QUESTÕES DE GÊNERO NA MEDICINA VETERINÁRIA

Publicado em 23/12/2021 - ISSN: 2316-266X

Título do Trabalho
QUESTÕES DE GÊNERO NA MEDICINA VETERINÁRIA
Autores
  • Micaella Bastos Sampaio Rodrigues
  • Laila Mayara Drebes
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 29 - Diálogos Interdisciplinares em Desenvolvimento e Gestão Territorial na Amazônia.
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
www.even3.com.br/Anais/xc22021/437108-QUESTOES-DE-GENERO-NA-MEDICINA-VETERINARIA
ISSN
2316-266X
Palavras-Chave
Médicas Veterinárias; Pará; Animais de produção; Desigualdade de gênero.
Resumo
Introdução Historicamente, as mulheres enfrentaram e ainda enfrentam obstáculos na atuação profissional no âmbito da Medicina Veterinária. No Brasil, a primeira médica veterinária mulher formou-se quase quinze anos após o primeiro médico veterinário homem. Além disso, até os dias atuais, muitas mulheres médicas veterinárias recebem salários menores em comparação aos seus pares do sexo masculino, além de serem desvalorizadas profissionalmente, principalmente na área de atuação de animais de grande porte. Apesar disso, a profissão de Medicina Veterinária vem passando por um processo de feminização, o que significa que o número de mulheres que ingressam na universidade buscando o curso de graduação vem aumentando e, consequentemente, o número de médicas veterinárias no mercado de trabalho também. Porém, a grande maioria dessas mulheres ingressam na Medicina Veterinária buscando uma carreira na clínica de pequenos animais. Esse cenário nos conduz a refletir sobre a situação das regiões caracterizadas por atividades agropecuárias e que, por isso, tornaram-se sede de cursos de graduação em Medicina Veterinária, como é o caso do município de Xinguara, no Pará, que oferta o curso de Medicina Veterinária por meio da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). A principal atividade agropecuária de Xinguara é a produção de gado de corte, sendo que o município é conhecido pelo título de “Capital do Boi Gordo”. A preponderância dessa atividade foi um dos fatores que conduziu à alocação do curso de Medicina Veterinária neste campus da Unifesspa. Todavia, as constatações de feminização da profissão de Medicina Veterinária e de dificuldade e falta de interesse das mulheres no campo de atuação dos animais de grande porte trazem à tona possíveis contradições entre o cenário ideal (formação de profissionais para atender as demandas da região) e o cenário real (desejos dos profissionais e obstáculos ao atendimento das demandas da região). Diante disso, o presente estudo teve como objetivo analisar as perspectivas dos graduandos/graduandas de Medicina Veterinária da Unifesspa quanto ao seu futuro profissional, atentando para possíveis desigualdades de gênero. Para atender o objetivo, o estudo contou com levantamento de dados documentais do curso de Medicina Veterinária da Unifesspa e foi complementado por meio de aplicação de questionários com os graduandos matriculados. O questionário foi aplicado em julho de 2021, por meio do Google Forms, momento em que o curso contava com 83 graduandos matriculados, dos quais 51 responderam à pesquisa, constituindo a amostra do presente estudo. Fundamentação teórica Compreende-se por relações de gênero, a forma de interação socioeconômica e cultural desenvolvida entre os sexos ao longo do tempo e do espaço. Trata-se de um fenômeno pautado na cultura do ser biológico condicionado às posições determinantes de dominadores e dominados nas sociedades, gerando desigualdades entre os sexos (GODOI, 2020). No âmbito de tais relações de gênero, o trabalho das mulheres tende a ser desvalorizado. Durante muito tempo, o paradigma sexista de divisão sexual do trabalho, impediu o desenvolvimento econômico, intelectual, pessoal e profissional das mulheres, que eram limitadas à esfera doméstica. Quando mais tarde as mulheres puderam acessar espaços de formação profissional e o mercado de trabalho, foram, e em muitas ocasiões continuam sendo, discriminadas, mal vistas e mal remuneradas (SCOCUGLIA; PINHEIRO, 2003). Entretanto, atualmente, a Medicina Veterinária, assim como outras profissões, apresenta taxas elevadas de participação feminina, pois observa-se uma crescente expansão das mulheres em campos tradicionalmente ocupados por homens. (LAWRENCE, 1997). A Medicina Veterinária passou de uma tradição de exclusão com base no gênero para uma tradição de inclusão, de maneira mais rápida do que qualquer outra dentre as profissões tradicionais. No Brasil, segundo os dados do Conselho Federal de Medicina Veterinária do ano de 2020, dos 148.037 médicos veterinários atuantes no sistema do conselho, 53% (79.858) são mulheres. Tal dado demonstra o processo de feminização dessa profissão, que durante muito tempo foi caracterizada por um perfil profissional constituído por homens de origem rural que reproduziam o imaginário do “médico veterinário de animais de grande porte” que precisava realizar o trato bruto com os animais (muito em virtude da falta de tecnologias na época), o que exigia esforço físico e, supostamente, tornava as mulheres inaptas para a profissão, pela falta de força e pelo excesso de compaixão com os animais. Esse imaginário começa a ser transformado em meados do século XX, devido aos avanços feministas na sociedade e a mudanças no cerne da própria Medicina Veterinária, como a ascensão da preocupação com o bem-estar dos animais. Com isso, atributos considerados femininos, como