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Apresentação
Quais
histórias conhecemos d(e)a África?
A palavra ÁFRICA
possui até o momento uma origem difícil de elucidar. Foi imposta a partir dos
romanos sob a forma AFRICA, que sucedeu ao termo de origem grega ou egípcia
Lybia, país dos Lebu ou Lubin do Gênesis. Após ter designado o litoral norte
-africano, a palavra África passou a aplicar -se ao conjunto do continente,
desde o fim do século I antes da Era Cristã. Mas qual é a origem primeira do
nome? Começando pelas mais plausíveis, pode-se dar as seguintes versões: A
palavra África teria vindo do nome de um povo (berbere) situado ao sul de
Cartago: os Afrig. De onde Afriga ou Africa para designar a região dos Afrig.
Outra etimologia da palavra África é retirada
de dois termos fenícios, um dos quais significa espiga, símbolo da fertilidade
dessa região, e o outro, Pharikia, região das frutas. A palavra África seria derivada do latim
aprica (ensolarado) ou do grego apriké (isento de frio). Outra origem poderia ser
a raiz fenícia faraga, que exprime a ideia de separação, de diáspora.
Enfatizemos que essa mesma raiz é encontrada em certas línguas africanas
(bambara). Em sânscrito e hindi, a raiz apara ou africa designa o que, no plano
geográfico, está situado “depois”, ou seja, o Ocidente. A África é um
continente ocidental. Uma tradição histórica retomada por Leão, o Africano, diz
que um chefe iemenita chamado Africus teria invadido a África do Norte no
segundo milênio antes da Era Cristã e fundado uma cidade chamada Afrikyah. Mas
é provável que o termo árabe Afriqiyah seja a transliteração árabe da palavra
África. Chegou-se mesmo a dizer que Afer era neto de Abraão e companheiro de
Hércules!
(Joseph Ki
-Zerbo-coordenador do volume “História da
África”)
Vimos com alegria e satisfação anunciar as/aos prezadas/es/os participantes e demais leitoras e leitores, os Anais do evento “Quais histórias conhecemos da África”? celebrado entre os dias 20 e 22 de novembro de 2023 na Universidade Federal do Piauí- Campus Amílcar Ferreira Sobral UFP/CAFS, cidade de Floriano, no estado do Piauí. A primeira edição do evento contou com a submissão de 26 resumos e 1 relato de experiência, aprovados.
Desse modo, iniciamos com curiosidade sobre a palavra África,
origem, etmologia(s), semânticas assumidas historicamente. Daí, visitando o volume
“História da África” pinçamos a epígrafe acima, com o objetivo de continuarmos
buscando expandir nossas curiosidades e questionarmos sobre o já dito. Assim, podemos
dizer que apesar dos apagamentos históricos de África nos portulanos mapas e os
mapas-múndi, hoje não podemos negar as histórias de África em nós. Somos
ontologicamente (re)existentes e ao mesmo tempo gnosiologicamente desobedientes
epistemologicamente. Há muitos séculos estamos praticando desobediências para
produzir as nossas existências, por meio das nossas descendências africanas da
diáspora. Estamos produzindo saberes-conhecimentos, apesar do racismo
cientifico e suas implicações atuais. Apesar das estatísticas de genocídio da
nossa população afrodescendente[1],
maioria das/os brasileiras/os, nós insistimos com Conceição Evaristo dizendo “A
gente combinamos de não morrer”[2]. É
inclusive uma exigência imperativa, a se somar a tantas outras, como a
Outra exigência
imperativa é de que a história (e a cultura) da África devem pelo menos ser
vistas de dentro, não sendo medidas por réguas de valores estranhos... Mas
essas conexões têm que ser analisadas nos termos de trocas mútuas, e
influências multilaterais em que algo seja ouvido da contribuição africana para
o desenvolvimento da espécie humana.[3]
Os trabalhos que se reúnem aqui nos Anais do evento, nos
convidam a enunciarmos outras histórias, memórias e narrativas de África que há
em nós. Numa perspectiva de dentro da nossa problematização consciente da
formação nacional brasileira com a memória de África e não a memória do
outro-colonizador em nós. Convidam, os trabalhos aqui socializados, a
escavarmos num movimento de acesso às nossas memórias como algo do vivido, para
no mesmo gesto nos questionarmos: nós, afrodescendentes brasileiros, temos
consciência de sermos agentes da nossa própria história? Quais compreensões,
nós, no universo acadêmico elaboramos sobre a imensa riqueza ontológica,
epistemológica, tecnológica, cultural, linguística, artística, econômica, ética,
estética de África para o nosso continente América Latina, para nosso país
Brasil, Nordeste, Piauí e Floriano? Quais compreensões
temos/elaboramos/consideramos sobre o papel civilizatório que os povos
africanos da diáspora sobre nossa formação nacional brasileira?
