 1. ed. São Paulo: Editora Bismillah, 2023. HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Tradução e apresentação de Marcia Sá Cavalcante Schuback. 10. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2015. Os Propósitos da ISKCON. ISKCON BAHIA. Disponível em: https://iskconbahia.com.br/quem-somos/os-propositos-da-iskcon/. Acesso em: 19 de fevereiro de 2024. PRABHUPADA, Abhaya Cara?aravinda Bhaktivedanta Svami. O Bhagavad Gita, como ele é. 5º edição. Editora: Book Trust The Bhaktivedanta, São Paulo. 2015. Ramayana. VEDABASE.IO. Disponível em:https://vedabase.io/en/library/rkd/3/3/. Acesso em 12 de junho de 2024. RICOEUR, Paul. Teoria da interpretação. Tradução: Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 2019. SB 5.24: The Subterranean Heavenly Planets. VEDABASE.IO. Disponível em: https://vedabase.io/en/library/sb/5/24/. Acesso em 12 de junho de 2024. VALERA, L. (Loka Saksi Dasa). Cosmologia Védica: A Divindade e Suas energias. Pindamonhangaba: Núcleo de Estudos Bhaktivedanta, 2022.
Título do Evento
IX NEER
Cidade do Evento
Curitiba
Título dos Anais do Evento
Anais do Colóquio Nacional do NEER: Movimentos e devires, espaço e representações
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

LOBO, CAIO DE MORAES. GEOGRAFIA VAISHNAVA: UM ESTUDO DE UMA GEOGRAFIA SAGRADA ATRAVÉS DA GEOGRAFIA DO SAGRADO... In: . Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/ix_neer/868000-GEOGRAFIA-VAISHNAVA--UM-ESTUDO-DE-UMA-GEOGRAFIA-SAGRADA-ATRAVES-DA-GEOGRAFIA-DO-SAGRADO. Acesso em: 07/07/2025

Trabalho

Even3 Publicacoes