CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO: UMA LEITURA FENOMENOLÓGICA DO PENSAMENTO FREIREANO

Publicado em 30/12/2020 - ISBN: 978-65-5941-071-2

Título do Trabalho
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO: UMA LEITURA FENOMENOLÓGICA DO PENSAMENTO FREIREANO
Autores
  • Everton Ferreira Dos Santos
Modalidade
Comunicação oral (Resumo expandido)
Área temática
Psicologia
Data de Publicação
30/12/2020
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/conigran2020/257768-construcao-do-conhecimento--uma-leitura-fenomenologica-do-pensamento-freireano
ISBN
978-65-5941-071-2
Palavras-Chave
Paulo Freire, Fenomenologia, Consciência, Criticidade, Educação.
Resumo
INTRODUÇÃO O objetivo do presente trabalho é desenvolver uma investigação sobre o tema da construção do conhecimento, por meio de uma leitura fenomenológica do pensamento freireano. Para tanto, pretendeu-se contextualizar as posições tanto do educador Paulo Freire, quanto da perspectiva filosófico-metodológica da fenomenologia, buscando uma aproximação destas áreas do conhecimento e a criação de inter-relações que possam contribuir para o debate acerca da educação. A proposta de ler Paulo Freire através de uma perspectiva fenomenológica é uma maneira de renovar pontos e saberes que mais do que nunca se fazem fundamentais, tanto para a educação quanto para a psicologia, como: a importância da cooperação entre indivíduos; a valorização da pluralidade cultural; a inserção popular no processo de transformação social;o acesso à educação de qualidade;e com isto repensar fenômenos que se impõem como realidade na contemporaneidade. A partir da obra de Paulo Freire, a discussão brasileira sobre a educação ganha notoriedade como algo que acompanha a evolução das pesquisas, da política, economia, tecnologia, desenvolvimento humano, etc. Em tempos de obscurantismo e retrocessos, a educação se torna fundamental para um futuro com mais igualdade e humanidade. O estudo teve como gênese uma aproximação entre a teoria pedagógica de Paulo Freire, de cunho reconhecidamente construtivista (FREIRE, 2017), em diálogo com as bases de fundamentação da fenomenologia, perspectivas teórico-epistemológicas diferentes, mas que a reflexão sobre estes pensamentos é importante para os avanços dos processos educacionais. Para tanto, esta pesquisa lançou mão de aportes teóricos de autores que se propuseram a repensar a educação estabelecida no modelo formal de aprendizagem, um deles, o fenomenólogo Paul Goodman. Buscou-se aqui evidenciar as relações estreitas entre as propostas para a educação feitas por Freire, e a visão fenomenológica, em uma perspectiva ácrata e verdadeiramente libertária, com vistas à compreensão ética, crítica e política da educação. Como proposta pedagógica, objetivando conscientizar o educando por meio da criticidade em relação aos dados da realidade, destacando o processo dialógico da construção dos saberes que constituem o pensamento autônomo e a atuação criativa do sujeito em seu meio sociocultural. A pesquisa bibliográfica de uma parte da obra de Paulo Freire foi feita a partir da perspectiva fenomenológica, com o fim de trazer um novo olhar ao seu pensamento, e reiterar sua importância no âmbito educacional. O objeto de estudo é a construção do conhecimento, destacando a ideia de comunhão no processo de aprender, assim como a importância da política, cultura, história e de modo geral, o contexto em que os indivíduos se constroem; como foi defendido por Paulo Freire (2014, p. 95), “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”. Para que fosse possível desenvolver tal compreensão, foi importante dissertar sobre como Freire desenvolveu sua práxis, quais as teorias psicológicas serão utilizadas para fazer esta leitura, destacar os pontos convergentes entre as áreas de conhecimento, e por fim, descrever como o conhecimento é construído, em uma nova perspectiva que contribua para o debate sobre educação. Utilizou-se para a leitura do pensamento freireano a filosofia e o método fenomenológico, que consiste na descrição do fenômeno tal como ele se apresenta à consciência, expondo a realidade imediata minimizando preconcepções subjetivas do sujeito que a descreve. Diante da pesquisa bibliográfica sobre a obra de Paulo Freire, em específico no seu aspecto educacional, o método fenomenológico se coloca como base de leitura da experiência para o desenvolvimento de uma proposta dialógica, tecendo observações e críticas acerca da educação formal. E assim, tornar possível o início de uma nova concepção de educação libertadora, capaz de fazer frente aos desafios contemporâneos. DESVELANDO A PEDAGOGIA FREIREANA: UMA LEITURA FENOMENOLÓGICA Conforme já exposto, a pedagogia de Paulo Freire possui um caráter transformador, onde o indivíduo e grupos conscientes de sua realidade agem sobre ela para transformá-la. Porém, antes de tratarmos dessa finalidade, devemos desnudar os processos fenomenológicos dados na construção desses conhecimentos; para isso, devemos nos voltar à