Para nos questionarmos sobre “Quais histórias conhecemos da
África”? Seria interessante lembrarmos que a presença de cerca de 55
países, com suas múltiplas e numerosas etnias e línguas, que constituem o
continente africano, já nos provoca a problematizarmos as geografias
cartesianas de apagamentos e redução deste grande continente a um imaginário de
história única, que o reduz a país empobrecido, remete a doenças, guerras,
enfim. Com esse evento queremos contar outras narrativas de valorização
memorialística que faz com que afirmemos quais histórias de África há em nós.
Esse/Com esse compilado de trabalhos destes Anais, queremos
ainda oferecer observações que a pesquisadora Werneck (2010, p. 16) quando diz:
De
todo modo, ainda nos resta a tarefa inconclusa, ou pouca valorizada, de buscar
a voz própria. Refiro-me à busca de outras formas possíveis ou desejáveis de
expressão e representação do que fomos, do que poderíamos ter sido, do que
desejamos ser, antes e além do eurocentrismo e suas pressões simbolizadas pelo
racismo heterossexista, sua dominação econômica e seus ataques no plano
simbólico. Ainda que nos reconheçamos múltiplas, mutantes, inconclusas.
É dessa consciência de seres inconclusos que nos valemos para continuarmos redimensionando as nossas responsabilidades profissionais, que atuamos na formação institucional escolar de/com pessoas, que buscamos nesse evento nos lembrarmos das nossas éticas ao nos implicarmos nas mudanças possíveis. É por isso, que reconhecemos a escola básica e superior pública, onde mais nos concentramos enquanto crianças, adolescentes, jovens e adultos, como aparelho potencializador de operar a luta contra o epistemicídio. Assim nos lembra uma intelectual afrodescendente brasileira, Sueli Carneiro (2005, p. 97) sobre a potência da educação para o enfrentamento ao:
Processo
persistente de produção da indigência cultural: pela negação ao acesso à
educação... pela produção da inferiorização intelectual; pelos diferentes mecanismos
de deslegitimação do negro como portador e produtor de conhecimento e de
rebaixamento da capacidade cognitiva, pela carência material e/ou pelo
comprometimento da autoestima pelos processos de discriminação correntes no
processo educativo
Destarte, com esse alerta seguimos tentando fazer nesses
espaços-tempos de nossa atuação reconhecer o nosso poder-saber-ser criticamente
contra essas barbáries provocadas pelo racismo sistêmico.
Necessário lembrarmos ainda de como a arte nos provoca
enquanto dispositivo de poder-saber-ser numa sociedade racista. Em “Intertexto”
Bertolt Brecht (1898-1956)[4] escreve
Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.
Assim, com o poema queremos dizer que promover justiça racial
é nos importarmos com as narrativas afrodiaspóricas que constituem a nossa
formação nacional brasileira. Ainda com a arte, lembremos de Bob Marley com “Redempetion
song” (1979)[5]
quando produz um canto de libertação para nos ensinar sobre quais histórias
conhecemos de África que podem nos ensinar a contar outras histórias. No dia 20
de novembro (e todos os dias) talvez o poema se faça atual para pedirmos por
consciência brasileira, quando ainda nos negamos como um país racista. Enquanto
existir racismo, não podemos falar de democracia, de justiça social, econômica,
ambiental, por exemplo. O convite que eventos como esses faz é para seguirmos
cantando canções de redenção.
