O Teatro do Oprimido é um método pedagógico, social, cultural, político, artístico e terapêutico criado por Augusto Boal (1931-2009), importante teatrólogo, diretor, dramaturgo e ensaísta carioca. Compreendendo a arte como uma vocação humana, este fazer teatral propõe o protagonismo dos sujeitos no processo coletivo de conhecimento da realidade, e, sobretudo, de sua transformação. Na atualidade, o Teatro do Oprimido tem se espraiado sobre as diversas faces do trabalho social e ambiental, com experiências que buscam articular saberes e práticas, co/m vistas à construção de uma sociedade justa, democrática e sustentável.
A filosofia do Bem Viver emerge de diversas culturas originárias da América Latina. A constituição de países como a Bolívia e o Equador integram o Bem Viver a partir de princípios de vida de populações indígenas, partindo da compreensão que territórios historicamente discriminados são detentores de saberes que legitimam a construção de uma ordem civilizatória, defendendo que a gestão social desses lugares deve ser protagonizada por populações também historicamente discriminadas. Segundo Rosane Borges, pesquisadora e ativista negra brasileira, o Bem Viver ganha força nos últimos tempos como um programa que redefine os limites do desenvolvimento no mundo. Pensando na sociedade brasileira, observamos que as populações negras e indígenas não compõem os projetos de Nação, evidenciando a fragilidade democrática na exclusão dos saberes e fazeres das formas plurais de gestão dessas populações. Em detrimento a esta realidade, por exemplo, o Movimento de Mulheres Negras, que desde a Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo e Pelo Bem Viver (2015) vem apresentando propostas estratégicas nas mais diversas áreas do desenvolvimento, propondo a derrubada dos arranjos políticos que reforçam o imaginário racista que regula o Estado brasileiro. Através de uma Carta de convocação entregue a então Presidenta Dilma Rousseff, o Movimento de Mulheres Negras anuncia diversas reivindicações centrais para a construção de um novo pacto civilizatório, versando sobre direito à vida e à liberdade, promoção da igualdade racial, direito ao trabalho ao emprego e à proteção, direito à terra, território e moradia/direito à cidade, direito à seguridade social (saúde, assistência social e previdência social), direito à educação, direito à cultura, informação e à comunicação e a segurança pública. Cada um desses pilares elencam ações e medidas em prol da democracia e da justiça social para as pessoas brasileiras.
O pensamento de Boal é uma ideia-força para pensar o Bem Viver na Amazônia. Augusto Boal nos legou a efetivação do teatro como ágora pública, vinculado necessariamente à realidade, aos fatos concretos. Nessa ágora, em modo de ação cênica, sendo ela pedagógica, artística e/ou política, são postas e defendidas concepções de mundo que convocam ao exercício de acabar com opressões de pessoas sobre outras, de ideias sobre outras, de pessoas sobre a natureza, de sistemas sobre outros. Boal nos ensinou a condivisão do mundo, como coloca o filósofo Giorgio Agamben. Condividir o mundo é a compreensão emancipatória e crítica dos sujeitos do viver pleno em relação a si e às outras. Bem Viver como direito de cada pessoa e cada cultura em suas manifestações plenas do nascimento, morte, vestimentas, danças, cantos, performances, desenhos, saberes, rituais, relações econômicas, etc.
Formas de vida criam hábitos cognitivos de pensar, sentir, agir. Vivem-se modos de vida destrutivos da autoestima, individual e coletiva, das florestas, das águas, do ar, das riquezas, das artes, desiguais na ação da cidadania. Irmanadas, imaginação e razão, no Bem Viver e no Teatro do Oprimido, emerge a oportunidade de uma utopia crítica, a qual, como aponta Boaventura de Sousa Santos, é uma crítica radical à realidade presente e enseja outro mundo possível. Vincula-se a construir outra sociedade, sustentada em uma condivisão cidadã, em diversificação e aprendizado de contato respeitoso e reverente com a Natureza, com as pessoas, a partir de uma ecologia de saberes de povos culturais da Amazônia e outras formas de conhecimento. A ecologia de saberes e o Teatro do Oprimido se conectam na correlação de epistemologias, na validade de todos os tipos de saberes de transformação social, sem, todavia relativizá-los. Consistem o Teatro do Oprimido e a ecologia de saberes em um Bem Viver de igualdade de oportunidades e protagonismos.
A partir destes pressupostos e destes horizontes éticos, políticos, pedagógicos e epistêmicos, a realização das JITOU se justificam como um espaço de formação e de construção compartilhada de conhecimentos com vistas à construção de processos emancipatórios no sul e sudeste paraense.