A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO NA RELAÇÃO PESQUISA, ASSISTÊNCIA TÉCNICA E AGRICULTORES NO CONTEXTO DA PECUÁRIA LEITEIRA FAMILIAR NO NOROESTE DE MINAS GERAIS

Ana Luiza Tauffer Caldas; José Humberto Valadares Xavier; Suênia Cibeli Ramos de Almeida; CARLOS EDUARDO SILVA SANTOS

Título do Trabalho

Autores

Ana Luiza Tauffer Caldas
José Humberto Valadares Xavier
Suênia Cibeli Ramos de Almeida
CARLOS EDUARDO SILVA SANTOS

Modalidade

Relato de Experiências - Resumo Expandido

Área temática

Tecnologia Social

Data de Publicação

17/03/2025

País da Publicação

Brasil

Idioma da Publicação

Português

Página do Trabalho

https://www.even3.com.br/anais/2o-sepets/995464-a-construcao-do-conhecimento-na-relacao-pesquisa-assistencia-tecnica-e-agricultores-no-contexto-da-pecuaria-leit

ISBN

978-65-272-1256-0

Palavras-Chave

metodologia participativa, pecuária leiteira familiar, adequação sociotécnica.

Resumo

1. Introdução O presente manuscrito objetiva apresentar metodologia de trabalho ancorada no conceito de tecnologia social (DAGNINO et al., 2004) envolvendo equipes de diferentes instituições, organizações de agricultores e agricultores familiares no contexto da pecuária leiteira familiar no Noroeste de Minas Gerais. Resultado das experiências de diferentes equipes da Embrapa e de outras instituições desde a década de 1980 em trabalhos com agricultura familiar, a principal motivação é colocar as instituições a serviço do desenvolvimento sustentável por meio da experimentação em escala real e em estreita colaboração com os agricultores (GASTAL et al., 1993; OLIVEIRA et al., 2009). Os princípios norteadores desse processo baseiam-se na realidade dos agricultores; no olhar sistêmico que reconhece os impactos interno e externo à propriedade e na interação e negociação na tomada de decisões. O trabalho é desenvolvido no contexto do programa Mais Leite Saudável (PMLS) do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) em conjunto com a Cooperativa Agropecuária do Vale do Paracatu (Coopervap), os agricultores familiares da bacia leiteira dos municípios de Cristalina (GO), Paracatu e Vazante (MG), compondo uma rede - 140 agricultores familiares, uma equipe de assistência técnica da cooperativa, pesquisadores da Embrapa Cerrados e professores e estudantes da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) - distribuída no território em 14 comunidades de agricultores familiares e 11 assentamentos da reforma agrária. Essa articulação de atores visa produzir conhecimento em várias frentes - desde a parcela de cultivo, a gestão do estabelecimento, às políticas/programas da cooperativa, as tecnologias geradas pela Embrapa e aos impactos das políticas públicas do setor leiteiro - para apoiar a tomada de decisões dos agricultores e influenciar as políticas públicas municipais, estaduais e federais. 2. O ambiente e seus desafios A região do Noroeste de Minas Gerais possui uma população de aproximadamente 400 mil pessoas, representando 2% da população total do Estado, em uma área que representa 11% da área total. A precipitação média anual oscila entre 1.200 e 1.500 mm, com as chuvas concentrando-se no período de outubro a março, sendo o trimestre mais chuvoso o de novembro a janeiro. A estação seca tem duração de cinco a seis meses (INMET, 2010) e se constitui em um importante aspecto do ambiente que orienta as estratégias na agricultura. Há uma diversidade de solos e de topografia que compõem a região (NAIME et al., 2014). A agropecuária é uma importante atividade econômica da região. Há um total de 22.146 estabelecimentos agropecuários, sendo que, 15.903 (72%) são familiares e 6.243 (28%) são não familiares. Os primeiros ocupam uma área de 783.276 ha (18%), enquanto os estabelecimentos não familiares ocupam 3.532.980 ha (82%) (IBGE, 2017). O uso do solo indica que as principais atividades exploradas pelos estabelecimentos são as lavouras temporárias – destaque para soja (53%) e milho (21,3%) - e a pecuária. Na pecuária, cerca de 83% dos estabelecimentos agropecuários possuem bovinos e um dos setores mais importantes é a de produção de leite. De acordo com dados do IBGE (2017, 2022), as agroindústrias de laticínios são as que aparecem