afetividade, atenção, cuidado e sensibilidade passaram a ser valorizados, aumentando o número de mulheres na profissão, mas conduzindo-as principalmente para a atuação com os pequenos animais (IRVINE; VERMILYA, 2010). Percebe-se que os estereótipos de gênero que permeiam a profissão, vinculando os homens às noções de brutalidade e força e as mulheres às noções de cuidado e fragilidade, são responsáveis pela construção de uma divisão sexual do trabalho que ainda se faz presente no mercado de atuação da Medicina Veterinária, que tendendo a conduzir os homens para os animais de grande porte e as mulheres para os animais de pequeno porte (RODRIGUES et al., 2020). Ademais, no Brasil, as médicas veterinárias enfrentam diversos obstáculos no trabalho com animais de produção. Dados de estudo realizado em Goiás, indicam que 78% dos agricultores preferem homens para atenderem suas propriedades rurais (FREITAS et al., 2014). Para as médicas veterinárias que, apesar dos estereótipos de gênero, optam por romper com a divisão sexual do trabalho, vários desafios se colocam, como provarem que são tão competentes como os pares masculinos e a desvinculação com atributos femininos não valorizados no trabalho com animais de produção (IRVINE; VERMILYA, 2010). 2. Resultados alcançados No âmbito do curso de Medicina Veterinária da Unifesspa, dos 81 discentes matriculados em julho de 2021, 33,3% (27) eram do sexo masculino e 66,7% (54) do sexo feminino. Referente à amostra, do presente estudo, dos 51 respondentes do questionário, 66,7% (34) eram do sexo feminino e 33,3% (17) eram do sexo masculino. A amplitude de idade apresentada pelos respondentes variou de 18 a 36 anos. Das mulheres respondentes, 76,5% (26) delas responderam que entre os motivos que as levaram a cursar Medicina Veterinária estava o fato de elas amarem os animais. Em contrapartida, entre os homens respondentes, apenas 23,5% (4) afirmaram ter escolhido o curso de Medicina Veterinária tendo como motivação o amor pelos animais. Esse dado fornece indícios sobre como o ideário de carinho/cuidado ainda é atravessado por percepções sexistas no âmbito da Medicina Veterinária, compreendido pelos próprios profissionais como uma atribuição feminina importante para o âmbito dos animais de companhia. Nesse sentido, dos discentes participantes da pesquisa, 68,6% (35) afirmaram acreditar que as mulheres que escolhem trabalhar com animais de produção podem não ser respeitadas por seus clientes e 72,5% (37) afirmaram acreditar, inclusive, que os produtores agropecuários fazem distinção entre profissionais homens e mulheres para o atendimento de animais de produção. Além disso, 92,2% (47) dos graduandos de Medicina Veterinária que participaram do estudo concordaram que, mesmo atualmente, ainda são experienciadas desigualdades de gênero na profissão, principalmente pelas mulheres. A propósito, 76,5% (39) dos participantes concordaram com a assertiva de que mulheres precisam se esforçar mais do que seus pares do sexo masculino para serem respeitas e reconhecidas no exercício da Medicina Veterinária. Em somatório, 47,1% (16) das mulheres que responderam a pesquisa identificaram-se como vítimas de assédio e discriminação no âmbito da graduação em Medicina Veterinária em diversas situações, tanto no âmbito de atividades curriculares como de atividades afins. Conclusões O estudo indica que o aumento do número de mulheres médicas veterinárias não necessariamente indica a superação de condições de desigualdade de gênero. Para o caso do curso de Medicina Veterinária da Unifesspa, em Xinguara/PA, os dados são importantes para provocar a reflexão sobre o futuro profissional das mulheres formadas nesta região que é fortemente caracterizada pela pecuária de corte e que tem colocado situações discriminatórias aos discentes no decorrer de seu percurso formativo. Destaca-se, ainda, que os dados apontam para a importância da educação para a igualdade de gênero na sociedade como um todo. Referências FREITAS, S. L. R. et al. Diferenças entre os gêneros na assistência técnica e extensão rural realizada por médicos veterinários: paradigma ou preconceito. Ceres, v. 61, n. 1, p. 1-8, 2014. GODOI, W W. G. Relações de gênero na Medicina Veterinária: da inserção à atual participação da mulher no mercado de trabalho: revisão de literatura. 28f. Trabalho de Conclusão de Curso (Medicina Veterinária), Universidade Federal da Paraíba, Areia, 2020. IRVINE, L.; VERMILYA, J. R. Gender work in a feminized profession: the case of Veterinary Medicine. Gender & Society, v. 24, n. 1, p. 56-82, 2010. LAWRENCE, E. A. A woman veterinary student in the fifties: the view from the approaching millenium. Anthrozoös, v. 10, n. 4, p. 160-169, 1997. RODRIGUES, M. B. S. et al. A concentração das médicas veterinárias no trabalho com pequenos animais: um olhar de gênero. In: JORNADA ACADÊMICA INTEGRADA, 35., 2020, Santa Maria/RS. Anais... Santa Maria/RS: Universidade Federal de Santa Maria, 2020. SCOCUGLIA, A. C.; PINHEIRO, A. C. F. Educação e História no Brasil Contemporâneo. João Pessoa: UFPB, 2003.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital
DOI
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Como citar

RODRIGUES, Micaella Bastos Sampaio; DREBES, Laila Mayara. QUESTÕES DE GÊNERO NA MEDICINA VETERINÁRIA.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/437108-QUESTOES-DE-GENERO-NA-MEDICINA-VETERINARIA. Acesso em: 19/04/2024

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