unidade primordial deste processo: o indivíduo. O indivíduo constitui-se como uma unidade idiossincrática de experiências, um Eu transcendental que intenciona continuamente os objetos do mundo, assim, os objetos categoriais correspondem às sínteses constitutivas deste Eu, conforme Husserl (2019). Ainda que não diretamente, Paulo Freire (2014) se aproxima desta concepção quando afirma que não há indivíduos sem um mundo onde estabeleça correlações, tendo como ponto de partida o aqui e agora que constitui a situação onde está inserido. Este pensamento espaço-temporal do educador coincide com a filosofia fenomenológica na ideia do Eu transcendental, que na experiência imediata, de forma unificada, carrega todas as vivências da consciência interna do tempo (HUSSERL, 2019). Com isso, podemos inferir que as vivências anteriores do indivíduo, precedem e constituem a vivência atual, servindo como uma orientação intencional para uma nova possibilidade de criação apresentada na realidade objetiva. Neste mesmo raciocínio, o educador defende que a leitura do mundo precede a leitura da palavra, ou seja, o indivíduo somente dá sentido ao que lê após perceber o mundo a sua volta e significá-lo ativamente, tornando estes novos sentidos como partes constitutivas do seu ser. Paulo Freire e Weffort (1967) defendem a posição de o homem estar no mundo e travar relações permanentes com este mundo, resultando na criação e recriação independentemente de ser alfabetizado, não havendo ignorância ou sabedoria absolutas. É curioso também observar neste mesmo ensaio, a observação feita pelo educador acerca da captação do fenômeno, a qual podemos relacionar com a noção de imanência, aqui entendida como doação em pessoa(ou dado puro); a saber: “O homem, contudo, não capta o dado da realidade, o fenômeno, a situação problemática pura” (PAULO FREIRE; WEFFORT, 1967, p. 104-105). Reforçando o postulado fenomenológico transcendental, de identificação da unidade de vividos em um dado categorial. A partir destas exposições, podemos concluir que o ato da leitura da palavra ganha um sentido intencional, onde o indivíduo atribui às palavras geradoras um sentido transcendental, como no exemplo já descrito aqui da palavra tijolo, que ganha através desse processo constitutivo, um significado subjetivo atribuído por aquele que à visa. A partir disso, podemos referendar a práxis do educador Paulo Freire na alfabetização de adultos, nesta retomada da experiência subjetiva atuando a favor da aprendizagem. As palavras e temas geradores neste intento, sendo utilizadas como fio condutor para que o indivíduo possa implicar-se no processo educativo, como sujeito de atos, ativamente envolvido em seu vir a ser. Ainda na esfera individual, trazendo a leitura para o sistema self nas dinâmicas de contato, que de maneira sucinta podemos definir como uma reformulação da fenomenologia da consciência interna do tempo de Husserl e uma atualização da fenomenologia da awareness de Perls, Hefferline e Goodman, conforme Müller-Granzotto e Müller-Granzotto (2012). Portanto, a leitura da palavra passa pelos diferentes momentos do contato, desde o excitamento trazido por aquilo que se faz figura quando o indivíduo é exposto ao tema gerador (contatando), a abertura das possibilidades de criação de um novo saber (contato), na descodificação fonêmica e formação de novas palavras (pós-contato) e assimilação do novo repertório, apropriado pelo indivíduo (contato final). Feitas estas leituras acerca da construção do conhecimento na esfera individual, onde o educando se implica em seu processo, trazendo consigo seus saberes empíricos como meio de leitura do mundo e da palavra, podemos seguir desta unidade primordial para a unidade intersubjetiva (ou self para Paul Goodman), pensando então os círculos de cultura e o campo fenomenológico. De maneira introdutória a esta temática, se faz necessário aqui demarcar paralelos entre a compreensão fenomenológica da intersubjetividade postulada por Husserl, trazendo as noções de emparelhamento e percepção do outro, dialogando com a pedagogia de Paulo Freire e sua defesa da comunhão e amor como condições indispensáveis à práxis dialógica. Estas duas compreensões não são em si excludentes, porém, possuem nuances teóricas a serem exploradas para evitar distorções das obras destes dois grandes pensadores. Para Husserl (2019, p.153), cada indivíduo “[...] tem a priori o seu mundo, de aspecto talvez inteiramente outro. Mas ambos esses mundos são, então, necessariamente meros ‘ambientes’ dessas intersubjetividades e meros aspectos de um único mundo objetivo que lhes é comum”. O que significa dizer que o outro é para mim uma ocorrência da minha consciência, podendo eu encontrá-lo neste mundo objetivo que nos é comum. Isto constitui uma comunidade intersubjetiva, mediada por um mundo que abriga estas unidades intersubjetivas, em suas multiplicidades empíricas multáveis. A mediação do mundo também é algo afirmado por Paulo Freire (2014, p.96), “[...] ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo. Mediatizados pelos objetos cognoscíveis que, na prática ‘bancária’, são possuídos pelo educador que os descreve ou os deposita nos educandos passivos”. Podemos ver então uma relação muito próxima entre a comunidade intersubjetiva fenomenológica e a compreensão de comunhão de Paulo Freire, tendo isto em mente, a reflexão de ambos descreve com elegância o desnudamento das temáticas desenvolvidas nos Círculos de cultura. Husserl (2019) descreveu que o emparelhamento das unidades intersubjetivas ocorrendo em pares, onde há mais de duas destas unidades se constitui um grupo fenomenalmente unitário, assim, uma pluralidade. Na experiência dos círculos de cultura podemos verificar então como a práxis se dá de maneira efetiva; a forma com que Paulo Freire descreveu é facilmente confundida com um discurso puramente fenomenológico. Diante das leituras acerca do indivíduo e da esfera intersubjetiva contidas na proposta pedagógica de Paulo Freire, deve-se discutir os desdobramentos políticos e sociais de sua práxis, abordando os efeitos para além do campo educacional, onde os educandos seguem em sua busca por libertação. Isto porque a práxis dialógica é pressuposto da educação para a liberdade, e conscientes disso devemos nos voltar para a crítica da educação bancária, caracterizada pela narração exterior a ser incorporada pelos educandos, como um axioma, algo a ser repetido sem contestação. Tal concepção se choca com toda a compreensão fenomenologia de intencionalidade, a educação bancária se torna um instrumento de opressão que põe de lado as vivências dos educandos, tornando-os meros expectadores de um mundo que não lhes é apreendido. Esta verticalidade é desde muito cedo estimulada, iniciando pelo lar, segundo Paulo Freire (2014, p.209), “Esta influência do lar se alonga na experiência da escola. Nela, os educandos cedo descobrem que como no lar, para conquistar alguma satisfação, tem de adaptar-se aos preceitos verticalmente estabelecidos. E um destes preceitos é não pensar”. Goodman entende então, que a existência do outro não é em si um fator de opressão, porém, a lógica opressora é produzida por um modelo social que deposita nos indivíduos exigências identitárias, que devem ser introjetadas (BELMINO, 2017). O diálogo para Paulo Freire (2014) é, então, o rompimento desta lógica opressora, fundado no amor pelos homens e mulheres que assim como eu, compartilham o mesmo mundo objetivo, na prática dialógica o educador reconhece no outro a mesma humanidade que reconhece em si, despindo-se da visão de que a ignorância está no outro. Fenomenologicamente, a minha unidade intersubjetiva (ou self), reconhece no outro sua participação no mundo que nos é comum, como um aspecto inteiramente outro. Através da educação dialógica, que vai estimular a criticidade nos educandos, estes podem tomar consciência de sua condição de oprimido, apropriando-se de sua realidade por meio da leitura do mundo e da palavra, os homens e mulheres autonomamente tornam-se sujeitos ativos, não mais existindo passivamente, mas integrando-se à realidade como sujeitos de atos. Para o educador Paulo Freire educar-se é necessariamente politizar-se, a ação política é aqui entendida como uma forma de mobilização coletiva, de um grupo fenomenalmente unitário, que em sua gênese carrega experiências compartilhadas de maneira intersubjetiva. As massas populares não devem admirar o mundo como uma realidade imutável, mas denunciá-lo, questioná-lo, transformá-lo para humanizá-lo. REFERÊNCIAS FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 56. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014. FREIRE, Paulo(Org.). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 58. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2019. HUSSERL, Edmund. Meditações cartesianas: uma introdução à fenomenologia. São Paulo: Edipro, 2019. MÜLLER-GRANZOTTO, Marcos José; MÜLLER-GRANZOTTO, Rosane Lorena. Clínicas gestálticas: Sentido ético, político e antropológico da teoria do self. São Paulo: Summus Editorial, 2012. MÜLLER-GRANZOTTO, Marcos José; MÜLLER-GRANZOTTO, Rosane Lorena. Fenomenologia e Gestalt-terapia. 3. ed. São Paulo: Summus Editorial, 2016. PERLS, Frederick; HEFFERLINE, Ralph; GOODMAN, Paul. Gestalt-Terapia. 3. ed. São Paulo: Summus Editorial, 1997.
Título do Evento
CONIGRAN 2020 - Congresso Integrado UNIGRAN Capital
Cidade do Evento
Campo Grande
Título dos Anais do Evento
Anais do CONIGRAN 2020 - Congresso Integrado UNIGRAN Capital
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

SANTOS, Everton Ferreira Dos. CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO: UMA LEITURA FENOMENOLÓGICA DO PENSAMENTO FREIREANO.. In: Anais do CONIGRAN 2020 - Congresso Integrado UNIGRAN Capital. Anais...Campo Grande(MS) UNIGRAN Capital, 2020. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/conigran2020/257768-CONSTRUCAO-DO-CONHECIMENTO--UMA-LEITURA-FENOMENOLOGICA-DO-PENSAMENTO-FREIREANO. Acesso em: 03/06/2025

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