em maior número - produzindo queijo, manteiga, creme de leite, requeijão, entre outros - seguidas pelas de carnes (65%). Do ponto de vista da organização social dos produtores de leite, destacam-se a Cooperativa Agropecuária Unaí Ltda (Capul) e a Coopervap. As duas captam aproximadamente 500.000 litros e são produzidos próximo de 1,5 milhões de litros em 10.486 estabelecimentos, diariamente, representando quase metade do total de estabelecimentos. A presença da agricultura familiar nesse setor é expressiva - cerca de 80% - contribuindo próximo a 50% do total do leite produzido (IBGE, 2017). Apesar da relevância tanto do ponto de vista social quanto econômico, os desafios para a permanência dos agricultores familiares nessa atividade são diversos, com destaque para: alta dos custos de produção; baixo preço pago pelo leite ao produtor; tamanho reduzido das áreas dos estabelecimentos; limitada mecanização; dificuldades de manejo dos cultivos, das pastagens e do rebanho; imprevisibilidade das chuvas. Esses impactam especialmente a produção de forragem, sobretudo no período seco, que é estratégica para garantir a produção de leite durante o ano todo. Na perspectiva de superação desses desafios, por meio da coconstrução de alternativas adaptadas às condições desses agricultores, insere-se esta experiência. 3. A experiência: resultados iniciais e considerações O processo é iniciado pela realização de um diagnóstico rápido para conhecimento dos sistemas de produção no âmbito dos estabelecimentos, caracterizando-se os recursos disponíveis como a superfície agrícola, a mão de obra disponível, a área dos diferentes cultivos, o tamanho dos rebanhos, os estoques de produtos e insumos e a infraestrutura. Permite-se entender pontos fortes e fracos das explorações e dá suporte à elaboração dos planos de melhorias dos estabelecimentos que consistem no estabelecimento de objetivos, metas e ações a serem alcançados em cada ano agrícola. A partir desse plano são estabelecidas as orientações da equipe técnica da cooperativa e as ações de pesquisa participativa, com vistas a testar e validar alternativas adaptadas à realidade local. No Quadro 1, são apresentados os elementos usados neste processo. Quadro 1. Elementos da construção de soluções no projeto Mais Leite Saudável Coopervap em três anos agrícolas. PROBLEMAS / DESAFIOS (identificados no diagnóstico) • Sistemas de cultivo (milho silagem) para produção de alimentação (volumoso) para a seca não atingem quantidade suficiente para o rebanho ? deficiência alimentar, baixa produção. • Pastagens degradadas. • Elevado risco climático para os cultivos ? Perdas nas lavouras. • A qualidade do leite produzido precisa atender às Normativas do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA). AÇÕES Assistência Técnica (planos de desenvolvimento dos estabelecimentos) • Melhorias nos sistemas de cultivo de forrageiras visando aumento de produtividade e maior tolerância ao estresse hídrico: escolha de cultivares, ajustes na população de plantas, adaptação do manejo da fertilidade do solo. • Introdução de novas forrageiras para uso na seca e redução do risco da produção de alimentos: BRS Capiaçu. • Manejo das pastagens: divisão e rotação de pastagens. • Planejamento alimentar do rebanho: ajuste do tamanho do rebanho levando em conta a alimentação produzida. • Orientações sobre higiene da ordenha e manejo sanitário do rebanho. Pesquisa (testes com os agricultores + experimentação convencional) • Ajustes no sistema de cultivo usado pelos agricultores (sistema alternativo) para recuperação de pastagens com uso de integração Lavoura – Pecuária (ILP): Milho silagem + forrageira ? Pastagem recuperada + silagem (volumoso) para a seca): a) uso de gesso agrícola ? maior exploração do perfil do solo pelas raízes das plantas; b) uso de bioinsumo (rizobactéria Bacillus aryabhattai) ? redutor dos efeitos do estresse hídrico; c) adubação complementar com nitrogênio devido à alta demanda do milho por este nutriente. Na Tabela 1, são descritos os resultados do processo. Um aspecto chave foi o aumento da disponibilidade de forragens destinadas à alimentação do rebanho na seca, propiciando melhorias no estado corporal do rebanho, refletindo em