Redemption
Song
Old pirates, yes, they rob I Sold I to the merchant ships Minutes after they took I From the bottomless pit But my hand was made strong By the hand of the Almighty We forward in this Generation Triumphantly
Won't you help to sing These songs of freedom? 'Cause all I ever have Redemption songs Redemption songs
Emancipate yourselves from mental
slavery None but ourselves can free our minds Have no fear for atomic energy 'Cause none of them can stop the time How long shall they kill our prophets While we stand outside and look Some say it's just a part of it We've got to fulfill the book
|
Canção da Redenção
Velhos piratas, sim, me roubaram Me venderam para os navios mercantes Minutos depois de Me tirarem do poço sem fundo Mas minha mão foi feita de força Pela mão do Todo-Poderoso Seguimos nessa geração Triunfantemente
Não vai ajudar a cantar Essas canções de liberdade? Porque tudo que eu tive foram Canções de redenção Canções de redenção
Emancipem-se da escravidão mental Ninguém além de nós mesmos pode
libertar nossa mente Não tenha medo da energia atômica Porque nenhum deles pode parar o tempo Por quanto tempo vão matar nossos
profetas Enquanto ficamos parados e olhando É, alguns dizem que é só uma parte
disso Temos que completar o livro
|
A arte em suas várias linguagens serve de enunciação para nos
ensinar a valorização das nossas conquistas e dialogarmos problematizando sobre
os desafios. Assim, eventos como este afirmam em nós o desejo ético-humano de
cantarmos canção de liberdade-redenção em coro. Aqui as canções de
liberdade-redenção podem ser entendidas como os trabalhos reunidos nestes
Anais.
Dessa maneira, desejamos que
o conteúdo presente nestes Anais sirva ao debate aberto sobre a nossa
consciência brasileira em relação às questões provocadas/promovidas pelo
racismo, em sua lógica sistêmica; que o debate seja democrático e não
hegemônico para o desenvolvimento de um conhecimento antirracista, o qual
engenhe a valorização de nossas memórias, histórias, narrativas, como vozes
epistêmicas que (re)existem na produção das nossas cotidianidades. É com grande
satisfação que desejamos outras edições do evento “Quais histórias
conhecemos da África?” e desejamos uma leitura crítica a todas as pessoas.
Floriano, 20 de novembro de 2023.
Vicelma
Maria de Paula Barbosa Sousa
Gláucia
Silva Ferreira
Referências
BOAKARI, Francis Musa et al (orgs.). Educação,
gênero e afrodescendência: a dinâmica das lutas de mulheres na
transformação social. Curitiba, PR: CRV, 2015.
CARNEIRO, Aparecida Sueli. A construção do outro como
não-ser como fundamento do ser. Tese de doutorado em Filosofia da
Educação, USP. São Paulo, 2005.
EVARISTO, Conceição. A gente combinamos de não
morrer. In: EVARISTO, Conceição. Olhos D’Água. ––2.
ed. -- Rio de Janeiro, RJ :Pallas Míni, 2018. 124 p.
História geral da África, I: Metodologia e
pré-história da África / editado por Joseph Ki -Zerbo. – 2.ed. rev. – Brasília
: UNESCO, 2010.
WERNEK, Jurema. Nossos passos vêm de longe! Movimentos de
mulheres negras e estratégias políticas contra o sexismo e o racismo. In: Revista
da Associação Brasileira de Pesquisadoras/es negras/os (ABPNN). [S.l],
v.1, n.1, p. 07-17, jun. 2010. Disponível em < https://abpnrevista.org.br/site/article/view/303/281>. Acesso em 19 de novembro de 2023.
[1] Boakari
(2015, p. 18) “descendentes de africanas/os sulsaarianas/os (não
subsaarianas/os) em sua singularidade fenotípica, preponderante com as ricas
diversidades culturais, linguísticas, sociais e éticas destes povos”.
[2] Conto
A gente combinamos de não morrer, de Conceição Evaristo - pertencente ao livro
Olhos d'água.
[3] J. Ki-Zerbo,
História Geral da África, vol. I, p. LII. Presente na escrita da Apresentação
do volume, por r Vincent Defourny - Representante da UNESCO no Brasil; Fernando
Haddad - Ministro de Estado da Educação do Brasil.
[4] Disponível em < https://www2.unicentro.br/pet-letras/2017/03/29/intertexto-bertold-brecht-1898-1956/>. Acesso em 19 de novembro de
2023.
[5] Disponível em < https://www.vagalume.com.br/bob-marley/redemption-songs-traducao.html>. Acesso em 19 de novembro de
2023.
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Responsável
Alba Patricia Passos de Sousa
E-mail: alba2sousa@ufpi.edu.br
(89) 99906-4316
Lucas Pereira da Silva
lucaspereira1204@ufpi.edu.br
(89) 99457-9476
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