aumento de média de produção dos animais e maior número de vacas em produção. Em consequência, a produção diária de leite teve incremento expressivo (86,2%), impactando na rentabilidade da pecuária leiteira - com elevação de 23,3% na Margem Bruta da venda do leite - e na renda das famílias. Tabela 1. Resultados do Projeto Mais Leite Saudável Coopervap* Indicadores Ano 1 Ano 3 Aumento ou redução (%) Produtividade 40.890 49.049 + 20,00 média de matéria verde de milho silagem em consórcio com capim – ILP (kg/ha). Produção média 58 108 + 86,2 de leite por dia (L) Qualidade do leite 447 198 - 55,7 Média da Contagem Bacteriana Total – CBT (UFC* 1000/Ml de leite)2 Qualidade do leite 505 542 + 7,3 Média da Contagem de Células Somáticas CCS (CS * 1000/Ml de leite)2 Margem Bruta média 1.697,91 2.093,69 + 23,3 da venda de leite (R$/mês)3 Renda agrícola por 1,19 1,39 + 16,3 Unidade de Trabalho familiar (Salário Mínimo Mensal)4 Gestão dos Sem registro de receitas Registro em sistema informatizado estabelecimentos e despesas desenvolvido pela Cooperativa * Os valores monetários foram corrigidos em relação ao Ano 1 pelo Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas. 1 Trata-se da comparação entre o sistema usado (Ano 1) e o sistema alternativo (Ano 3) testado junto com os agricultores e manejado por eles. 2 De acordo com as Instruções Normativas do MAPA (IN 76 e IN 77) a CBT deve ser inferior a 300 (UFC*1000/Ml de leite) e a CCS deve ser inferior a 500 (CS * 1000/Ml de leite).. 3 Valor do leite menos os gastos diretos da pecuária de leite. São considerados os seguintes gastos: insumos, serviços, gastos da comercialização, axas e impostos relacionados diretamente à pecuária de leite, manutenção de equipamentos específicos da produção leiteira (ordenhadeira, tanque de resfriamento), valor gasto com produtos agrícolas produzidos no estabelecimento e usados na pecuária de leite. 4 A Renda Agrícola corresponde à parte da riqueza líquida que permanece no estabelecimento, que serve para remunerar o trabalho do agricultor e de sua família e para realizar investimentos. A ferramenta de gestão desenvolvida possibilita a análise de informações do conjunto de estabelecimentos da rede; apoia a gestão do projeto e dá suporte ao desenho de programas e políticas. Os resultados da experimentação participativa do sistema de cultivo alternativo mostraram que ele obteve em média 20% a mais de produtividade . No entanto, os gastos também foram elevados e na avaliação dos produtores é o maior empecilho para o uso desta tecnologia em virtude da sua baixa disponibilidade financeira. O gesso agrícola foi o principal componente dos gastos adicionais do sistema alternativo - 50,6% (Tabela 1). Com base nessas informações, a cooperativa estruturou um programa para viabilizar o acesso ao gesso agrícola com preço reduzido, favorecendo sua utilização e diminuindo os riscos da produção de volumoso para a alimentação do rebanho na seca. A redução do preço está vinculada à qualidade do leite medida pelos parâmetros CBT e CCS, dentro das exigências do MAPA, oferecendo maiores descontos na aquisição. Essas adaptações sociotécnicas são possíveis porque o processo de pesquisa acontece com os agricultores a partir das condições reais vivenciadas nas comunidades onde vivem e no diálogo constante com os atores institucionais que participam do processo.

Título do Evento: 2º Simpósio Brasileiro de Ensino, Pesquisa e Extensão em Tecnologia Social
Cidade do Evento: Brasília
Título dos Anais do Evento: Anais do 2º Simpósio Brasileiro de Ensino, Pesquisa e Extensão em Tecnologia Social
Nome da Editora: Even3
Meio de Divulgação: Meio Digital

Como citar

CALDAS, Ana Luiza Tauffer et al.. A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO NA RELAÇÃO PESQUISA, ASSISTÊNCIA TÉCNICA E AGRICULTORES NO CONTEXTO DA PECUÁRIA LEITEIRA FAMILIAR NO NOROESTE DE MINAS GERAIS.. In: Anais do 2º Simpósio Brasileiro de Ensino, Pesquisa e Extensão em Tecnologia Social. Anais...Brasília(DF) Embrapa - Sede Brasília, 2024. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/2o-Sepets/995464-A-CONSTRUCAO-DO-CONHECIMENTO-NA-RELACAO-PESQUISA-ASSISTENCIA-TECNICA-E-AGRICULTORES-NO-CONTEXTO-DA-PECUARIA-LEIT. Acesso em: 13/06/2025